São Paulo, terça-feira, 05 de julho de 2005

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JANIO DE FREITAS

O conjunto da obra

As circunstâncias estão embaralhando duas questões que não se confundem. Se José Genoino e seu parceiro de operações financeiras devem ser retirados da direção do PT ou não é problema interno do partido, a ser resolvido segundo a sua capacidade digestiva -que, têm mostrado certas alianças, é enorme.
O que importa não está no PT nem em outro partido, está no governo. Está no próprio grupo integrante do dispositivo presidencial. Sobram indícios de escapismos e armações para despejar sobre Delúbio Soares as responsabilidades pelos malfeitos que não possam ser negados até o fim.
Delúbio Soares é um simplório. Não teria condições pessoais nem representatividade para montar, por iniciativa e comprometimento próprios, a engrenagem de subornos e movimentação de verbas que, aos poucos, está aparecendo.
Não sobrevive nenhuma dúvida, por exemplo, da utilização da publicidade oficial como uma das chaves decisivas da engrenagem. E, havendo verba de publicidade oficial, a Secretaria de Comunicação, na qual o ministro Luiz Gushiken concentrou toda a orientação da propaganda oficial, é parte original no caso.
A engrenagem não se alimentou de um ou outro anúncio, decidido por este ou aquele setor de comunicação de empresa estatal ou de ministério.
Movimentou muitos milhões, e ainda há outros de contratos vigentes, em montantes e finalidades sujeitos à palavra de ordem da Secretaria de Comunicação da Presidência. Há gente saindo de fininho da história.
Caso se queira apurar -ou pelo menos entender no essencial o processo que levou à atual crise- é fundamental considerar, sempre, esta realidade instalada desde a posse de Lula: até a exclusão de José Dirceu, os integrantes do grupo operador da Presidência (que inclui o ministro Antonio Palocci) brigaram muito entre eles, talvez mesmo com um ou dois casos de hostilidade rancorosa, mas agiram em conjunto, seguiram todos um plano comum.
Foram condôminos de todas as decisões estratégicas e táticas, tanto de governo como no outro condomínio, entre o governo e o setor dominante do PT.
O que há de discutível nisso tudo é a posição de Lula. Em favor de sua ingenuidade parcial ocorrem, sempre, evidências de alienação como a sua festa junina no sábado, desconsideração afrontosa à sociedade tensamente mobilizada com a crise do governo.
Porém convenhamos que seria alienação demais ver, por exemplo, tantas transferências para partidinhos governistas, até do PSDB mais de 20, e nem ao menos perguntar a José Dirceu como conseguia aquilo.
Razões sérias e interesses mesquinhos podem proteger Lula da torrente de denúncias que o concubinato PT/governo provocou. Mas daí a atribuir a responsabilidade inicial e maior a um tipo como Delúbio Soares, aliviando o estado-maior do governo e do concubinato, é aderir ao cinismo a que José Genoino não faz restrição alguma.


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