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São Paulo, domingo, 05 de outubro de 2003

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JANIO DE FREITAS

As vacas não animam

A revelação, contida na pesquisa CNI/Ibope, de que 48% dos eleitores de Luiz Inácio Lula da Silva não lhe dariam o voto outra vez, se repetidas as condições do primeiro turno passado, causou na Presidência o impacto mensurável pela pronta concessão de nova e simpática entrevista coletiva presidencial, com mais promessas otimistas. E, no entanto, não era aquele o dado mais importante sobre a opinião pública, ainda que este outro não recebesse, de jornais e tv, maior (nem menor, quase sempre) atenção.
Lula comunicou, na entrevista, que "o tempo dos sacrifícios e vacas magras acabou" - tal como pesquisa anterior, também com dados negativos, levara-o a anunciar o "espetáculo do crescimento" econômico no segundo semestre que se iniciava. Se antes não se viu o esperado espetáculo, agora a opinião pública informa que as vacas gordas, obedientes ao exemplo metafórico do presidente, já foram para o brejo.
A mensagem está nos levantamentos, pelo Programa de Administração do Varejo em comum com a USP, das intenções de consumo em São Paulo. Quando, em igual ocasião do ano passado (pouco antes do primeiro turno eleitoral), o dólar disparava, a inflação subia, a economia desabava e o governo Fernando Henrique buscava socorro no FMI, 27,5% dos consumidores mostravam-se decididos a não fazer compra no chamado período pré-natalino. Neste ano, são 55,4% os que manifestam a decisão de nada comprar. Mais do que o dobro do ano passado.
A importância dessa pesquisa está em captar, antes de sentido político, o estado de ânimo da população, seu desalento ou a boa disposição proveniente da realidade circundante. É também uma forma de julgamento do governo, sem dúvida, mas proporciona indicadores mais amplos. Econômicos, por exemplo, ao sugerir que são precárias as perspectivas de verdadeira ativação industrial/comercial nos próximos meses, se até no período mais extenso e intenso de compras não há disposição para tanto.
É em torno do estado de ânimo que a propaganda se movimenta, no intuito de manobrá-lo. Enquanto as vacas de Lula emagreceram mês após mês, as verbas gastas pelo governo em propaganda aumentaram, extraindo dinheiro, inclusive ou sobretudo, das estatais e adjacências. Além dos incontáveis pretextos para que Lula apareça a cada dia nas primeiras páginas e nos telejornais. E, a propósito, aí aparece outro indicador importante da sondagem: nem mesmo o empenho na propaganda conseguiu impedir que o estado de ânimo redobrasse como estado de desânimo.

Pudim de soja
A designação da ministra Ellen Gracie Northfleet para relatora, no Supremo Tribunal Federal, dos recursos contra a liberação da soja transgênica não fortalece as esperanças das iniciativas assinadas pela Associação dos Juizes Federais do Brasil e pela Associação Nacional dos Procuradores da República, ambas aceitas pelo procurador-geral Cláudio Fonteles.
A liberação da soja adulterada produziu, pelo menos, um resultado saudável: com a renúncia de João Capiberibe à vice-liderança do governo no Senado, afinal apareceu, no governismo, alguém capaz de abandonar um pedacinho do pudim em nome dos princípios antes declarados.
Na Inglaterra, onde o consumo de transgênicos continua proibido, um "furo" do jornal "Guardian" revelou a conclusão de três anos da pesquisa comparativa entre plantios convencionais e transgênicos. Duas das três culturas transgênicas -beterraba, para produção de açúcar, e canola para óleo de cozinha- revelaram efeitos nocivos no ecossistema, que não foi alterado pelas plantas puras. A reportagem fez a polêmica explodir outra vez, mas na Inglaterra não há o golpe das medidas provisórias para impor decisões.

Dois aniversários
No 3 de outubro de 1953, agora celebrado, em que Getúlio Vargas assinava a criação da Petrobras, ocorria uma não-coincidência: noticiava-se a entrega do Prêmio Maria Moors Cabot, na Universidade de Columbia, a Carlos Lacerda, por sua atividade, como registram os anais, "contra a corrupção e o comunismo".
Os americanos do petróleo e o próprio governo dos Estados Unidos fizeram todo o possível contra a criação da hoje cinquentenária Petrobras. Carlos Lacerda levava ao auge a campanha que terminou no suicídio de Getúlio.


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