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São Paulo, sexta-feira, 06 de junho de 2003

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QUESTÃO INDÍGENA

Repasse de recursos para ONG no Amazonas está atrasado desde 1º de abril; 20 mil são prejudicados

Índios ficam sem atendimento médico

FABIO SCHIVARTCHE
DO PAINEL

Vinte mil índios da região do Alto Rio Negro, no Amazonas, estão sem atendimento médico por causa de atraso no repasse de recursos do governo federal.
Na segunda-feira, a Foirn, ONG responsável pelos serviços médicos a essa população, paralisou suas atividades por falta de verba. Eles esperam desde 1º de abril o repasse do governo federal para pagar seus funcionários.
Segundo a Funasa (Fundação Nacional de Saúde), o atraso deve-se a pendências no convênio e ao "trâmite burocrático normal nessa situação". Informou ainda que a segunda parcela do recurso, no valor de R$ 2,5 milhões, seria depositada ontem -o que, até o fechamento desta edição, não tinha sido confirmado .
A paralisação na saúde ocorre dias antes da viagem do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, à área indígena Raposa/ Serra do Sol, na vizinha Roraima.
Neste final de semana, a última equipe de médicos e enfermeiros que ainda percorre a cabeceira do rio Negro voltará à base de São Gabriel da Cachoeira.
Segundo Luciana Pires, coordenadora da Foirn, o contrato com o governo previa o pagamento de R$ 8,2 milhões, em quatro parcelas. "Sem o dinheiro, não temos combustível nem para levar os médicos de barco às tribos."
O fim do atendimento emergencial é o que mais preocupa. Há sete meses, um garoto de seis anos foi picado no rosto por uma jararaca, na comunidade de Pari-Cachoeira, a dois dias de barco da sede da Foirn. Ele sobreviveu porque foi levado a um hospital de Manaus. Se, no entanto, o acidente ocorresse na próxima semana, é bem provável que morresse, já que nenhuma das 30 equipes está subindo o rio no momento.
Dinheiro que não chega no prazo previsto é uma constante desde 2000, quando a Foirn dividia com outras três entidades a responsabilidade de atender os 35 mil índios do Alto Rio Negro -10% da população indígena brasileira.
Ano após ano, as instituições foram desistindo da função, por falta de repasses de verba da Funasa. Em agosto de 2001, índios da região tiveram de cruzar a fronteira e se deslocar até a Colômbia em busca de socorro médico.
Em fevereiro deste ano, foi a Diocese de São Gabriel da Cachoeira que desistiu, deixando para a Foirn o atendimento a todos os 20 mil índios da região.
Há outra grave distorção no atendimento: a falta de uma política de saneamento básico.
O principal problema médico no Alto Rio Negro é a alta incidência de parasitoses digestivas. Só em 2002 elas causaram 95 óbitos. E um em cada dois índios foi submetido a tratamento com remédios. Mesmo com esses índices alarmantes, apenas um poço artesiano foi entregue aos índios da região, que contraem as parasitoses bebendo água contaminada.
Semana passada, médicos encontraram crianças da aldeia Waguiá, no rio Papuri, alimentando-se apenas uma vez a cada três dias.
"Vivemos uma situação limite", diz Pires. "Sem o dinheiro, o número de óbitos vai explodir."


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