São Paulo, quinta, 7 de maio de 1998

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CELSO PINTO
América Latina na Suécia

Sinal dos novos tempos: pela primeira vez em sua história, a Suécia organizou um seminário de alto nível sobre investimentos na América Latina, terça-feira, em Estocolmo. Dos 400 participantes, 240 eram empresários. Estavam presentes seis ministros e cinco vice-ministros de onze países latino-americanos.
A única exceção: não havia um único representante do governo brasileiro, embora o Brasil seja, de longe, o país latino-americano com maior investimento sueco. O ministro da Fazenda, Pedro Malan, deveria ter ido. Não foi. O ministro da Indústria, Comércio e Turismo, Botafogo Gonçalves, deveria ter substituído Malan. Não substituiu.
Sem ninguém do governo, acabou falando pelo Brasil o responsável pelo Banco do Brasil em Bruxelas. Nem mesmo o embaixador do Brasil na Suécia se deu ao trabalho de assistir à conferência. A ausência brasileira foi largamente comentada.
Com o descaso oficial, perdeu-se mais uma boa oportunidade de vender o Brasil. Entre os participantes estava o presidente do Skandinaviska Enskilda Banken, Jacob Wallenberg, cuja família controla boa parte da economia sueca: a Electrolux, metade da Asea Brown-Boveri, a Ericsson e a Stora (celulose), entre outras, todas com grandes investimentos no Brasil. Outro participante foi o presidente da Volvo, Leif Johansson, além de altos executivos dos principais grupos suecos.
Jacob Wallenberg esteve recentemente no Brasil e voltou com uma impressão "muito positiva", como disse à coluna. O Skandinaviska tem um escritório de representação há 26 anos no Brasil e 10% do capital do Banco Mercantil Finasa. Wallenberg ampliou os limites de financiamento para o Brasil no ano passado, quer ampliar os negócios no país, mas diz que não, necessariamente, via aquisição de uma instituição local.
Dois negócios bilionários suecos estão em andamento. A Telia, estatal de telecomunicação, ganhou a concessão da Banda B com o consórcio Tess, no interior de São Paulo, por R$ 1,3 bilhão, e vai investir outro tanto em equipamentos. O Skandinaviska e outros bancos suecos, como o Swedbank, devem entrar pesado no financiamento.
Outro projeto bilionário é o da Veracruz Celulose, metade da Oderbrecht, metade da Stora. O projeto está na fase inicial, mas chegará a US$ 1,5 bilhão em investimentos.
Só estes dois projetos podem mais do que dobrar o estoque oficial de investimentos suecos registrados no Brasil, US$ 1 bilhão. São Paulo já é a segunda maior cidade industrial sueca, depois de Gotemburgo. A Câmara Sueco-Brasileira de Comércio calcula o estoque de capital sueco, incluindo o não-registrado, em US$ 4 bilhões.
Apesar da tradição em investir no Brasil, que vem dos anos 50, o interesse sueco pela América Latina só foi reavivado nos últimos dois anos. A crise da Ásia, segundo Wallenberg, ajudou. A América Latina já vinha de um processo de reformas bem sucedidas. Quando os países asiáticos entraram em colapso, e os latino-americanos sobreviveram, chamaram a atenção para a região.
A Suécia, tradicionalmente, prefere investir na região Báltica e na Ásia. A América Latina tinha a imagem de ser dominada pela burocracia, corrupção e intervencionismo, como diz o ministro do Comércio sueco, Leif Pagrotsky. "Leva tempo para mudar e ainda mais tempo para vender a nova imagem", observa.
O fato é que a América Latina tem hoje uma história melhor para vender. A "revolução silenciosa", como disse o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Enrique Iglesias, com a soma de reformas, retomada de crescimento, privatização e democracia.
Quem deu o tom da mensagem latino-americana foi o ministro das Finanças do Chile, Eduardo Aninat. A seu ver, do recente encontro de cúpula no Chile, surgiu um "Consenso de Santiago" na região, que se sobrepõe ao chamado "Consenso de Washington", que orientou as reformas liberais da última década. O novo consenso tem três ingredientes: a defesa da democracia, a defesa da economia de mercado e o reconhecimento de que é preciso uma presença forte do Estado para resgatar os problemas sociais.
Argentina, Peru, México, Colômbia, Venezuela, Uruguai, Bolívia, os países do Caribe e até Cuba, cada um teve uma história boa para contar na conferência, normalmente envolvendo maior abertura comercial, estabilidade e crescimento. Sobram muitas dúvidas na área social e algumas na área política. Mas não faltam oportunidades, inclusive no omisso Brasil.




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