São Paulo, sábado, 05 de outubro de 2002

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ENTREVISTA

Para o professor americano Albert Fishlow, limitação do uso de MPs forçará eventual gestão petista a se aliar a tucanos e peemedebistas

Especialista vê aliança PT-PSDB em governo Lula

ROGERIO WASSERMANN
DA REDAÇÃO

A limitação para a edição de MPs (medidas provisórias) aumentará a importância do Congresso no próximo governo e obrigará uma eventual administração Lula (PT) a se aliar ao PSDB para poder governar, na avaliação do professor americano Albert Fishlow, diretor do Centro de Estudos Brasileiros da Universidade Columbia, de Nova York.
Para Fishlow, a tendência é a conformação de uma aliança entre PT, PSDB e PMDB, próxima à que sustentou Fernando Henrique Cardoso no seu segundo governo, com o PT ocupando o lugar que era do PFL.
Ele avalia ainda que o pior da crise econômica já passou e que ela poderá ser afastada de vez em um período de até seis meses se o próximo presidente demonstrar que está seguindo o acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional). "Não acho que uma vitória do Lula altere alguma coisa, porque ele foi um dos primeiros a ratificar [o acordo]", disse ele em entrevista ontem à Folha, por telefone, de Nova York.
 

Folha - A atual falta de investimentos externos na América Latina, e em particular no Brasil, se agravará caso Lula vença a eleição? Existe uma forma de evitar isso?
Albert Fishlow -
Acho que o pior já passou. Foi difícil para as pessoas no exterior começarem a assimilar essa possibilidade de eleição do Lula. Todo mundo estava seguro, no início, de que José Serra [PSDB" venceria. Agora, com o passar do tempo, os banqueiros da Europa, dos EUA, do Japão, já estão conscientes da possibilidade da vitória do Lula. Por isso há essa reação do mercado, com esse grande prêmio de risco que o Brasil está pagando. Mas eu acho que mesmo com uma eleição do Lula a situação deve melhorar dentro dos próximos quatro a seis meses, por uma razão simples: vai haver uma possibilidade de comprovar se o Brasil está seguindo efetivamente o acordo feito com o FMI.
Evidentemente, isso não quer dizer a necessidade de seguir todas as linhas em detalhes, considerando as dificuldades do Japão, da Europa e dos EUA. Ninguém está imaginando que se o Brasil chegar a um superávit de 3,65% em vez de 3,75%. Mas um eventual governo Lula poderá comprovar ao FMI e ao mercado financeiro que seguirá a estratégia macroeconômica atual.

Folha - Pelo discurso de Lula, o sr. acha que ele seguirá realmente essa política?
Fishlow -
Ele foi um dos primeiros a ratificar o acordo. Ele foi à reunião com o Fernando Henrique e já tinha preparado um documento no qual disse que o Partido dos Trabalhadores estava comprometido a seguir a linha do acordo. Além disso, há uma coisa que eu acho importante destacar. Na prática, uma vitória do Lula significará uma mudança limitada. Será realmente a substituição do PFL pelo PT na aliança governista dentro do Congresso. E o Congresso terá uma importância ainda maior, porque as medidas provisórias, que foram utilizadas ilimitadamente pelo atual governo, serão limitadas agora.

Folha - E no caso de haver um segundo turno, o sr. acredita que essa possibilidade de aliança entre o PT e o PSDB continua válida? Porque vai haver naturalmente uma disputa maior, uma rivalidade maior entre esses dois partidos...
Fishlow -
Certo, mas, por outro lado, não vejo alternativa. Se não for com o PSDB, com quem o PT vai fazer aliança? Com o PFL?

Folha - E o PMDB, não poderia fazer esse papel?
Fishlow-
O PMDB, evidentemente, faz parte de qualquer coalizão. Quando eu falo nessa aliança, estou me referindo realmente em PT-PSDB-PMDB, exatamente como foi antes com PSDB-PMDB-PFL. O PMDB faz parte, mas o elemento mais importante para uma nova coalizão dentro do Congresso seria o PSDB.

Folha - O sr. acha que a relação Brasil-EUA num eventual governo Lula tende a ser mais conflituosa?
Fishlow-
Não, não vejo isso. Dentro da secretaria do Tesouro, da Casa Branca, do Departamento de Estado, todos nos EUA estão dizendo a mesma coisa, que a democracia está funcionando e que, como sempre, é necessário reconhecer e aceitar as decisões nacionais. Nesse sentido, acho que a eleição brasileira é uma eleição aberta, sem interferência externa.


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