São Paulo, sábado, 07 de janeiro de 2006

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MS tem 27 crianças desnutridas

HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM ANTÔNIO JOÃO (MS)

Vinte e sete crianças indígenas menores de cinco anos estão com desnutrição grave, segundo agentes da Funasa (Fundação Nacional de Saúde), no acampamento de 74 barracos de lona montado pelos índios guaranis-caiuás que foram retirados pela Polícia Federal de três fazendas em Antônio João (MS) em 15 de dezembro.
Uma criança de um ano e cinco meses morreu de desidratação no dia 19 passado e outra nasceu morta no dia da desocupação.
Além da desnutrição e da desidratação que atingem as crianças, há risco de conflito com fazendeiros. O acampamento, às margens de uma estrada estadual sem asfalto, fica a alguns metros da porteira da fazenda Morro Alto, onde foi morto com um tiro no peito e outro no pé, no dia 24, o índio Dorvalino Rocha, 39. Os disparos partiram do segurança da fazenda João Carlos Gimenes Brites.
Uma decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, levou à desocupação nas fazendas, cuja área de 9.300 hectares havia sido homologada como terra indígena pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em março. A PF usou 150 homens para retirar cerca de 700 índios guaranis-caiuás do local.
Ao menos 370 deles montaram um acampamento com barracos de lona preta, madeira e palha. Nesse local vivem 81 crianças menores de cinco anos, segundo os agentes comunitários da Funasa, os índios Sebastião Pedro, 37, e Dácio Gonzaga, 20.
Pedro diz dar assistência a 49 crianças, das quais 19 "estão com desnutrição severa". Gonzaga cuida de 32 e tem oito desnutridas em estado grave. Eles afirmam que a mudança das fazendas para o acampamento agravou o estado de saúde das crianças.
Eduarda Vilalba, de um ano e cinco meses, morreu devido a desidratação, vômito e diarréia. "No dia do despejo, o pessoal estava fazendo os barracos e a criança ficou sem comer. Ficou muito tempo no sol, na estrada", diz Pedro.
"A família também não recebia cesta básica do governo porque não tem documentos", acrescenta a professora indígena Léia Aquino, 38. "Ela [a criança] assustou muito com o avião e começou a vomitar. Chegou ao hospital e morreu", relata a mãe de Eduarda, Fátima Vilalba, 30, referindo-se ao helicóptero que a PF usou na ação para desocupar as fazendas.
Cristiane da Silva, de um ano e seis meses, pesava 8,7 kg no dia 19 de dezembro. Segundo Pedro, na quinta-feira passada ela estava com 7 kg. Conforme o pai, André da Silva, 29, a menina está sofrendo com vômito e diarréia.
"Essa aí [aponta para a filha, no colo da mãe] não parava. Andava e brincava o tempo todo, agora está triste", afirma Silva.
"Quando acabei de fazer uma casinha com uma baita sombra, tiraram a gente de lá", acrescenta o índio. Ele diz ter perdido mais de um hectare de milho.
Outra criança perdeu quase dois quilos, segundo a mãe Célsia Flores. Lurdes tem um ano, mas parece bebê de poucas semanas de vida. Pesa 7,5 kg. Na tarde de quinta-feira, ela tomava mamadeira com leite doado pelo governo de Mato Grosso do Sul. As cestas básicas para famílias de cinco pessoas duram pouco mais de uma semana, diz Léia Aquino.
Os índios conseguiram puxar água do distrito de Campestre, a 50 m do acampamento, mas o que sai da torneira é quente demais para beber durante à tarde.


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