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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ CONTABILIDADE PARALELA
Características da operação, efetuada pouco antes da denúncia do "mensalão", indicam caixa 2
PT fez depósito de R$ 1 mi em dinheiro para empresa de vice
RENATA LO PRETE
EDITORA DO PAINEL
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Coaf (Conselho de Controle
de Atividades Financeiras, ligado
ao Ministério da Fazenda) identificou depósito de R$ 1 milhão, em
dinheiro, feito em 17 de maio deste ano pelo Partido dos Trabalhadores em conta bancária da Coteminas, empresa do vice-presidente da República, José Alencar.
Reconhecida pela Coteminas e
pelo ex-tesoureiro Delúbio Soares, mas ignorada pela atual direção petista, essa operação bancária não aparece na quebra de sigilo das 16 contas do PT analisadas,
no período que vai de 2000 até o
final do primeiro semestre de
2005, pela CPI dos Correios.
"Tudo leva a crer que o caixa
dois petista foi usado no pagamento à empresa do vice-presidente", afirma o sub-relator de
movimentação financeira da CPI,
Gustavo Fruet (PSDB-PR).
No dia 10 de agosto passado, o
Bradesco deu ciência ao Coaf do
depósito feito menos de dois meses antes em sua agência 2374, na
conta de número 55063-9, cujo titular é a Companhia de Tecidos
Norte de Minas (Coteminas),
maior indústria têxtil do Brasil.
O comprovante do depósito registra que ele foi feito em dinheiro. No local reservado ao nome do
depositante aparece o número
00.676.262/0002-51, um dos
CNPJs (Cadastro Nacional de
Pessoa Jurídica) utilizados pelo
Partido dos Trabalhadores.
Os dados recebidos do Bradesco
foram enviados pelo Coaf à Procuradoria Geral da República,
que, assim como a CPI e a Polícia
Federal, investiga a operação
montada por Delúbio Soares com
o empresário mineiro Marcos Valério para abastecer o PT e aliados.
Dívida de campanha
Num ponto concordam Delúbio Soares, a atual direção petista
e Josué Gomes da Silva, filho do
vice de Lula e presidente da Coteminas: o PT tem uma dívida com
a empresa, que em 2004 forneceu
ao Diretório Nacional 2,75 milhões de camisetas para serem
usadas como material de propaganda na campanha eleitoral.
A encomenda totalizou cerca de
R$ 12 milhões, que o PT combinou de pagar em três parcelas,
com vencimento marcado para
novembro e dezembro de 2004 e
janeiro de 2005. Não pagou nenhuma. Ainda no segundo semestre do ano passado teve início
uma negociação, que perdura até
hoje, na qual a Coteminas busca
recuperar o dinheiro.
Três direções do PT já sentaram
com a empresa para discutir o débito: a que foi deposta pelo escândalo do "valerioduto" (José Genoino presidente, com Delúbio na
tesouraria), a de transição (Tarso
Genro e José Pimentel) e a atual,
eleita em outubro (Ricardo Berzoini e Paulo Ferreira).
Segundo Josué Gomes da Silva,
o depósito de R$ 1 milhão na conta da Coteminas corresponde à
primeira parcela da quitação da
dívida. "Foi cash", diz.
A operação se consumou quando Delúbio ainda era tesoureiro e
menos de um mês antes das entrevistas de Roberto Jefferson à
Folha, nas quais o então deputado, além de denunciar o "mensalão", apontou Marcos Valério como pagador dos compromissos
assumidos pelo PT.
Dinheiro sem origem
Reconhecida a dívida, há divergência sobre a origem do dinheiro
utilizado para saldá-la. De acordo
com Delúbio, esses recursos foram devidamente registrados na
contabilidade do partido. A atual
direção nega (leia texto sobre o
conflito de versões abaixo).
Josué Gomes da Silva apenas
confirma o depósito, sem entrar
no mérito da fonte do R$ 1 milhão
que a Coteminas recebeu.
O PT tem contas em seis bancos
diferentes, nenhuma no Bradesco. O sigilo do partido foi quebrado (ou "transferido" à CPI, termo
usado pelos técnicos da comissão) em julho, por oferta do então
presidente, Tarso Genro.
O sigilo registra milhares de
operações bancárias. Porém não
há, nas 16 contas do partido, nenhum crédito ou débito em data
ou valor próximos daqueles indicados pelo relatório do Coaf.
Além da suspeita de que o pagamento à empresa de José Alencar
tenha sido feito "por fora", a operação bancária de 17 de maio de
2005 levanta outro dado importante para a investigação do "valerioduto": a data ultrapassa o período em que o empresário teria
movimentado R$ 55,8 milhões no
caixa dois do PT.
De acordo com documentos
apresentados por Valério à Procuradoria Geral da República e à
CPI, o último repasse determinado por Delúbio teria ocorrido em
1º de outubro de 2004 (para o PT,
no valor de R$ 200 mil).
E o último dos supostos empréstimos bancários destinados a
sustentar o caixa dois petista saiu
em 14 de julho de 2004. Foi concedido pelo BMG à SMPB, agência
de publicidade de Valério.
À luz dessas duas datas, a do depósito na conta da Coteminas oferece duas possibilidades: ou Marcos Valério omitiu parte do dinheiro que operou no caixa dois
para o PT ou Delúbio Soares dispunha de outra fonte de recursos
"não-contabilizados".
Colaboraram JOSÉ ALBERTO BOMBIG,
do Painel, e GUILHERME BARROS, colunista da Folha
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