São Paulo, terça-feira, 04 de maio de 2004

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PODERES EM DISPUTA

Presidente do STF diz que Congresso não fiscaliza governo

Corrêa cobra CPI dos casos Waldomiro e Santo André

FABIANA CIMIERI
DA SUCURSAL DO RIO

A cinco dias de deixar o cargo, o presidente do STF (Supremo tribunal Federal), Maurício Corrêa, reclamou da "tibieza" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e citou os casos Waldomiro Diniz e Celso Daniel como exemplos de que as comissões parlamentares de inquérito não controlam o Executivo: "Isso é uma ficção".
Corrêa foi homenageado ontem pelos desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio. Prestes a sair, ele reiterou sua oposição ao controle externo do Judiciário e as críticas ao governo Lula. Ele se apresentou como uma espécie de paladino da magistratura: "Assumi a presidência do STF sem expectativas de que pudesse enfrentar toda essa tormenta, mas senti cheiro de pólvora queimada e tive de reagir em defesa da magistratura". Corrêa fará 70 anos no dia 9 e terá sua aposentadoria compulsória publicada um dia antes.
Corrêa disse que sairá "um pouco triste" por causa da proposta de emenda constitucional que estabelece o controle externo do Judiciário. Desejou que o ministro Nelson Jobim, seu sucessor, "possa evoluir com toda a sua inteligência e esquecer essa idéia". Jobim é favorável ao controle.
"Dizem que o Poder Executivo sofre o controle das CPIs. O Senado autorizou a abertura da CPI dos Bingos? Não? Por quê? Porque houve razões de conveniência política", disse Corrêa, referindo-se à pressão do governo para abafar o escândalo envolvendo Waldomiro Diniz, ex-assessor do Palácio do Planalto flagrado em 2002 pedindo propina ao empresário de jogos Carlos Cachoeira, na época em que presidia a Loterj.
"Querem absurdo mais grave do que aconteceu com o assassinato de Celso Daniel [prefeito de Santo André morto em 2002]? Por que mandaram dois senadores retirar a assinatura? Isso é controle que as CPIs fazem do Executivo? Conversa fiada. Isso é uma ficção." Para Corrêa, "o presidente da República tem de tomar mais iniciativa na parte administrativa" porque "as instituições já consolidadas da democracia ressentem-se com essa tibieza do presidente". O presidente do PT, José Genoino, preferiu não responder: "Eu continuo mantendo a mesma posição desde a reforma da Previdência: o STF não é um partido político e por isso não posso polemizar com o seu presidente".
O presidente do STF disse acreditar que o apoio do presidente do Senado, José Sarney, é o que garante a sustentabilidade do governo: "Quem tem dado governabilidade ao presidente da República é o presidente do Senado". Ele criticou a diferença entre as promessas e a gestão de Lula, "sobretudo na área social", e atribuiu a fase de descrédito que o Judiciário atravessa aos órgãos de imprensa "inflados por partidos políticos" e a um sistema processual obsoleto.
O desembargador Marcus Faver, que representou o TJ, comparou Corrêa ao rei Arthur: "É justamente em momentos de crise que afloram as grandes lideranças. Para a magistratura, o ministro Maurício Corrêa surge como se fosse o rei Arthur das brumas de Avalon, que arranca da pedra a espada de Excalibur, no momento em que os invasores queriam retirar da Bretanha o que ela tinha de mais importante: sua autonomia. O presidente do Supremo assume justamente no momento em que se tenta conspurcar a independência da magistratura brasileira". Uma comissão do TJ do Rio apura se houve participação de juízes em 12 casos de fraude na redistribuição de processos.


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