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NO PLANALTO
Senado oscila entre o inacreditável e o impensável
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
No seio de suas estruturas
arredondadas, o Congresso produz uma rotina cada vez
mais chata. O nada que passeia
pelos túneis obscuros de Niemeyer
vive de emboscar o interesse público. A penúltima cilada é uma
peemedebice. Mais uma.
Sob a cuia emborcada que esconde o plenário do Senado, vai a
voto nos próximos dias a indicação do senador Luiz Otávio
(PMDB-PA) para o posto de ministro do TCU. Se referendado pelos colegas, Luiz Otávio ocupará
simultaneamente duas cadeiras.
Acumulará os assentos de
membro do Tribunal de Contas e
de réu em processo que corre no
STF. À condição de suposto profanador das arcas públicas, o senador agregará a credencial de
guardião do erário. Será juiz e
suspeito.
Luiz Otávio foi indicado no ano
passado. Designou-o o líder do
PMDB, Renan Calheiros. Obteve
a aquiescência dos demais líderes.
Entre eles os petistas Tião Viana e
Aloizio Mercadante.
Passou pelo crivo da Comissão
de Assuntos Econômicos do Senado -20 votos a favor; um contra,
de Eduardo Suplicy. O placar dilatado não diluiu o constrangimento. Dos 27 titulares da comissão, 11 faltaram à reunião. Tiveram de ser substituídos por suplentes.
Em 2001, Luiz Otávio foi denunciado à Comissão de Ética do
Senado. Relatora do processo, a
senadora Heloísa Helena, petista
insurreta, hoje sem partido, propôs a abertura de processo disciplinar contra o colega. "Tenho
farta documentação", dizia.
O processo foi ao arquivo. Mas a
idoneidade de Luiz Otávio manteve-se em suspenso. O Senado esquivando-se de enfrentar o mérito das acusações. Alegou-se que
as supostas malfeitorias haviam
sido praticadas em 1992, ano em
que o político paraense ainda não
era senador.
Luiz Otávio gerenciava à época
uma firma de navegação do sogro, a amazônica Rodomar. Obteve financiamento de cerca de
R$ 13 milhões. Grana do BNDES,
repassada pelo Banco do Brasil.
Serviria para a aquisição de 13
balsas. Jamais foram construídas.
Mas Luiz Otávio atestou o recebimento das embarcações.
Investigação da Polícia Federal
concluiu que a verba foi malversada. O Ministério Público ofereceu denúncia. A "farta documentação" de que falava Heloísa Helena foi às mãos do então procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro. Embora afeiçoado
à gaveta, Brindeiro viu-se forçado
a remeter a papelada ao STF. O
Supremo abriu uma ação penal,
ainda em curso.
O advogado Ricardo Luiz Rocha Cubas moveu no ano passado
uma ação contra a indicação de
Luiz Otávio para o TCU. O juiz federal Guilherme Brito sustou o
processo de nomeação. O Senado
recorreu. E a sentença foi cassada.
Há 15 dias o TCU enviou ofício
ao presidente do Congresso. Em
tom polido, o tribunal cobrou de
José Sarney uma definição. Sarney foi a Luiz Otávio. Disse-lhe
que levaria o assunto ao plenário.
"Não vejo razões para abrir mão
de uma indicação que não postulei", disse, impávido, Luiz Otávio.
Se aprovado no Senado, o nome
será submetido ao escrutínio do
plenário da Câmara. Deve passar. O ex-PT não parece disposto
a comprar brigas. Na bica de se
aposentar, o ministro Humberto
Souto abrirá nova vaga no TCU.
O substituto virá da Câmara. E o
petismo deseja emplacar o deputado José Pimentel (PT-CE).
Passando pelo crivo dos deputados, o nome de Luiz Otávio subirá
ao Palácio do Planalto. Lula pode
vetá-lo. Mas é improvável que o
faça. A despeito das interrogações
que envenenam sua biografia, o
senador integra o consórcio governista. É padrinho de graduados funcionários da administração do ex-PT.
Um deles, Djalma Bezerra de
Mello, é diretor da ADA (Agência
de Desenvolvimento da Amazônia), a autarquia que sucedeu a
$udam. "O Djalma é meu fraternal amigo há muitos anos, mas
não fui eu quem o indicou", exime-se Luiz Otávio. "Indiquei gente sim, mas para a Dataprev [autarquia de processamento de dados da Previdência Social]."
O bom senso desaconselharia a
aprovação para o TCU de alguém
ainda sujeito a condenação por
improbidade. Mas, se o Congresso
fosse feito à base de sensatez, talvez faltasse material.
Luiz Otávio está sendo apontado para a vaga do também peemedebista Iram Saraiva. O ex-senador aposentou-se do TCU sob
constrangimentos. Foi denunciado pelo Ministério Público. Acusaram-no de ser sócio oculto de
uma faculdade goiana, supostamente beneficiada por favores de
empreiteiras.
Ouvido na semana passada,
Luiz Otávio jurou ao repórter:
"Não me beneficiei de nenhum
centavo de verba pública. A empresa que dirigi ficou insolvente
porque foi perseguida por Jader
Barbalho, que governava o Pará.
Mas não devemos nada ao
BNDES".
Filiado a um PMDB que, no Pará, é controlado pelo mesmo Jader
Barbalho que teria sido seu algoz,
Luiz Otávio traz o rosto pintado
para a guerra. "Fui indicado pelo
partido. Não postulei nada. O Senado, se quiser, pode rejeitar o
meu nome."
Nos bastidores, o PMDB chegou
a tramar candidaturas alternativas ao posto de ministro do TCU.
A mais sólida é a da senhora Íris
de Araújo. É suplente do senador
Maguito Vilela. Suas credenciais?
Foi primeira-dama de Goiás. É
mulher do ex-governador e ex-senador homônimo Iris Resende
(PMDB-GO). O inacreditável seria trocado pelo impensável.
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