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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/PARTIDO RACHADO
A pesquisadoras britânicas, Marco Aurélio Garcia faz ácidos comentários sobre lideranças petistas, ministros e equipe econômica
Assessor de Lula critica o PT e o governo
FÁBIO VICTOR
DE LONDRES
Assessor especial da Presidência
para assuntos internacionais,
Marco Aurélio Garcia é um dos
raros intelectuais de expressão do
PT a se manter com poder na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva. E,
a julgar por um depoimento dado
a um dossiê lançado em janeiro
por duas pesquisadoras britânicas, é um dos críticos mais mordazes do partido e do governo.
Está no estudo "No Olho do Furacão - militantes de esquerda discutem a crise política brasileira",
patrocinado pelo Transnational
Institute, um instituto de pesquisas sobre a esquerda com sede na
Holanda: Garcia avalia que o PT
"perdeu o caráter e a credibilidade", porque se distanciou dos movimentos sociais, diz que o partido tem "uma liderança de merda", julga que só a pressão social
pode fazer baixar a taxa de juros e
diminuir o aperto fiscal e bate forte na política econômica, conduzida por "pessoas com vínculos
históricos com círculos financeiros, com o aparato econômico de
governos anteriores".
Comenta o papel de colegas do
primeiro escalão. "O primeiro
ministro do Planejamento, Guido
Mantega. Foi nomeado presidente do BNDES, um banco muito
importante, com mais dinheiro
que o Banco Mundial, mas não estava tomando as principais decisões macroeconômicas."
Conta que Lula "já esteve tentado a mudar a política econômica
em várias ocasiões" e que só não o
fez porque "este é o momento de
sucumbir a tentações".
A entrevista com o professor
Garcia (licenciado do Departamento de História da Unicamp),
assim como todas as outras que
integram o dossiê, pode ser lida
na página do instituto na internet
(www.tni.org), onde está a íntegra
do documento, com versões em
inglês e em espanhol.
Para entender como o partido
que, para elas, representava a esperança de um modelo de democracia participativa foi engolido
por um escândalo de corrupção
do porte do do "mensalão", Hilary Wainwright e Sue Branford,
duas pesquisadoras com obras já
publicadas no Brasil sobre a esquerda do país, entrevistaram 16
personagens deste círculo.
Os depoimentos foram colhidos
em agosto passado, num momento agudo da crise, numa visita de
Wainwright ao Brasil.
A maioria dos entrevistados já é
conhecida por sua verve em relação ao PT e ao governo. Estão lá
ex-petistas, como Chico de Oliveira e Plínio de Arruda Sampaio, representantes da esquerda do partido (Olívio Dutra e Raul Pont) e
de movimentos sociais (Gilmar
Mauro, do MST). A ministra Marina Silva (Meio Ambiente) também é ouvida.
O assessor especial admite os
estragos causados pelo "mensalão": "Decepcionamos profundamente as pessoas no nosso próprio partido, nos setores sociais
que nos apóiam e na sociedade.
Pela primeira vez demos à burguesia uma oportunidade de atacar frontalmente o governo Lula".
O ruído surge quando se sabe
que, em público, Garcia tem uma
visão menos realista. Em viagem
de Lula a Roma em outubro, ele
afirmou, num encontro com representantes da esquerda italiana,
que as denúncias contra o governo eram infundadas e criadas pela
"mídia" e pela "direita".
A Wainwright ele critica práticas petistas na chegada ao poder.
"Era insano. Elaboramos um plano para informatizar o partido, e
foram comprados 5.000 computadores, 5.000 impressoras, 5.000
scanners; todos os computadores
com um vídeo que conectava o
partido pelo país. É claro que
aquilo era mais do que o PT precisava. E o custo equivalia a 50% do
orçamento do Programa de Integração Social."
Ele afirma que, se o PT tivesse
exercido "uma pressão organizada", a taxa de juros teria caído
mais e que o governo Lula gastou
com reforma agrária "quatro vezes mais do que se havia gastado"
sob FHC "porque havia pressão
do MST e outros movimentos".
No dossiê, ele ainda faz troça
com ex-líderes do PT, tipo Silvio
Pereira. "O secretário-geral do
partido recebeu um Land Rover
de presente. A imagem da Land
Rover no Brasil foi aparentemente prejudicada pelo episódio."
Garcia foi coordenador do programa de governo de Lula nas
campanhas derrotadas de 94 e 98.
Está cotado para desempenhar de
novo o papel neste ano.
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