São Paulo, quarta-feira, 04 de julho de 2007

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ELIO GASPARI

Uma chance para enquadrar a aerocracia

Se os passageiros se mexerem, o "overbooking" custará dinheiro às empresas, como na Europa e nos EUA

ESTÁ NO AR uma consulta pública da Agência Nacional de Aviação Civil para permitir que as vítimas do excesso de lotação dos aviões sejam compensadas pelo prejuízo que lhes é imposto pelas companhias. É uma oportunidade para que a patuléia se faça ouvir.
A providência foi tomada 15 anos após a criação de uma Associação das Vítimas de Atraso Aéreo. Durante 15 anos, órgãos reguladores do poder público nada fizeram para disciplinar a violência que as empresas praticavam contra seus clientes. As relações incestuosas dos aerotecas com as companhias beneficiaram a má gestão e teceram a rede de interesses que resultaram no apagão.
As companhias chamam o excesso de lotação de "overbooking" e justificam a prática denominando o passageiro que tem reserva e não aparece de "no show". Num exemplo: um cidadão pagou sua passagem e reservou lugar num vôo para Brasília mas, como há gente que faz a reserva e não dá as caras, as empresas vendem mais passagens do que os lugares existentes no avião. Se a conta fecha, tudo bem. Se não fecha, mica o freguês que fez tudo direito. Resta saber o que ele tem a ver com um sujeito que nunca viu mais gordo e não apareceu no aeroporto. No último Natal, a TAM explodiu os saguões com excesso de bilhetes e falta de aviões. Parte da encrenca do último fim de semana teve a mesma causa.
As companhias aéreas americanas e européias trabalham com uma tabela de compensação. No Estados Unidos, o assunto começou a ser regulado em 1978. Hoje, cada vítima recebe até US$ 400. Há empresas que não brincam de "overbooking" e estão dispostas a pagar por isso. A JetBlue oferece US$ 1.000 a cada passageiro prejudicado. Na Europa, arrumaram a casa em 2004. Se o consumidor tem o bilhete, e a companhia não tem assento, ela é obrigada a indenizar a vítima, de acordo com o tamanho da viagem.
A regulamentação sugerida pela ANAC prevê que um passageiro lesado num vôo de São Paulo a Brasília, receba uma indenização de R$ 300 a R$ 600, dependendo do atraso que lhe é imposto. Uma vítima da rota Brasília-Fortaleza ganha de R$ 450 a R$ 900. Se estiver na linha Rio-Belém, pode receber até R$ 1.200. É o sistema europeu, com um pequeno refresco para as empresas.
Como o diabo está nos detalhes, a consulta pública permite à patuléia evitar que as mãos invisíveis transformem o pagamento da compensação numa bruxaria. Se o passageiro receber logo o seu dinheiro, ótimo. O artigo 10 da Minuta de Resolução é claro: "o transportador pagará imediatamente". Não custa especificar: "imediatamente, em moeda corrente ou em cheque". Tratando-se de uma aerocracia que lutará até a última gota do suor alheio para não pagar pelos desconfortos que provoca, a suspeita procede. Numa dessas, dão um cupom que só poderá ser usado nas sextas-feiras 13.
Como a ANAC quer ver as estatísticas de "overbooking" e de "no show" das empresas, a patuléia agradeceria se ela divulgasse mensalmente esses números. Aprenderia a não fazer negócio com quem não merece confiança. A média de desafortunados nas companhias americanas é de 0,12%. A média brasileira pode ser dezenas de vezes maior.
A consulta estará aberta ao público até terça. A documentação e a caixa postal para as propostas estão no sítio da agência: www.anac.gov.br


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