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Ida para Taguatinga aproxima o governo do DF da Brasília real
Pensada para ser dormitório para 25 mil pessoas, cidade-satélite
tem hoje dez vezes essa população e vida independente da capital
Recém-empossado no cargo
de governador, Arruda (PFL)
justifica a mudança: "O
governo deve estar perto do
povo, e o povo está aqui"
LEILA SUWWAN
LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Planejada para ser apenas cidade-dormitório de Brasília,
Taguatinga virou, no dia 2 de
janeiro, a capital de fato do Distrito Federal. A mudança reforça simbolicamente o isolamento econômico, social e burocrático de Brasília, inaugurada há
46 anos e que abriga só os quatro bairros mais ricos e o aparato do governo federal.
O recém-empossado governador José Roberto Arruda
(PFL) inaugurou na última semana o novo centro administrativo do DF, que funcionará
em um antigo quartel de polícia
reformado em Taguatinga.
Com isso, a cidade-satélite
vai centralizar o governo local.
As três cidades (que não são assim consideradas oficialmente)
naquela região -Taguatinga,
Ceilândia e Samambaia- têm
juntas 751,8 mil habitantes, ou
37,6% da população do DF.
Taguatinga surgiu em 1958,
dois anos antes da inauguração
da capital, por pressão popular.
Fica em um local onde ônibus
carregados de migrantes eram
obrigados a dar a volta.
Muitos desciam naquela região para tentar a sorte, mas
não encontravam lugar para
morar no Núcleo Bandeirante e
Candangolândia, as cidades
"temporárias" que deveriam
ser desmanteladas em 1960,
mas viraram satélites também.
Taguatinga havia sido planejada por Lucio Costa, parceiro
de Oscar Niemeyer. Mas deveria sair do papel em 1970, dez
anos após Brasília, para alojar,
no máximo, 25 mil pessoas.
Hoje tem dez vezes isso.
O "inchaço" do DF já era fato
em 1958, quando o presidente
Juscelino Kubitschek ordenou
que Taguatinga fosse regularizada e lotes distribuídos.
"O povo está aqui"
"O sonho de Kubitschek não
era que Brasília se tornasse um
oásis numa região economicamente deserta e socialmente
injusta", disse Arruda à Folha
na quinta-feira em seu novo gabinete, instalado em um amplo
salão com baias individuais para seus secretários de governo.
"O Plano Piloto deve seguir
sua função original, de ser capital do país. Mas o povo está
aqui, e o governo precisa estar
perto do povo", completou.
Arruda diz que seu gesto vai
mudar a dinâmica socioeconômica do DF, a começar pelos
carros e ônibus que engarrafam as vias de acesso ao Plano
Piloto de manhã. Pelo sim, pelo
não, Arruda usou helicóptero
para ir trabalhar nesta semana.
Simbolicamente, a mudança
do governo do DF reverte o
preconceito contra os trabalhadores que migram diariamente ao centro. O metrô, cuja
primeira linha ligou Taguatinga ao Plano Piloto, foi criticado
em meios de classe média alta
pelo temor de que aumentaria
a criminalidade.
Duas realidades
No imaginário nacional, Brasília é uma ilha administrativa,
afastada da realidade social do
país. Seu índice de desenvolvimento humano estava em
0,936 em 2002, ficando próximo ao de países desenvolvidos
como EUA e Holanda, conjunto na faixa de melhor qualidade
de vida. O índice do Brasil naquele ano era de 0,757.
A renda por pessoa em Brasília também é alta: R$ 1.770. O
DF é dividido em "regiões administrativas", que separam
bairros e cidades-satélites.
Os bairros Lago Sul e Lago
Norte, por exemplo, às margens do Paranoá, abrigam casas
de alto padrão. Já a Asa Sul e a
Asa Norte são as "asas" do avião
concebido por Niemeyer -e
têm desde quitinetes populares
a apartamentos caros.
O DF também incorporou
duas cidades de Goiás, Brazlândia e Planaltina. E para manter
a exclusividade dos "lagos" e
das "asas", surgiram as satélites. A maior e mais emblemática é Ceilândia. Seu nome deriva
da CEI (Campanha de Erradicação de Invasões).
Taguatinga, com vida econômica própria, se descolou da
pecha de dormitório. Tem forte
comércio e edifícios por toda a
cidade. Não é o caso de outras
satélites mais recentes, loteadas por governos passados para
moradores sem casa própria, e
por anos pouco mais que aglomerados de casas humildes.
De imediato, o QG de Arruda
em Taguatinga teve um efeito
prático. Cerca de 4.000 pessoas
tumultuaram a entrada da nova
sede nos dois primeiros dias de
trabalho, a maioria pedindo audiências ou emprego.
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