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OPERAÇÃO ANACONDA
Relato de Wendel Matos municiou denúncia do Ministério Público; magistrado afirma ter agido "no limite da lei"
Corregedor diz que juiz Mazloum o ameaçou
FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
O corregedor da Polícia Rodoviária Federal do Espírito Santo,
Wendel Benevides Matos, 30, diz
que ouviu palavras ameaçadoras
do juiz federal da 7ª Vara Criminal de São Paulo Ali Mazloum, denunciado durante a Operação
Anaconda por formação de quadrilha, ameaça e abuso de poder.
Matos é peça-chave da investigação e deve ser ouvido amanhã
na CPI da Pirataria da Câmara,
em Brasília. Seu relato sobre as supostas pressões do juiz para ter
acesso à íntegra de gravações autorizadas pela Justiça municiou a
denúncia feita pelo Ministério Público Federal.
O corregedor era responsável
pela parte operacional das investigações sobre o maior contrabandista de cigarros do país, Roberto
Eleutério da Silva, o Lobão -a
serviço do Ministério Público Federal, recebia e organizava as
transcrições dos grampos autorizados pela Justiça.
Por 11 meses, a Polícia Rodoviária Federal gravou cerca de 40 mil
conversas, que municiaram, além
da apuração sobre contrabando,
também outras duas investigações: contra a organização criminosa que seria liderada pelo empresário do ramo de combustíveis
Ari Natalino da Silva, dono da Petroforte, e contra o esquema de
corrupção que dava cobertura a
Lobão e Silva.
O Ministério Público Federal
aponta que Mazloum faria parte
da rede de proteção.
Mazloum não aceitou a denúncia do Ministério Público contra o
dono da Petroforte e o delegado
da Polícia Federal Alexandre Crenite (acusado de fazer parte da rede de proteção de Silva). Alegou
que precisava ter acesso a todas as
degravações, e não apenas aos trechos encaminhados pela acusação, para apreciar o caso. Procuradores divulgaram nota questionando tal procedimento.
O nome do magistrado apareceria nas investigações feitas a partir
dos grampos telefônicos.
Contatado ontem, Mazloum
afirmou que contatou Matos por
uma procuradora. "Eu não vou
entrar em bate-boca. Atuei dentro
dos limites da lei."
Folha - Como o juiz Ali entrou em
contato?
Wendel Benevides Matos - Ele foi
o juiz que determinou a prisão do
Alexandre Crenite [delegado que
teria favorecido o dono da Petroforte]. Para a prisão, precisou de
parte das conversas [gravadas].
Mas ele não estava satisfeito. Ele
queria todas as gravações. Ele ligou no celular. Disse: "sei que você está trabalhando com o caso
Lobão, Natalino, Crenite. Preciso
conversar, tirar algumas dúvidas". Minha autonomia era pequena no decidir, mas era grande
no transitar, no buscar informações. Levei um colega comigo.
Folha - Foi mais de um encontro?
Matos - Nesse primeiro [encontro] foi uma conversa cordial.
Bastante firme, mas cordial. Ele
queria as conversas, dizia que tinha direito. Respondíamos que
não podíamos entregar. Ele dizia:
"já oficiei o juiz do caso". Disse:
"tudo bem, vamos esperar". Mas
ficava nisso. Ele não queria dizer o
que queria de mim.
Folha - Ele ligou novamente?
Matos - Uns dias depois, mas eu
já tinha ido a Brasília para conversar com o procurador. O que ele
não sabia é que já haviam decidido que as conversas iam ser encaminhadas para ele. De novo queria as conversas. Aí sim já foi mais
contundente. Mas era conversa
de bobo para tolo. Dizia "eu quero", mas não dizia "me dê". O que
não estava claro era o contato dele
comigo. Por que a mim, se ele oficiou o juiz e o juiz ia mandar a
conversa? Por que veio me procurar?
Folha - E o que ele respondia?
Matos - Que não queria intermediários. Nessa ligação o tom foi
mais firme, quase que ameaçador.
Depois ligou de novo, já tinha recebido [as degravações]. Ele precisava de uma espécie de apoio.
Havia uma quebra da sequência
das conversas. Vinte dias, trinta
dias sem conversações. Ele ficou
questionando. Informávamos os
problemas técnicos, passamos
um tempo sem cobertura judicial,
e a gente não grava sem cobertura. Parecia não acreditar. Foi quase uma discussão.
Folha - Vocês sentiram-se acuados, ameaçados?
Matos - Ele tem justificado dizendo que não estava fazendo nada mais do que querer as informações a que tinha direito. E na
defesa das informações ele foi firme. E ele está certo. Ele exigiu o
respeito à condição dele de juiz do
processo. E, nessa condição de
respeito, ele foi firme, bastante,
chegando a ser ameaçador. Se essa ameaça era uma ameaça legal...
Eram argumentos fortes, palavras
fortes na defesa, na defesa do direito. Foi ameaçador, e as palavras
foram ameaçadoras.
Folha - Ameaças de que tipo?
Matos - Disse que poderia me
causar um prejuízo sim. Neste
momento não posso dizer.
Folha - Como você se sentiu?
Matos - Você é um servidor público, cumprindo seu dever, é
chamado por um juiz federal e ele
exige uma prestação que não é
sua. Nós ficamos constrangidos.
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