São Paulo, domingo, 06 de abril de 2008

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"Manipulação" surge como nova versão para o dossiê

Dilma Rousseff, ao comentar reportagem da Folha, não esclarece contradições do caso

Chefe da Casa Civil aponta adulteração em fragmento cuja autenticidade já havia sido confirmada pela equipe de seu próprio ministério

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Passados os dez primeiros dias da crise do dossiê, a Casa Civil lançou, na noite de quarta-feira, a versão de que teria havido manipulação de informações na base de dados criada com despesas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
A hipótese de manipulação ganhou força na entrevista de sexta-feira da ministra Dilma Rousseff. "Tem uma parte que é verdade, tem uma parte que saiu do nosso banco [de dados]. Nós estamos querendo ver o que do nosso banco foi manipulado e o que não foi. Nós não afastamos hipótese nenhuma, hoje", afirmou Dilma. "Nós estamos cruzando item a item."
Os mais de 40 minutos de fala da chefe da Casa Civil não afastaram, porém, as contradições do caso do dossiê, que já obrigaram o Planalto a recuar de versões apresentadas antes.
A entrevista foi uma resposta à manchete da Folha de sexta-feira com detalhes do dossiê sobre gastos do ex-presidente, sua mulher, Ruth Cardoso, de ministros tucanos e até da chef de cozinha Roberta Sudbrack, que prestava serviços a FHC.
Cópia de arquivo Excel da base de dados da Casa Civil, a que a Folha teve acesso, mostra que os relatórios do governo tucano foram criados na tarde de 11 de fevereiro, exatamente às 15h28. O arquivo também registra a data em que foi feita a cópia, extraída diretamente dos computadores da Presidência: 18 de fevereiro.
As informações lançadas no período de uma semana em três das pastas do arquivo conferem na íntegra com as 13 páginas de trechos do dossiê que já circulavam no Congresso. Ou seja, o dossiê saiu pronto do Planalto. As suspeitas de montagem lançadas pela Casa Civil se dirigem a uma coluna onde está escrito "observações". São anotações de viés político registradas nas planilhas.
Na sexta-feira, Dilma afirmou categoricamente que a base de dados do Planalto não contém a coluna "observações", abrigo de boa parte das notas de viés político do trabalho. A existência dessa coluna já havia sido registrada com destaque na edição de 22 de março da revista "Veja".
Em duas notas enviadas à Folha nos dias seguintes, a Casa Civil não contestou a existência dessa coluna. Tampouco uma das anotações contidas nela, ao lado do registro da compra de 180 garrafas de champanhe, em 1998. Nesse caso, lê-se na coluna observações que parte do valor de R$ 2.250 havia sido pago pela campanha eleitoral da reeleição.
"Cabe ressaltar que a revista publicou fragmentos de relatórios impressos de processos referentes a contas tipo B", escreveu a assessoria de imprensa da Casa Civil. No dia seguinte, repetiu: "Como informado ontem a esse jornal, a revista "Veja" utilizou em sua reportagem fragmentos de relatórios impressos de processos referentes a contas tipo B". Como a revista estampou apenas quatro fragmentos do dossiê, todos eles com a coluna "observações", é difícil acreditar que a Casa Civil tenha se enganado num ponto tão relevante.
Na sexta-feira, a Folha perguntou à ministra se ela considerava a forma de organização da base de dados do Planalto, assim como o viés político de algumas anotações, "compatíveis com uma atividade meramente administrativa de organização de dados" do governo tucano. A resposta da ministra: "Eu já te adianto que eu não acho, não. E é essa coluna [observações] que nós achamos muito estranha". Na seqüência, a ministra disse que essa coluna inexiste na base do Planalto.
Para sustentar a versão de que os documentos do Planalto a que a Folha teve acesso teriam sido manipulados, Dilma alegou que "em uma planilha Excel, monta-se o que se quer".
A ministra não considerou a hipótese de que as planilhas registram data e horário de alterações e que a base de dados pode ser objeto de uma perícia. Insistiu que a auditoria nos cinco computadores usados na base de dados será feita pelo ITI (Instituto Nacional de Tecnologia da Informação), vinculado à Casa Civil.
Mal iniciada a investigação, a Casa Civil já mudou a versão de que o levantamento partira de determinação do Tribunal de Contas da União. Mais de uma semana após a Folha apontar contradição nessa versão, a Casa Civil escreveu, na quarta: "Nunca foi dito que o sistema foi criado por recomendação explícita do TCU".


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