|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
JANIO DE FREITAS
Entre Alencar e Palocci
A altitude dos juros já
está custando caro, não só
à imagem do governo, mas às
pessoas de Antonio Palocci e,
de quebra, Luiz Inácio Lula da
Silva. A divergência que com
eles tem o vice-presidente José
Alencar expõe uma fragilidade
conceitual do ministro da Fazenda que vai muito além, no
pior sentido, do problema dos
juros. Lula, por sua vez, já precisou passar à atitude de discursar em uma direção, contra
os juros, e agir na outra, com
apoio absoluto à política econômica centrada em juros estrangulantes.
Como preliminar, fique claro
que o vice Alencar e o ministro
não estavam respondendo um
ao outro, como as aparências
dadas ao noticiário sugeriram,
ao falarem dos juros. As considerações de ambos foram quase simultâneas, o ministro em
Genebra, o vice na interinidade presidencial em Brasília.
Mas o choque foi frontal. José
Alencar sustentando que a fixação de juros deve ser decisão
política, Antonio Palocci afirmando que juros e Banco Central são assuntos apenas técnicos.
Para começar pelo Banco
Central, quando Lula e Palocci
escolheram um ex-presidente
do BankBoston sem experiência alguma no setor público,
mas ligado ao setor financeiro
internacional privado, não escolheram um técnico de reconhecida capacitação, teórica e
prática, para o cargo de governo. A escolha não foi feita em
razão do Banco Central, mas
da tranquilização de setores
influentes. A nomeação do presidente do BC, portanto, não
foi técnica, mas política. E o
próprio Banco Central foi
transformado em instrumento
político. Também por motivo
político, declarado "autônomo", como teria sido prometido a investidores norte-americanos em um certo encontro
que Lula e assessores ainda
não estão por narrar.
De um Banco Central em tais
condições não sairá decisão alguma que não seja também
política, se não for sobretudo
política. Ainda que fosse outra
a situação atual do BC, é inquietante que o ministro da
Fazenda não se dê conta de
que é componente sempre importante de política econômica. Repito: POLÍTICA econômica. E componente de política, política é. Daí que a direção
de juros tenha funções, além de
políticas, até ideológicas, por
exemplo para direcionar a renda no sentido da concentração
de classe.
Não tem procedência alguma, então, a idéia do ministro
da Fazenda de que "ou se tem
um Banco Central que combate a inflação ou se tem um BC
político". Na mesma medida, é
uma fantasia a sua idéia de
que "a única pressão que vale
para a política monetária é a
pressão da inflação". Quando
as ruas reagem a modos perversamente anti-sociais de
combate à inflação, todos os
governos, até hoje, reconsideraram depressa sua política socialmente elitista. Bolívia e Peru passaram por isso há bem
pouco.
Com sua crítica didática aos
juros de Palocci/Lula/Meirelles, o vice José Alencar está
prestando também um serviço
à democracia. Usa sua condição de segunda autoridade, na
hierarquia do país, para impedir a sufocação do direito de
divergência, que o governo tenta por meios cada vez mais sem
disfarce.
Texto Anterior: Governo segue bem avaliado, diz Sensus Próximo Texto: Vice-problema: Atitudes de Alencar criam "instabilidade", diz Sarney Índice
|