São Paulo, quinta-feira, 06 de abril de 2000


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FORO PRIVILEGIADO
Velloso faz "apelo à sensatez"
STF critica proposta de deputados

SILVANA DE FREITAS
da Sucursal de Brasília

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Carlos Velloso, fez ontem um "apelo à sensatez" dos deputados para que recuem na proposta de concessão do chamado foro privilegiado a ex-autoridades públicas, feita por líderes governistas na reforma do Judiciário.
Velloso e o ex-presidente do STF Celso de Mello disseram que o Congresso deveria eliminar esse "privilégio" para todos os cargos, inclusive o de presidente da República, como previu originalmente a relatora da reforma do Judiciário, deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP), em vez de ampliá-lo.
Ambos disseram que essa proteção especial contraria o princípio republicano da igualdade entre as pessoas. Os dois citaram o exemplo dos Estados Unidos, onde não há foro privilegiado.
O foro privilegiado é o direito de autoridades só serem processadas e julgadas por determinados tribunais, dependendo do cargo que ocupam, e não pela primeira instância judicial, nas acusações de prática de crime comum, como homicídio. Pela reforma do Judiciário, a proteção também valerá para os processos por atos de improbidade administrativa, como lesão ao patrimônio público.
Somente o STF, por exemplo, pode julgar o presidente da República, ministros de Estado e parlamentares federais em crimes comuns. O foro dos governadores é o STJ (Superior Tribunal de Justiça), e o dos prefeitos é o Tribunal de Justiça do Estado.
Também gozam dessa proteção especial os juízes, os procuradores, os secretários de Estado e os deputados estaduais.
A Constituição nunca protegeu os ex-ocupantes de cargos públicos. O STF admitiu o foro especial para ex-autoridades durante 35 anos, mas a rejeitou, em 99, por decisão unânime, por entender que a proteção é ao cargo e não à pessoa que o ocupa ou que o ocupou.
Após renunciar ao cargo, em 1992, o ex-presidente Fernando Collor foi processado pelo STF em processo criminal no qual era acusado de corrupção passiva. Foi absolvido por falta de provas.
"Faço apelo à sensatez dos congressistas. Além de não prestar obséquio aos princípios republicanos, (a proposta) vai agravar a lentidão da Justiça, particularmente do STF, do STJ) e dos tribunais de Justiça dos Estados."
Mais incisivo na crítica aos parlamentares, Mello questionou a existência de compromisso deles com os princípios republicanos. "Para que tipo de República o Congresso está legislando?"
Segundo Mello, os parlamentares federais eram julgados pela primeira instância judicial até a Constituição de 1969, outorgada pela Junta Militar. "Isso jamais comprometeu a independência ou afetou a dignidade legislativa."
"Essa emenda aglutinativa representa um instante de ruptura clara com os padrões políticos e jurídicos que devem reger a República", disse Mello.
"O Congresso, ao ampliar as hipóteses de foro privilegiado, parece ir na contramão de uma tendência que, se fosse fiel ao postulado republicano, na verdade deveria reduzir até a supressão total."


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