São Paulo, terça-feira, 06 de dezembro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JANIO DE FREITAS

A hora de Lula

Todo governo vive pelo menos uma encruzilhada -afirmação cuja obviedade histórica dispensa a citação de exemplos. Mas poucos as enfrentam, por falta de determinação ou por nem identificar seu momento decisivo, entre um e outro futuro possível.
A presidência de Lula está na sua hora crucial. A crise monitorada pela imprensa e pelas CPIs atingiu-o, no prestígio e na capacidade de reação, e atingiu o governo, que teve de perder partes relevantes como José Dirceu e Luiz Gushiken. Além do seu próprio desgaste, Lula ficou desarmado dos seus roteiristas.
A desarticulação do universo político do governo, iniciada ainda antes das denúncias que desvendaram suas entranhas, é absoluta. Atingido o esquema palaciano e imobilizado o próprio Lula pela perplexidade diante da avalanche, ao dispositivo político caberiam as ações táticas para preservar algum equilíbrio entre a Presidência e o governo, de um lado, e os fatos e as forças que o antagonizam. O dispositivo esfrangalhou-se no Congresso e, fora, o que certamente poderia constituí-lo -CUT, MST e outros movimentos- foi posto e mantido em estado catatônico pelo ultraconservadorismo da política econômica.
O encantamento com essa política econômica, nos segmentos detentores de influência na opinião pública e em setores de poder, sofre rachaduras crescentes, provocadas por sucessivos indicadores econômicos inquietantes, sem prenúncio confiável, mais do que palavroso, de que se invertam na medida necessária. Pronunciamentos fortes são apenas um sinal das preocupações que se disseminam no empresariado.
Se o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central não dão respostas convincentes a tais temores e dúvidas, limitados ao mesmismo otimista das tergiversações, a credibilidade de Antonio Palocci desinflou ainda mais com o seu envolvimento em denúncias nas CPIs, às quais até agora suas considerações mostraram apenas cautela. Daí nem se pode prever o que possa resultar, porque há investigações não divulgadas.
Os fatores negativos fecham o círculo. Lula não demonstra ter resposta para nenhum deles, muito menos para o todo. Mantém-se nos seus discursos de autolouvações e promessas que os fatos, nos três anos de governo, tornaram ineficazes. Há sinais de que está inquieto, irritado, inseguro das suas e das perspectivas do governo. Mas nada disso indica a percepção de estar em um daqueles momentos cruciais, que decidem o destino de um presidente ou de um governo. A depender só das decisões que ele, e só ele, tome em um sentido ou em outro. Ou deixe de tomar.
Perceba ou não, é nesta hora crucial que Lula está.


Texto Anterior: Alencar isenta Coteminas e diz que explicação cabe ao PT
Próximo Texto: Contabilidade paralela: Para Thomaz Bastos, depósito é "anormal"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.