São Paulo, domingo, 05 de outubro de 2008

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PF vê indício de caixa dois no MA em 2006

Diálogo envolvendo nora de Sarney é base da suspeita da polícia; mesmo sem empregados, factoring movimentou R$ 11,6 milhões

Na sexta, Fernando Sarney atribuiu as acusações a "interesses políticos"; ele não comentou as suspeitas sobre lavagem de dinheiro

LEONARDO SOUZA
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Um diálogo entre Teresa Sarney e uma mulher não identificada é apontado no relatório da Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, como um dos principais indícios de que a família do empresário Fernando Sarney utilizou uma factoring para formar um caixa dois supostamente empregado na campanha de 2006.
De propriedade de Teresa, mulher de Fernando, a São Luiz Factoring não tem nenhum empregado registrado nem linha telefônica, mas movimentou R$ 11,6 milhões naquele ano. Conforme a Folha publicou em janeiro, a PF iniciou as investigações do caso a partir do rastreamento de saques em dinheiro vivo de R$ 3,5 milhões feitos de empresas da família Sarney no período eleitoral de 2006. Desse valor, Fernando sacou R$ 2 milhões nos dias 25 e 26 de outubro -três dias antes do segundo turno.
Em escuta autorizada pela Justiça, a PF captou, no dia 10 de janeiro, por volta das 20h, uma conversa entre a mulher de Fernando Sarney e uma mulher não identificada com referência a reportagem publicada naquele dia. O diálogo diz o seguinte: MNI (Mulher não identificada): "Tu já olhou alguma coisa na internet a respeito da família Sarney?" Teresa: "Vi, meu nome tá lá."
MNI: "Que doidice é essa?" Teresa: "Aquele dinheiro que a gente sacava na época da campanha." MNI: "Da campanha, né?" Teresa: "Ahã." Fernando é filho do senador José Sarney (PMDB-AP) e irmão da senadora Roseana Sarney (PMDB-MA) e do deputado Sarney Filho (PV-MA). A suspeita dos policiais é que o dinheiro do suposto caixa dois tenha sido usado na campanha de Roseana ao governo do Estado, quando disputou e perdeu a eleição para Jackson Lago (PDT). Na sexta-feira, Fernando Sarney disse ser um homem do setor privado e atribuiu as acusações a "interesses políticos".
Na ocasião, ele não quis se manifestar sobre as suspeitas de lavagem de dinheiro alegando não ter tido acesso ao inquérito policial. A Folha não conseguiu localizá-lo ontem. De acordo com a PF, a São Luiz Factoring foi criada para acobertar a movimentação de recursos do grupo Mirante (principal negócio da família Sarney) com a provável finalidade de "sonegação tributária e/ou formação de caixa dois".

Pagamentos
A empresa funciona no mesmo endereço da TV Mirante e é operada por Luzia Campos de Souza, funcionária do grupo, de confiança de Fernando Sarney. A Polícia Federal descreve vários pagamentos e tarefas pessoais realizadas por Luzia a mando de Fernando.
A polícia rastreou 23 cheques da factoring para Maria Raimunda Campos Barbosa, irmã de Luzia, no valor somado de R$ 351 mil. Todos foram sacados em dinheiro na boca do caixa, entre 2005 e 2006. "A mesma [Maria Raimunda] não ostenta status social compatível com tal movimentação, evidenciando que a mesma também pode ter sido usada como laranja do grupo", escreveram os policiais. "Outro ponto suspeito" levantado pela PF foi a identificação de centenas de depósitos em espécie em favor da São Luiz, o que não é compatível com a atuação de uma factoring, segundo a PF.
Os policiais constataram também "grande quantidade de cheques" da Gráfica Escolar e da Televisão Mirante (ambas da família Sarney) para a São Luiz, alguns de valor superior a R$ 200 mil.
"Tal situação pode configurar, ainda, a mera troca de cheques, o que é vedado para [uma] factoring, uma vez que os títulos de créditos vendidos a factoring devem ser embasados em operações oriundas da atividade comercial da empresa cedente dos créditos." Conforme a Folha publicou ontem, no inquérito da Operação Boi Barrica a PF acusa Fernando Sarney de tráfico de influência no Ministério de Minas e Energia, na Eletrobrás, na Eletronorte, na Valec (estatal do Ministério dos Transportes responsável pela construção da Ferrovia Norte-Sul) e na Caixa Econômica Federal, para favorecer negócios privados.
Segundo a PF, Fernando Sarney e sua família montaram uma rede de lavagem de dinheiro, em alguns dos casos com a utilização de prováveis laranjas, pela qual movimentaram nos últimos três anos mais de R$ 10 milhões irregularmente. O principal braço do esquema, de acordo com os policiais, é a São Luiz Factoring.


Colaborou ELVIRA LOBATO , da Sucursal do Rio

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