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ANÁLISE
Programa lembra obra antiliberal
VINICIUS TORRES FREIRE
COLUNISTA DA FOLHA
Além de título com mania de
grandeza do programa do PT,
"A Grande Transformação" é
um estudo brilhante e erudito
de história econômica publicado em 1944 por Karl Polanyi
(1886-1964), intelectual húngaro nascido em Viena e que lecionou nos EUA. O livro é, porém, um clássico algo marginal.
Com a decadência do marxismo, ressuscitou nos 1980-90
em cantos de esquerda de universidades de França e EUA.
A tese de Polanyi é que, "nunca antes", relações sociais foram tão subordinadas à economia mercantil como em meados dos século 19, auge do liberalismo. Tal sistema não poderia subsistir na forma "pura"
por provocar degradação dos
mais pobres e por ofender interesses de classes diversas, como
agricultores ou até banqueiros.
No liberalismo ideal, por um
breve período real, o sistema
econômico era ou deveria ser
livre de interferências de qualquer outra instituição social; o
produto (bens) é distribuído
apenas por meio do comércio
(venda); os indivíduos agem
apenas pelo interesse de maximização do ganho material.
Em particular, Polanyi observa que, em tal sistema, trabalho, terra e dinheiro também
são feitos mercadorias, mas
"mercadorias fictícias" (não foram criados para a venda), uma
novidade histórica. Normas
quase feudais por exemplo limitavam a circulação de trabalhadores ainda na Inglaterra da
Revolução Industrial; a caridade organizada criava um piso
para salários: não havia mercado livre de trabalho.
No auge do livre comércio e
da utopia liberal, havia autorregulação (quase) automática do
sistema monetário e do comércio mundiais, ausência quase
total de proteção ao trabalho e
de intervenção estatal antimercado. Foi época também de crises financeiras e recessões brutais devidas aos ajustes no comércio e na produção provocadas pelo padrão-ouro (um tipo
de câmbio fixo universal) e,
consequentemente, de revoltas
sociais revolucionárias. O liberalismo "puro" acabou por provocar as reações que lhe deram
cabo. Redundaram em intervenções como a regulação da finança, impostos para financiar
direitos sociais e, enfim, no Estado de Bem-Estar Social do
mundo rico do pós-guerra.
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