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Ensino e saúde crescem, mas falta qualidade
Após a Constituição, avanço na cobertura desses serviços foi incentivado pelo governo federal, dizem especialistas
FLÁVIO FERREIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
O processo de descentralização administrativa preconizado pela Constituição de 1988
estendeu os serviços básicos de
saúde e educação a quase todo o
país, mas ainda é preciso levar
qualidade aos sistemas públicos municipalizados e estadualizados nos últimos 20 anos.
A conclusão é de pesquisadores do Centro de Estudos da
Metrópole do Cebrap (Centro
Brasileiro de Análise e Planejamento), que avaliaram o processo de transferência de competências entre as esferas do
Poder Executivo do país nas últimas décadas.
Marta Arretche e Eduardo
Marques, membros do centro e
professores do Departamento
de Ciência Política da USP, afirmam que o avanço na cobertura dos serviços públicos de saúde e educação foi impulsionado
por uma atuação direta do governo federal, seja por meio de
programas de incentivo, com
repasses de recursos, seja por
uma forte regulamentação,
principalmente quanto aos valores mínimos de investimento
nessas áreas.
Atualmente, os prefeitos são
obrigados pela legislação a aplicar 25% do Orçamento em educação e 15% em saúde.
Segundo dados do IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 2.450 dos
4.650 dos municípios existentes no país em 1992 não possuíam postos ou centros de
saúde. Em 2005, o número de
cidades sem os postos era de
apenas seis, em um universo de
5.558 municípios, de acordo
com o IBGE.
Os números da cobertura na
educação básica também melhoraram nas últimas duas décadas. A taxa de atendimento
escolar, que consiste no percentual da população que se encontra matriculada na escola,
para as crianças com idade entre 7 e 14 anos, era de 80,9% em
1980. Em 2000, o índice já era
de 96,4%, segundo os registros
do Inep (Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), órgão do
Ministério da Educação.
Porém, os serviços de educação e saúde que chegam aos
brasileiros ainda estão longe de
atingir os padrões de qualidade
dos países desenvolvidos, segundo os pesquisadores.
"Mesmo nas políticas sociais
em que se massificou o acesso
da população, isso se deu com
qualidade muito baixa. A política de educação fundamental é
um exemplo disso. Foi reduzido o número de crianças fora da
escola, mas a qualidade é bastante ruim", afirma Marques.
"Hoje os desafios das políticas sociais estão mais concentrados na melhoria da qualidade do que no aumento da quantidade, embora continuem
existindo lugares em que há ausência de serviços ou serviços
deficitários em termos quantitativos", segundo o professor.
Arretche cita uma exemplo
europeu para ilustrar a complexidade em se alcançar altos padrões de qualidade nos serviços
públicos. "A Inglaterra, no começo do século 20, levou quase
40 anos para resolver simultaneamente o problema da cobertura e da qualidade", diz a
pesquisadora.
Regulação federal
Segundo Arretche, um aspecto pouco lembrado no processo
de descentralização foi o significativo papel do governo federal na coordenação e regulação
das políticas sociais, principalmente a partir dos governos de
Fernando Henrique Cardoso,
entre 1995 e 2002.
"Nos setores de políticas em
que não houve esse tipo de
coordenação, como em transporte público e saneamento básico, os avanços foram muito
desiguais nas diversas regiões
do país", diz Marques.
"Há políticas que são descentralizadas, mas não reguladas,
como transporte e infra-estrutura urbana. Estas não são priorizadas. É muito baixa a prioridade mesmo em grandes cidades, que possuem uma necessidade enorme. É por isso que a
situação do transporte e da infra-estrutura urbana é caótica
em qualquer grande cidade
brasileira", afirma Arretche.
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