São Paulo, sexta-feira, 04 de novembro de 2005

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Citar Alca fica a critério de presidentes

DO ENVIADO ESPECIAL A MAR DEL PLATA

Os diplomatas que negociam a declaração final da cúpula de Mar del Plata deveriam ter fechado o texto na quarta-feira. Não conseguiram. Vieram os ministros do Exterior, passaram o dia de ontem reunidos, mas também não conseguiram. Conseqüência: definir o que se vai dizer sobre a Alca passou para o nível presidencial, com um duplo risco: o de um confronto aberto Bush/Chávez ou de que nem sequer haja uma declaração final, hipótese obviamente extrema.
O mais provável é que a Alca (Área de Livre Comércio das Américas) entre de alguma forma no texto, com o que a Venezuela o assinaria com restrições, como já o fez em duas cúpulas anteriores (Québec-2001 e Monterrey-2004).
O risco de confronto pessoal se dá pela metodologia da cúpula: haverá três sessões de trabalho, moderadas por funcionários de organismos internacionais. Mas os governantes têm livre direito à palavra. Se o documento tivesse sido fechado no nível de funcionários graduados ou ministros, sempre seria possível evitar o tema Alca e concentrar a oratória no assunto que dá título à cúpula deste ano: como criar emprego para enfrentar a pobreza e fortalecer a governabilidade democrática no continente.
Lula, por exemplo, traz preparado discurso em que falará essencialmente do tema da cúpula.
Mas, como caberá aos presidentes fechar (ou não) o parágrafo sobre a Alca, é razoável supor que Chávez faça um ataque aos Estados Unidos, nos moldes dos que Lula fazia quando era candidato e não havia se rendido à extrema moderação. O líder petista dizia, então, que a Alca não era uma negociação comercial, mas a "anexação" da América Latina pelos Estados Unidos.
Nas discussões no nível técnico, aliás, a retórica dos venezuelanos foi muito nessa linha. Jorge Valero, embaixador venezuelano junto à Organização dos Estados Americanos, falou só ontem três vezes em socialismo e antiimperialismo. Daí a uma crítica direta, ou aos Estados Unidos ou a Bush, é um passo.
Se for dado, Bush não poderá calar-se diante de seus 33 colegas do hemisfério.

Prazo
O que azedou de vez o ambiente em Mar del Plata, no quesito Alca, foi uma proposta do México, com apoio de 28 países, incluindo pesos pesados como Chile e Canadá, para que a declaração final propusesse retomar a negociação da Alca no mais tardar até abril do ano que vem .
Para a diplomacia brasileira, a proposta é contraproducente porque, se os dois co-presidentes do processo (Brasil e EUA) tentam inutilmente reiniciá-lo desde fevereiro de 2004, lançar novo prazo agora, sem que estejam dadas de fato as condições para a retomada, faria com que o processo perdesse credibilidade, na visão de negociadores brasileiros.
Foi como reação à proposta mexicana que surgiu o parágrafo apresentado pela Argentina, em nome do Mercosul, que fez subir ainda mais a tensão.
Ontem, no entanto, começaram a circular vários outros papéis com parágrafos alternativos, buscando conciliar posições, pelo menos entre Mercosul e Estados Unidos e o grupo de países que os apóiam. Contentar também a Chávez, sem ofender Bush, era impossível. (CR)


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