São Paulo, segunda-feira, 05 de maio de 2008

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Em 4 meses, União gasta R$ 3,2 bilhões por meio de MPs

Medida, que pela Constituição deveria ser usada em casos de guerra ou calamidade pública, cria impasse entre três Poderes

Na prática, MP permite ao Executivo bloquear gastos criados por meio de emenda parlamentar e substituí-los por ações de sua preferência


GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Expediente que deveria ser restrito a casos de guerra ou calamidade pública, a criação de despesas por meio de medidas provisórias cresce exponencialmente no governo Luiz Inácio Lula da Silva e, só nos primeiros quatro meses deste ano, já chega aos R$ 3,2 bilhões. A multiplicação dos casos criou um impasse que hoje envolve os três Poderes.
O uso das MPs -ou créditos extraordinários, no jargão da tecnocracia- se tornou a forma corriqueira de atropelar as complicadas negociações com o Congresso em torno do Orçamento. Atividades tão prosaicas e previsíveis como a organização de eventos, a concessão de bolsas de estudo ou a conservação de rodovias têm suas verbas definidas de forma unilateral pelo Executivo, pelo procedimento reservado pela Constituição a emergências.
Mas são as obras, especialmente as do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que levam o Executivo a bater recordes na edição heterodoxa de MPs. Dos R$ 16,6 bilhões destinados em 2007 ao PAC, R$ 11,6 bilhões vieram de créditos extraordinários.
Não por acaso, o ano passado registrou um aumento de quase 100% no uso desse artifício, com a criação total de R$ 43,3 bilhões em gastos. Apesar da alegada urgência, grande parte desse dinheiro não chegou a ser gasta em 2007 e já passou a engordar os créditos deste ano -a lei permite a reabertura de créditos editados nos últimos quatro meses do ano anterior.
Neste ano, o Orçamento não havia completado um mês desde sua sanção quando o governo editou, em 16 de abril, uma MP com R$ 1,8 bilhão em novas despesas. Em 2007, a espera foi de dois meses para a criação de créditos do mesmo valor.
A disparada dos valores criou situações inusitadas. No mês passado, o governo anunciou o que parecia ser o maior corte de verbas orçamentárias da história, na casa dos R$ 20 bilhões, atingindo, principalmente, ministérios como Cidades, Esporte e Turismo -os que mais recebem verbas dos parlamentares no Orçamento. No entanto, nenhuma queixa foi ouvida.
É que toda a Esplanada já conta com as verbas criadas desde 2007 por MPs e prontas para serem utilizadas neste ano. Nos cálculos do Planejamento, há R$ 11 bilhões em créditos a serem gastos até dezembro -e novos estão a caminho.
Na prática, o mecanismo permite ao Executivo bloquear as despesas criadas via emendas parlamentares e substituí-las por ações de sua preferência. Como os gastos criados por MP podem ser contratados imediatamente, a apreciação do texto pelos congressistas é pouco mais que mera formalidade.
A manobra, nada sutil, não passou despercebida e produziu focos de conflito, no Legislativo e no Judiciário. No primeiro caso, os créditos empacaram as negociações que correm na Câmara para disciplinar o uso das MPs; no segundo, um julgamento do STF pode impor uma interpretação menos elástica do texto constitucional.
"A abertura de crédito extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública", diz a Constituição. No Congresso e no STF, predomina a avaliação de que atividades como "Conservação Preventiva e Rotineira de Rodovias" não preenchem tais requisitos.
Conforme a Folha noticiara, a tendência do STF é contrária às MPs. No julgamento de ação da oposição contra MP de R$ 5 bilhões, há cinco votos a três por sua inconstitucionalidade. Mais um voto decidirá o caso.


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