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Livro celebra os 30 anos da "Carta aos Brasileiros"
Manifesto de Goffredo da Silva Telles Jr. foi um dos marcos da redemocratização
Obra que será lançada na
Faculdade de Direito da USP
contém 23 depoimentos
sobre o documento que
pedia "Estado de Direito Já"
DA REDAÇÃO
Antigos alunos da Faculdade
de Direito da USP, no Largo São
Francisco, lançarão na quarta-feira o livro "Estado de Direito
Já!" para celebrar os 30 anos da
"Carta aos Brasileiros", do jurista Goffredo da Silva Telles
Jr., que se tornou um marco da
redemocratização do país.
Em 1977 a repressão, que se
tornara mais aguda a partir de
1968, tinha abrandado um pouco, mas o país estava longe da
normalidade: o Congresso foi
fechado em abril, e ainda havia
prisões (cineasta Renato Tapajós) e cassações (Marcos Tito e
Alencar Furtado, deputados).
Foi nesse cenário de incerteza política que Flavio Bierrenbach, José Carlos Dias e Almino Affonso convidaram Goffredo para ler um manifesto em
defesa da democracia nos festejos pelos 150 anos da Faculdade
de Direito da USP, já que a comemoração oficial ficara a cargo de Alfredo Buzaid, ministro
da Justiça do governo Médici.
Como explica Bierrenbach,
hoje ministro do STM, "Goffredo nos parecia ser o nome ideal,
como foi. Em primeiro lugar,
pelo respeito que inspirava; em
seguida, pela sua isenção, já que
não se tratava de uma figura
marcada de esquerda, mas sim
de um democrata". Goffredo
aceitou, apesar dos riscos: "Na
época não pensei em medo... Eu
tinha um dever a cumprir. Muitos professores tinham me pedido uma manifestação pela
democracia. O pedido veio ao
encontro de um ideal que tinha
no coração há muito tempo".
Segundo o ex-ministro da
Justiça José Gregori, um dos
organizadores da manifestação, a Carta traçou um programa mínimo que unificou as
oposições: "Ela estabeleceu um
mínimo múltiplo comum, pois
todo mundo fechava em relação ao Estado de Direito Democrático. Na campanha das Diretas-Já houve a decodificação desse Estado de Direito numa
coisa prática. O Estado Democrático de Direito era uma coisa
mais complexa, abrangente;
Diretas-Já era uma palavra de
ordem mais singela, mais fácil
de ser entendida, mas já fazia
parte do genoma da Carta".
Bierrenbach tem essa mesma certeza: "Não há dúvida que
a campanha pelas eleições diretas e a divisa por ela adotada foram inspiradas pela Carta". O
documento sustentava que um
regime baseado na força não
era legítimo e concluía exigindo a reconstitucionalização do
país: "Estado de Direito, já".
A organização do ato, realizado em 8 de agosto de 1977, foi
cercada de precauções: Almino
Affonso e Plínio de Arruda
Sampaio, ambos cassados, não
subscreveram o documento para não fornecer pretextos à repressão: temia-se que a polícia
invadisse a faculdade, tal como
havia feito em 15 de junho. Dois
espiões infiltrados pelo Dops
acompanharam a manifestação
e anotaram o nome de alguns
dos 2.500 presentes.
Depois da Carta, a repressão
não cedeu de imediato (a PUC-SP foi invadida um mês depois),
mas as manifestações contra a
ditadura tornaram-se mais freqüentes. Como escreve José
Carlos Dias no livro, a Carta foi
um teste de coragem: "Muitas
decepções tivemos nós com
desculpas para recusas".
Gregori observa que, "com a
Carta aos Brasileiros, a classe
média se dividiu. Uma parte
achou que tinha de retirar qualquer tipo de apoio ao regime".
O livro traz a íntegra da Carta, depoimentos de 23 personalidades -além dos autores supracitados aparecem Celso Lafer, Dalmo Dallari, Miguel Reale Jr., Antonio Candido, Tércio
Sampaio Ferraz Jr. e Maria Victoria Benevides, entre outros-
e registros dos debates no Congresso, dos relatórios do Dops e
da repercussão na imprensa.
Os entrevistados estão de
acordo que hoje o país vive sob
o Estado de Direito, a despeito
da desigualdade social e das deficiências do Estado. Para Goffredo, porém, o maior problema enfrentado pelo país é a ausência de partidos estruturados: "Nossos partidos não são
verdadeiros partidos. Eles nunca fazem menção a seus programas. Fidelidade partidária é fidelidade ao corpo de idéias do programa". Aos 92, Goffredo
diz que gostaria de escrever
uma segunda Carta aos Brasileiros: "O núcleo dessa segunda
carta seria uma reforma política em favor de uma democracia
participativa, em que o povo
vota sabendo que está votando
em um conjunto de idéias".
ESTADO DE DIREITO JÁ!
Os trinta anos da
Carta aos Brasileiros
Editora: Lettera.doc
Lançamento: 8 de agosto, às 18h, no
Salão Nobre da Faculdade de Direito da
USP (Largo São Francisco, nš 95)
Quanto: R$ 60 (272 págs.)
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