São Paulo, segunda-feira, 07 de março de 2005

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SOB SUSPEITA

Escola, em Joinville, teria sido usada para mandar dinheiro ao exterior; governador é suspeito de estar envolvido

Procuradoria investiga desvio no Bolshoi

FREDERICO VASCONCELOS
ENVIADO ESPECIAL A JOINVILLE (SC)

A Procuradoria Geral da República apura, em Brasília, a eventual responsabilidade do governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira (PMDB), diante das suspeitas de que a Escola do Teatro Bolshoi no Brasil, que ele criou em 2001 quando era prefeito de Joinville, serviu de cortina para encobrir o desvio de dinheiro público para o exterior.
Com instalações e recursos do município, a escola forma alunos, a maioria bolsistas, orientados por professores russos que transmitem a metodologia e a técnica do Teatro Bolshoi de Moscou.
Trata-se de projeto cultural e social elogiado por políticos e intelectuais petistas e tucanos, uma referência internacional, sendo a única escola do famoso balé em outro país. "Para ver o Bolshoi eu não preciso mais ir para a Rússia", disse o presidente Lula, ao visitar a escola, em março de 2003.
Essa imagem foi abalada por uma investigação conjunta do Ministério Público Estadual e Federal, iniciada no ano passado, quando os holofotes saíram do palco para iluminar os bastidores. Vieram à tona irregularidades atribuídas aos principais idealizadores do projeto e amigos do governador: o empresário Antônio João Ribeiro Prestes, engenheiro mecânico, um dos filhos do líder comunista Luís Carlos Prestes, e sua mulher, Joseney Braska Negrão, supervisora geral da escola.
A Folha teve acesso na Justiça Federal, em Joinville, aos autos da ação penal. Prestes, Joseney e outras sete pessoas foram denunciadas sob a acusação de peculato, desvio e formação de quadrilha.
A documentação sugere uma ação entre amigos, com intermediação de "empresas de papel" em paraísos fiscais, malversação de patrocínios oficiais, gastos sem controle e contratos fictícios arquitetados para justificar serviços inexistentes.
Foram também denunciados Sylvio Sniecikovski (ex-secretário de Cultura e presidente do instituto que administra a escola), Sérgio Ayres Filho (diretor administrativo), Luiz Carlos Meinert (diretor financeiro), Yuri Alexandre Ribeiro, Nei Barreto Quintino, Edson Bush Machado e Carlos Adauto Virmond Vieira.
Como o governador Luiz Henrique, patrono-fundador da escola, tem foro privilegiado, cópia dos autos subiu para a Procuradoria Geral da República. O caso foi distribuído à subprocuradora-geral Célia Regina Delgado.
Por meio de "contratos de agenciamento", quatro empresas de João Prestes, de seu irmão Yuri Alexandre Ribeiro e de outro sócio, receberam R$ 712 mil da escola supervisionada por Joseney, como intermediação do patrocínio dos Correios no total de R$ 10,5 milhões. Uma estranha cláusula desses contratos prevê que as taxas de comissão seriam discutidas "caso a caso", depois da prestação dos serviços.
Esse "agenciamento" foi negado pelo atual presidente dos Correios, João Henrique de Almeida Souza. Prestes tentou obter de Hassan Gebrin, ex-presidente, um atestado de que prestara a intermediação. Chegou a sugerir os termos dessa declaração escrita. Gebrin, contudo, não concordou. A empresa de Prestes também recebeu por "agenciamento" de patrocínio do Banco do Brasil.
Embora a Justiça tenha revogado recomendação do Ministério Público para suspensão imediata do apoio financeiro dos Correios, patrocinador oficial, Joinville teme pelo futuro da escola, mantida com receitas próprias, patrocínio de empresas privadas e mecenato federal (Lei Rouanet) e estadual. Em 2004, as receitas totalizaram R$ 5,7 milhões. Pelos cálculos do MPF, o custo per capita dos alunos é de R$ 28 mil por ano.
A escola possui 250 alunos, dos quais 94% são bolsistas. Eles recebem estudo, alimentação, uniformes, figurinos e assistência médica. O complexo escolar, numa área de 6.000 m2, é formado por salas para aulas de balé, estúdios de música, dois laboratórios cênicos e cantina. Projeto para a nova sede, em área de 31 mil m2, de autoria de Oscar Niemeyer, custou R$ 920 mil. A obra exigirá investimentos de cerca de R$ 40 milhões.


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