São Paulo, quarta-feira, 05 de julho de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELIO GASPARI
Ciro pode ser o Tancredo de FFHH

Outro dia FFHH disse a Dora Kramer que deseja influir na sucessão presidencial. Isso todo mundo deseja, mas, desde Arthur Bernardes, só um presidente civil conseguiu fazer seu sucessor. Foi Itamar Franco. Ele é uma espécie de Xororó da política nacional. Não fica bem ouvi-lo, muito menos procurar entender por que deu certo (visto que, por definição, deu errado). Deixando-se de lado as características biográficas e os defeitos pessoais que o assemelham ao presidente americano Harry Truman (1945-1953), é o caso de perguntar como um presidente mercurial, com um governo de meia-sola, conseguiu coisa tão difícil. A primeira resposta é rápida: foi Fernando Henrique quem se elegeu.
Essa idéia é falsa. Vale demonstrar a sua falsidade porque nela está embutido um ingrediente que foi elixir para Itamar Franco e pode ser veneno para FFHH. Nunca passou pela cabeça de Fernando Henrique Cardoso ser ministro da Fazenda. Ele foi intimado a assumir o cargo na noite de 19 de maio de 1993, quando estava em Nova York. No início da tarde, almoçava (rigatoni) com Paulo Francis no Bravo Gianni. Àquela hora, as chances de ele vir a ser ministro eram as mesmas de Francis.
Afora o imprevisto pessoal, a idéia que ele fazia da economia brasileira prenunciava o FFHH dos anos seguintes. Achava que a economia ia muito bem, obrigado. O saldo comercial de US$ 20 bilhões, segundo ele, indicava "uma economia vigorosa". Registre-se que a isso somava uma opinião forte: "Tudo passa pela derrubada da inflação, pois é ela quem está abatendo a confiança do povo brasileiro". A ida do professor Cardoso para o ministério da Fazenda foi obra exclusiva de Itamar Franco e sua manutenção, também.
Ao escolhê-lo, Itamar sabia que o professor jogaria a vida no cargo. E o professor sabia que a vida de todos os seus antecessores tinha acabado quando a inflação passou por cima de suas biografias, transformando-os em consultores.
Até aí, nada demais, pois todos os antecessores de Itamar poderiam ter pensado em aproveitar a ambição de seus ministros da Fazenda para alavancar seus governos. Delfim Netto poderia ter sido o sucessor de Figueiredo, mas, em 1982, o Brasil quebrou no seu colo. Dilson Funaro poderia ter sido o sucessor de Sarney, mas foi quebrado aos pedaços.
Não foi o professor Cardoso quem se diferenciou de Delfim ou Funaro. Foi Itamar quem se diferenciou de seus antecessores. Ele teve a coragem de abdicar de uma parcela ponderável do poder presidencial para abrir o caminho para um plano de estabilização econômica associado a uma candidatura presidencial (ou vice-versa). Hoje, FFHH e a ekipekonômica gostam de dizer que abriram seus próprios espaços. Gogó. Tanto não abriram que Itamar enfiou-lhes Ciro Gomes goela abaixo no episódio da demissão do embaixador Rubens Ricupero.
Por temperamento, Itamar fez algo inédito ao ceder a ribalta e o mando em benefício da estabilidade e do seu ministro. Vindo lá de trás, fez o que Juscelino Kubitschek não conseguiu quando aceitou que Lucas Lopes fosse embora. O que Ernesto Geisel não fez ao governar uma disputa entre os ministros Mário Henrique Simonsen e Reis Velloso (vencida no afeto por Simonsen e nas contas públicas por Velloso).
Tudo isso vem ao caso porque numa hora em que se considera brega louvar as virtudes de Itamar (como foi brega louvar as de Truman), FFHH diz que pretende influenciar na sucessão, mas não mostra a menor aptidão para ceder uma gota de xampu em benefício de uma candidatura viável ou pelo menos sincera.
Há dois candidatos no topo do governo: Pedro Malan e José Serra. Malan depende de um êxito econômico e social difícil de ser alcançado. Isso para não falar em Mário Covas. Se metade do que FFHH e Covas dizem um do outro for verdade, o Brasil perdido está e perdido continuará caso ele saia candidato e vença a eleição. Para o bem de todos, um é maledicente e o outro é ranheta, portanto não se deve dar peso exagerado aos seus destampatórios.
Por fora, dependendo cada vez mais de uma improvável capotagem de Ciro Gomes, está Tasso Jereissati. FFHH se diz inimigo de Ciro Gomes. Pode até ser verdade, mas, se um curioso cronometrar o tempo que ele gasta admirando os defeitos de seus correligionários, provará que melhor negócio faz o adversário.
Não se pode saber como estará o país em 2002, mas, até agora, os passos de FFHH assemelharam-se muito mais aos do general Figueiredo. Ele gostava tanto de falar mal dos candidatos do governo (Maluf e Mário Andreazza) que elegeu Tancredo Neves. O Tancredo Neves de FFHH já tem nome. Chama-se Ciro Gomes.


Texto Anterior: Pesquisa: Cresce rejeição ao governo, diz CNT
Próximo Texto: Panorâmica: Oposição tenta suspender Lei de Responsabilidade
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.