São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/RETÓRICA DA CRISE

No quarto discurso em 24 horas, Lula cita origem pobre da própria família para falar de esperança e anuncia obras para o Nordeste

Presidente usa mãe como exemplo e chora

FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A CANTO DO BURITI

Num discurso a agricultores em Canto do Buriti (470 km ao sul de Teresina), o quarto em menos de 24 horas no Piauí, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chorou a ponto de paralisar sua fala e embargar a voz por vários segundos, quando fez menção às origens pobres de sua família.
Lula visitava, no semi-árido piauiense, um núcleo de produção de mamona, cuja semente é usada para produzir biodiesel.
Para cerca de 1.500 pessoas, o presidente discorria sobre a valorização que sua gestão dá ao Nordeste, segundo ele discriminado por outros governos -o assunto deu a tônica dos discursos do dia, em que inaugurou uma outra fábrica de biodiesel e o trecho recuperado de uma estrada federal.
Citou sua mãe como exemplo de persistência. "Convivi com minha mãe até 1980, quando ela morreu, e nunca vi, em nenhuma situação, nenhuma, por pior que fosse, ela perder a esperança. Não tinha jeito de você ver a minha mãe sentar numa mesa, mesmo quando não tinha o que comer [chora], e perder a esperança."
Lula parou de falar e enxugou os olhos com um lenço. Seguiu-se o discurso, e o choro continuou.
"Digo isso porque cada vez que venho para o Nordeste a gente olha a cara do povo e a gente percebe o povo sofrido, e muitas vezes as pessoas perdem a esperança, muitas vezes desanimam e vão para São Paulo. E quem chega a São Paulo hoje não tem a mesma sorte que eu tive em 50. Naquele tempo era menos violência, a gente tinha mais oportunidade. Não era hoje, que chega a São Paulo e, se não tem parente, vai para baixo de uma ponte."
Após contar que ele e sua família comeram "o pão que o diabo amassou" durante a viagem de pau-de-arara de Pernambuco a Santos, o presidente se disse orgulhoso em ver o projeto de agricultura familiar na Fazenda Santa Clara, da empresa Brasil Ecodiesel, que abriga 619 famílias.
Seguindo tendência crescente desde que se agravou a crise política do governo, o comportamento do presidente no interior parecia o de um candidato em campanha. Um dia depois de dizer que os adversários terão que o "engolir", Lula prometeu grandes obras para o Nordeste: a rodovia Transnordestina, cujo investimento de R$ 4 bilhões deve ser anunciado "possivelmente dentro dos próximos dias", a transposição do rio São Francisco, a instalação de uma refinaria de petróleo em Pernambuco e a construção de uma rodovia litorânea do Rio Grande do Norte à Bahia.
Sobre a obra do São Francisco, disse que visa "minorar o sofrimento de 12 milhões de famílias que às vezes andam até 16 léguas para pegar um pote d'água".


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