São Paulo, domingo, 07 de janeiro de 2007

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Ida para Taguatinga aproxima o governo do DF da Brasília real

Pensada para ser dormitório para 25 mil pessoas, cidade-satélite tem hoje dez vezes essa população e vida independente da capital

Recém-empossado no cargo de governador, Arruda (PFL) justifica a mudança: "O governo deve estar perto do povo, e o povo está aqui"

LEILA SUWWAN
LUCIANA CONSTANTINO

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Planejada para ser apenas cidade-dormitório de Brasília, Taguatinga virou, no dia 2 de janeiro, a capital de fato do Distrito Federal. A mudança reforça simbolicamente o isolamento econômico, social e burocrático de Brasília, inaugurada há 46 anos e que abriga só os quatro bairros mais ricos e o aparato do governo federal.
O recém-empossado governador José Roberto Arruda (PFL) inaugurou na última semana o novo centro administrativo do DF, que funcionará em um antigo quartel de polícia reformado em Taguatinga.
Com isso, a cidade-satélite vai centralizar o governo local. As três cidades (que não são assim consideradas oficialmente) naquela região -Taguatinga, Ceilândia e Samambaia- têm juntas 751,8 mil habitantes, ou 37,6% da população do DF.
Taguatinga surgiu em 1958, dois anos antes da inauguração da capital, por pressão popular. Fica em um local onde ônibus carregados de migrantes eram obrigados a dar a volta.
Muitos desciam naquela região para tentar a sorte, mas não encontravam lugar para morar no Núcleo Bandeirante e Candangolândia, as cidades "temporárias" que deveriam ser desmanteladas em 1960, mas viraram satélites também.
Taguatinga havia sido planejada por Lucio Costa, parceiro de Oscar Niemeyer. Mas deveria sair do papel em 1970, dez anos após Brasília, para alojar, no máximo, 25 mil pessoas. Hoje tem dez vezes isso.
O "inchaço" do DF já era fato em 1958, quando o presidente Juscelino Kubitschek ordenou que Taguatinga fosse regularizada e lotes distribuídos.

"O povo está aqui"
"O sonho de Kubitschek não era que Brasília se tornasse um oásis numa região economicamente deserta e socialmente injusta", disse Arruda à Folha na quinta-feira em seu novo gabinete, instalado em um amplo salão com baias individuais para seus secretários de governo.
"O Plano Piloto deve seguir sua função original, de ser capital do país. Mas o povo está aqui, e o governo precisa estar perto do povo", completou.
Arruda diz que seu gesto vai mudar a dinâmica socioeconômica do DF, a começar pelos carros e ônibus que engarrafam as vias de acesso ao Plano Piloto de manhã. Pelo sim, pelo não, Arruda usou helicóptero para ir trabalhar nesta semana.
Simbolicamente, a mudança do governo do DF reverte o preconceito contra os trabalhadores que migram diariamente ao centro. O metrô, cuja primeira linha ligou Taguatinga ao Plano Piloto, foi criticado em meios de classe média alta pelo temor de que aumentaria a criminalidade.

Duas realidades
No imaginário nacional, Brasília é uma ilha administrativa, afastada da realidade social do país. Seu índice de desenvolvimento humano estava em 0,936 em 2002, ficando próximo ao de países desenvolvidos como EUA e Holanda, conjunto na faixa de melhor qualidade de vida. O índice do Brasil naquele ano era de 0,757.
A renda por pessoa em Brasília também é alta: R$ 1.770. O DF é dividido em "regiões administrativas", que separam bairros e cidades-satélites.
Os bairros Lago Sul e Lago Norte, por exemplo, às margens do Paranoá, abrigam casas de alto padrão. Já a Asa Sul e a Asa Norte são as "asas" do avião concebido por Niemeyer -e têm desde quitinetes populares a apartamentos caros.
O DF também incorporou duas cidades de Goiás, Brazlândia e Planaltina. E para manter a exclusividade dos "lagos" e das "asas", surgiram as satélites. A maior e mais emblemática é Ceilândia. Seu nome deriva da CEI (Campanha de Erradicação de Invasões).
Taguatinga, com vida econômica própria, se descolou da pecha de dormitório. Tem forte comércio e edifícios por toda a cidade. Não é o caso de outras satélites mais recentes, loteadas por governos passados para moradores sem casa própria, e por anos pouco mais que aglomerados de casas humildes.
De imediato, o QG de Arruda em Taguatinga teve um efeito prático. Cerca de 4.000 pessoas tumultuaram a entrada da nova sede nos dois primeiros dias de trabalho, a maioria pedindo audiências ou emprego.


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