São Paulo, quinta-feira, 07 de julho de 2005

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ARTIGO

Cenário lindo é palco de espetáculo deprimente

DANUZA LEÃO
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA

O cenário é lindo, mas o espetáculo, deprimente. É duro ver parlamentares fazendo o papel de investigadores, interrogando quem possível - e provavelmente - meteu a mão nos cofres públicos sem cerimônia. Alguns, como não têm essa vocação nem foram eleitos para isso, perguntam mal, se repetem, e desse jeito vai ser difícil chegar às chamadas provas, até porque nessa matéria ninguém passa recibo.
Essa história de roubar o dinheiro público sempre foi meio vaga; todo mundo sabe que é por isso que não temos hospitais nem creches nem escolas. Outro dia, quando fui mandar uma correspondência para São Paulo por Sedex e paguei R$ 20 por uma folha de papel, entendi tudo.
Os políticos são finíssimos: se atacam furiosamente, mas sempre colocando antes um "Vossa Excelência", ou "o ilustre deputado". Depois tomam cafezinho juntos, como se nada fosse.
As assessoras do PT não usam maquiagem nem salto alto nem fazem escova; em compensação, as do PSDB são impecáveis, parecem prontas para irem dali direto para um casamento, sem escala.
O dia começou bem: como os trabalhos da CPI estavam marcados para começar às 9h, cheguei às 8h30 para pegar minha credencial no 21º andar do edifício do Senado; a funcionária chegou às 9h10, e, na descida, o elevador parou no meio dos andares.
Quando o senador Delcídio Amaral entrou no recinto, fez o sinal da cruz e abriu os trabalhos "com a benção de Deus", o que talvez seja pouco.

Pílulas brasilienses
ACM babava com sua cria, o deputado ACM Neto, que masca chicletes sem parar; onde será que ele põe o chiclete quando fala? Debaixo do tampo da mesa, como os colegiais? Outra que tem o mesmo hábito é Luciana Genro, que não consegue esquentar a cadeira nem por cinco minutos.
Heloisa Helena é conhecida por falar muito, por isso sempre fica no fim da fila; sabendo disso, a senadora chegou ontem ao Congresso às 6h30, para ser a primeira. Como o tempo é marcado, assim que acabou de fazer suas perguntas, se inscreveu de novo, para poder falar mais uma vez, mesmo de madrugada.
Marcos Valério chama os deputados e senadores de Vossa Excelência e depois diz "vou te passar os documentos"; declarou possuir várias empresas que nunca funcionaram, nunca tiveram conta em banco, e, conseqüentemente, ninguém entende porque foram abertas -mas ele sabe.
Quanto ao fato de parte de uma dessas empresas estar em nome de sua mulher, foi claro: "ela pensou que eu fosse me separar dela". E acrescentou: "mas eu não queria". Foi quase um consultório sentimental.
O deputado Heráclito Fortes usava um terno que me fez pensar num samba de Paulinho da Viola que diz "Não posso definir aquele azul, não era do céu nem era do mar". Indefinível a cor do terno do parlamentar.
Rola um estresse entre o senador Aloizio Mercadante e o presidente da CPI. Segundo Mercadante, há no PT quem ache que Delcídio Amaral está tratando Roberto Jefferson bem demais.
A razão de o mundo político, governo e oposição, estar unido, em defesa do presidente Lula: se entrar o vice José de Alencar, ele baixa a taxa de juros para zero e explode a economia; e se quebrar uma perna, entra Severino, e aí - bem, passemos.
O novo ministro das Comunicações, Hélio Costa, chamava a atenção: é o único ser que conserva a cabeleira dos anos 60, quando era sucesso no "Fantástico" e as mulheres babavam por ele.
De repente, em plena CPI, entra Severino; mas Severino de terno preto e gravata borboleta? Com uma bandeja na mão? Era um garçom, mas tão igual, tão igual, que parecia irmão gêmeo do presidente da Câmara.
Deixa-se Brasília com a triste sensação de que nossa Câmara e nosso Senado, com sua deslumbrante arquitetura, não merecem passar pelo que estão passando; por outro lado, não existe lugar mais animado em todo o país.
E no restaurante, entre assessores, jornalistas, deputados e lobistas (de ambos os sexos), a paquera rolou solta. Haja o que houver, é só juntar homens e mulheres para que paire uma tensão no ar; e enquanto for assim, pode-se dizer que a pátria está salva. Ou quase.


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