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São Paulo, quinta-feira, 06 de novembro de 2003

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TERCEIRO MUNDO

Presidente agora afirma que não pode reclamar de antecessores

Lula diz que não precisa de oposição porque já tem o PT

ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL A MAPUTO

Uma semana depois de ter chamado seus antecessores de "covardes" por não terem feito todo o possível pelo Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi ameno com a oposição, mas irônico com seu próprio partido, o PT.
"Não vou reclamar dos opositores. A oposição é para isso mesmo: falar mal dos outros. E sou de um partido fantástico. Quando tem de fazer crítica, é meu partido mesmo que faz, não precisa nem da oposição", disse o presidente.
A platéia, formada por intelectuais, políticos e estudantes reunidos no Centro Internacional de Conferências de Maputo, caiu na risada. Pegando embalo, Lula então recorreu ao seu auto-apelido da campanha do ano passado: "Lulinha paz e amor".
O presidente declarou ainda que ele passou sua vida inteira dizendo o que os outros deveriam fazer e que agora não tem o direito de reclamar de ninguém.
"Passei a vida inteira dizendo que os presidentes deviam fazer isso e aquilo. Pois bem, eu ganhei. Agora eu não vou reclamar de ninguém, porque ninguém pediu para eu ser candidato. Eu é que quis ser candidato, teimei, cheguei lá e agora o meu papel é fazer tudo aquilo que eu passei 30 anos criticando nos outros", disse o presidente, numa frase talhada para ser cobrada futuramente.

Desafio
Lula acrescentou depois: "A coisa que mais me desafiava a ser governo era ver se eu seria capaz de fazer aquilo que eu tanto reclamava que os outros não faziam".
No último dia 30, ao discursar na inauguração do aeroporto de Campina Grande (PB), Lula havia atacado duramente seus antecessores: "Cheguei à Presidência da República para fazer as coisas que precisavam ser feitas e que muitos presidentes, antes de mim, foram covardes e não tiveram coragem de fazer o que precisava ser feito".
Depois do insosso discurso escrito, o presidente enveredou por um longo e emocional improviso, fazendo inclusive um apelo geral a seus críticos: "Por favor, não me julguem agora. Eu tenho quatro anos de mandato. Não me julguem por dez meses e dez dias. Me julguem pelos quatro anos".
A certa altura, Lula avisou: "Não posso falar de improviso, senão não paro mais. E, se falar da minha vida, vocês não vão parar de chorar". Fez, porém, o contrário: passou a falar de sua vida.

Minha vida
"Na minha vida, só fiz coisas impossíveis", disse ele, começando por uma referência indireta à infância pobre em Garanhuns, Pernambuco: "Primeiro, sobreviver onde nasci. Em 1945, ultrapassar os cinco anos de idade era um milagre. Eu ultrapassei. Aos sete anos de idade, meu café da manhã era café preto com farinha de mandioca. Sobrevivi. Estou aqui forte e bonito", sob novas risadas.
O presidente também falou sobre o sindicalismo, que "não pode ficar no pé do Estado, porque senão não adianta nada", e foi irônico em relação ao Judiciário, com quem vive de polêmica em polêmica: "Tá cheio de imprensa brasileira aqui. Não posso falar porque já tem muita polêmica", disse ele, sem responder a uma pergunta de uma deputada oposicionista sobre o Judiciário brasileiro.
Lula defendeu a reforma política, com fidelidade partidária e com financiamento público de campanhas, "para que os candidatos não fiquem subordinados aos empresários".
Aos africanos, ensinou: "Ninguém respeita quem vive de cabeça baixa. O máximo que consegue é pena. Mas a gente tem que ter respeito, não pena".


As jornalistas Eliane Cantanhêde e Marlene Bergamo fazem a parte interna da viagem à África no avião reserva da Presidência, por falta de opções de vôos comerciais compatíveis com o roteiro do presidente Lula


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