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Otavio Frias Filho
Yankees e rebeldes
MUITO SE TEM escrito sobre a divisão
do Brasil em duas
metades que emergiu no
domingo. Os jornais trazem mapas onde Rio, Minas, o Nordeste e o Norte
aparecem em vermelho
(Lula), enquanto São Paulo, o Sul e o Centro-oeste
estão em azul (Alckmin).
Essa divisão entre "yankees" e confederados em
nossa "Guerra Civil" eleitoral já foi enfocada sob seus
dois prismas mais evidentes, o antagonismo de classe e a desigualdade geográfica. Grosso modo, o primeiro opõe as classes populares às classes médias.
O segundo ângulo opõe o
"Norte" ao "Sul".
Descontado o esquematismo desse tipo de recortes, há um terceiro prisma
a acrescentar. É aquele que
separa as regiões onde a
presença do Estado na economia e na vida das pessoas ainda é muito grande
(vermelho), daquelas áreas
nas quais o peso do poder
público é menor (azul).
O capitalismo se enraizou há muito tempo em
São Paulo e no Sul, onde o
dinamismo econômico
prescinde, ao menos em
boa parte, do Estado. Não
por acaso é a região mais
sensível ao único tema novo, em termos eleitorais,
que surgiu nesta eleição: o
da redução da carga tributária hoje próxima de 40%
do PIB.
Embora se atribua a inclinação anti-Lula no Centro-oeste à crise da agricultura, essa região se mostra
como típica geografia de
fronteira, um eldorado de
oportunidades, empreendimento pessoal e terras
abundantes. Lugar onde vigora o "cada um por si,
Deus por todos".
Em grande parte do Nordeste, e mesmo em Minas e
no Rio, o cenário é outro.
São regiões onde a onipresença do Estado remonta
ao período colonial; são lugares onde o poder do Estado para contratar, subsidiar, autorizar verbas segue enorme, até por compensar a relativa debilidade da economia privada.
Talvez por isso, também,
seja notória certa ausência
de debate programático.
No fundo, o programa de
Alckmin se resume a menos Estado ou, no eufemismo publicitário, a Estado
menor, menos caro e mais
eficiente. E a plataforma de
Lula se resume a garantir
alguma compensação social, via Estado, em troca da
liberdade para o mercado.
Alckmin, por sua vez,
tem pouco vínculo orgânico com o que tem sido o
PSDB até agora. O núcleo
tradicional do partido gravita há 30 anos em torno de
intelectuais paulistas, muitos deles uspianos, muitos
exilados na ditadura, quase
todos antigos marxistas
que desacreditaram do
marxismo durante o exílio.
Em termos geracionais e
ideológicos, Alckmin significa outra coisa. Subiu na
política pelas mãos de Mário Covas, a quem os "intelectuais" respeitavam, mas
à distância. Em vez de ex-marxista, Alckmin é católico conservador; em vez de
cidadão cosmopolita, ostenta com orgulho a marca
do interiorano; em vez de
sociólogo ou economista, é
um gerente pós-ideológico.
OTAVIO FRIAS FILHO é diretor de Redação da Folha
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