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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ FUNDOS DE PENSÃO
Mensagens eletrônicas de 2003, trocadas entre banqueiro e executiva do Citibank, revelam ingerência do governo sobre fundos
Planalto pressionou Dantas por fundos
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Mensagens eletrônicas trocadas
pelo banqueiro Daniel Dantas
(Opportunity) com uma alta executiva do Citibank nos Estados
Unidos revelam a ingerência que
o Palácio do Planalto mantém sobre os três grandes fundos de pensão (Previ, Petros e Funcef), o que
contraria versão do governo.
Nos e-mails, de maio de 2003,
Dantas narra como o então ministro José Dirceu (Casa Civil) e o
presidente do Banco do Brasil na
época, Cássio Casseb, foram escalados para pressioná-lo a desfazer
o acordo com os fundos que garantia ao Opportunity o controle
da Brasil Telecom.
As mensagens, obtidas pela Folha, foram anexadas, como documentos, ao processo que corre na
Justiça americana.
"Ele estava preocupado que os
fundos de pensão acabassem, dada nossas iniciativas, numa situação similar àquela da aquisição da
TIW [companhia telefônica canadense que perdeu milhões de dólares em investimentos no Brasil]", escreveu Dantas, no dia 5 de
maio de 2003, sobre diálogo com
Dirceu no Palácio do Planalto.
"Ele sugeriu que o senhor Cássio
Casseb, presidente do Banco do
Brasil, seja a pessoa responsável
para solucionar o problema."
No dia 14 do mesmo mês, Dantas mandou outra mensagem, para a mesma pessoa, Mary Lynn
Putney, então vice-presidente do
CVC (Citibank Venture Capital).
"Minha conversa com o Cássio foi
muito estranha", começou. "Ele
disse que gostaria de desfazer os
acordos com acionistas que nós
temos com os fundos de pensão.
(...) Ele disse que entendia que a
decisão era minha, e que ele estava falando em nome do governo."
A briga entre os fundos de pensão e o Opportunity pelo controle
da Brasil Telecom se arrasta desde
1999 e, no governo Lula, ganhou
novos contornos, colocando dois
nomes importantes do governo
em campos opostos.
De um lado, o chefe do NAE
(Núcleo de Assuntos Estratégicos), Luiz Gushiken, que sempre
atuou fortemente nos bastidores
em defesa dos fundos de pensão.
Os presidentes dos dois maiores
fundos de pensão, Previ (Sérgio
Rosa) e Petros (Wagner Oliveira),
são amigos pessoais de Gushiken.
O chefe do NAE sempre negou
que o governo interferisse nos assuntos dos fundos de pensão.
Já o ex-ministro José Dirceu,
conforme a Folha apurou, é tido o
como alguém próximo a Daniel
Dantas. No começo do governo,
no entanto, o ex-ministro defendia a posição de Gushiken.
A assessoria de Dirceu confirmou que houve o encontro com
Dantas, mas disse que as datas
não batem. Pelo relato do banqueiro, o encontro mencionado
teria ocorrido um dia antes do envio da primeira mensagem (5/5/
2003). A assessoria de Dirceu informou que no dia 28 de abril daquele ano, Dantas havia ligado pedindo audiência com o ministro.
Dirceu o recebeu duas vezes no
Palácio do Planalto. A primeira,
logo no dia seguinte ao telefonema (29 de abril). A segunda, no
dia 30 de maio. Segundo a assessoria do deputado, Dantas teria
feito um relato da situação na Brasil Telecom. Dirceu teria sugerido
a Dantas procurar a Previ e o patrocinador do fundo, no caso Cássio Casseb. O ex-ministro teria dito também que o problema dos
fundos não cabia a ele, mas sim à
CVM (Comissão de Valores Mobiliários), à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e às
Justiças brasileira e americana.
Por meio da assessoria do Banco do Brasil, Casseb, que pediu
demissão do banco em 2004, disse
que não falaria sobre o assunto.
Em entrevista à Folha, o presidente da Previ (fundação de previdência dos funcionários do BB),
Sérgio Rosa, confirmou que Casseb se encontrou com Dantas para tratar do acordo em torno da
Brasil Telecom. "Ele chegou a me
relatar, mas não em detalhes",
disse, sobre a conversa entre Dantas e Casseb no BB.
Rosa ressaltou que Casseb
"sempre se dispôs a colaborar para solucionar os problemas da
Previ", mas com o interesse de
banco patrocinador do fundo de
pensão, "dentro dos limites de autonomia que cada parte tem".
Em outro e-mail, no dia 23 de
maio de 2003, uma sexta-feira,
Dantas encaminha para Mary
Lynn mensagem recebida no dia
anterior de Luiz Octavio da Motta
Veiga, presidente do conselho de
administração da Brasil Telecom
Participações por indicação do
Opportunity. Na conversa, Veiga
conta que na terça-feira da mesma semana tivera reunião em
Brasília convocada pelo então ministro das Comunicações Miro
Teixeira, deputado pelo PT-RJ.
Teixeira confirma a audiência,
mas diz que foi para tratar da revisão do reajuste da telefonia fixa.
O deputado, porém, confirmou
que os dirigentes dos fundos de
pensão, sobretudo Sérgio Rosa,
insistiam para que o governo interviesse no acordo com o Opportunity em favor das fundações.
"Ele [Rosa] achava que o Estado
podia intervir para destituir o Opportunity", disse Teixeira. "Eu
atendia, achava que a causa deles
era boa, estavam defendendo o
interesse dos segurados, mas havia o sentimento de que nós tínhamos chegado ao poder e não
ao governo. Nós chegamos foi ao
governo", afirmou o deputado.
O acordo
Previ, Petros (Petrobras) e Funcef (Caixa Econômica Federal)
brigam com o Opportunity pelo
comando da Brasil Telecom desde 1999. Na privatização do sistema Telebrás, em 1998, o Opportunity fechou acordo com os três
grandes fundos de pensão para a
compra da empresa.
Apesar de ter menos de 10% das
ações -contra cerca de 45% do
Citibank e 45% dos fundos de
pensão-, o Opportunity passou
a controlar a Brasil Telecom em
razão de uma série de intrincados
acordos e contratos judiciais.
Desde 2004, no entanto, Dantas
vem sofrendo uma enorme ofensiva dos fundos e do Citi para sair
do comando dos negócios.
Os norte-americanos conseguiram destituí-lo na Justiça de Nova
York, e decisões no Brasil também afastaram o brasileiro do
controle da telefônica neste ano.
Os documentos enviados pelos
advogados de Dantas para a Justiça americana são para tentar reverter a decisão na corte.
No e-mail sobre a conversa com
Casseb, Dantas reproduz o diálogo. Ele teria perguntado ao então
presidente do BB se os fundos de
pensão estariam interessados em
vender participações na Brasil Telecom. Casseb teria respondido
que "não por um preço justo".
Representantes dos fundos de
pensão e do Citibank temiam que
Daniel Dantas pudesse vender
sua parte à Telecom Italia (outra
acionista da empresa), garantindo à operadora italiana o comando da empresa.
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