São Paulo, quinta-feira, 05 de junho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JANIO DE FREITAS

Seguranças das ilegalidades


Os governos estaduais e federal não precisam mais do que ter nas casas legislativas maiorias ainda que mínimas

UMA CPI que acaba por inutilidade e outra que nem consegue começar, as duas na mesma semana, dão bem a medida da liberdade, cada vez menos contestada, de que os governos desfrutam para as improbidades administrativas impunes. Não precisam mais do que ter nas casas legislativas maiorias ainda que mínimas (em número, não em carência moral).
A gravidade e a dimensão de imoralidades que investigações suíças levantam, nas duradouras relações entre a multinacional Alstom e administrações públicas paulistas e federais brasileiras, por si só explicaria o bloqueio da bancada de José Serra à necessária CPI na Assembléia Legislativa de São Paulo. Mas se trata da explicação que condena, com numeroso acréscimo de cumplicidades à bandidagem originária.
Os suíços são muito cautelosos na comunicação das constatações, tanto por exigência de suas leis, como por experiências frustrantes em liberações passadas para poderes brasileiros. Apesar do comedimento, o que já foi informado é indicativo de um conjunto de casos de corrupção com metástases por vários setores de poder. Daí vem uma decorrência oportuna e rara. É a provável inutilidade do bloqueio à CPI pela bancada de José Serra, porque a extensão e, também para a Suíça, a ilegalidade das ações atribuídas à Alstom levarão a investigações lá que, fatalmente, se tornarão públicas e, portanto, conhecidas aqui. Já houve finais assim, com a Suíça mesmo, com a Itália e com os Estados Unidos, em casos que vieram implodir aqui.
As relações solidárias entre o governador José Serra e o presidente Lula atenuam possíveis estranhezas, outrora inevitáveis, com estarem os dois enlaçados também em relação a CPIs. As reuniões que levaram tal nome, com senadores e deputados do governo e da oposição, devem encerrar-se hoje com mais um espetáculo patético. Seu destino poderia ter-se definido há muito tempo, por alguém que tivesse a sensatez de chegar à porta, em qualquer dia, e bradar para a sala: "Todos daqui para fora. Já. Chega de gaiatice".
A CPI dos Cartões Corporativos foi só isso mesmo: um circo sem graça, embora com os personagens de praxe nos picadeiros. A bancada de Lula e a da oposição confraternizaram no propósito de evitar a verificação dos gastos palacianos e ministeriais, de hoje ou de ontem, um lado e outro na certeza de que lhes é mais apropriado resguardar a imoralidade administrativa do que não poder, agora ou mais tarde, valer-se de tantas das suas formas.

Células de novo
Por parte de católicos e por parte de evangélicos, inclusive na bancada religiosa do Congresso, está retomada a busca de uma providência parlamentar que suste, ou restrinja, a pesquisa com células-tronco embrionárias convalidada pelo Supremo Tribunal Federal. A perspectiva de êxito, porém, é muito pequena. A composição atual do Congresso é pior que a anterior, em todos os sentidos. Mas a aprovação da Lei de Biossegurança em 2003 foi por margem tão ampla que, de lá para cá, não pode estar toda perdida.
Ainda assim, vai aí um trecho do valioso voto da ministra Cármen Lúcia Rocha: "A pesquisa com células-tronco embrionárias não é certeza de conquistas no campo científico. Mas a não-pesquisa é certeza de não-conquista".


Texto Anterior: Internet espalha boato sobre internacionalização da floresta amazônica
Próximo Texto: Reservas crescem, apesar de desmatamento
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.