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Faltam transparência e regras claras sobre ONGs, diz procurador
Segundo Tomáz de Aquino Rezende, país precisa de "novo marco legal" e governo deve monitorar resultado de entidades
Presidente de associação do Ministério Público para o terceiro setor quer definição de critérios sobre quem pode receber verba pública
FERNANDO BARROS DE MELLO
DA REDAÇÃO
O procurador de Justiça em
Minas Gerais Tomáz de Aquino
Rezende afirma que faltam dados confiáveis sobre as ONGs
no país. Por isso, coordenou um
censo sobre o setor em Belo
Horizonte (MG).
Para Aquino, a falta de clareza na legislação abre espaço para corrupção. Segundo ele, o cenário atual faz com que muitas
instituições não sejam eficazes.
"Fica beija-flor apagando fogo. Beija-flor não foi feito para
apagar fogo", diz o presidente
da Associação Nacional de Procuradores e Promotores de
Justiça de Fundações e Entidades de Interesse Social.
FOLHA - Qual a primeira constatação sobre as ONGs no país?
TOMÁZ DE AQUINO RESENDE - É que
não se tem informações sobre
elas. Dados do governo diziam
que existiriam 4.800 organizações sem fins lucrativos em Belo Horizonte, mas pela pesquisa que fizemos existem 1.800.
Segundo o IBGE, existem 270
mil instituições no Brasil, só
que esse número pode ser falso.
Veja, algumas instituições
têm cinco pessoas jurídicas no
mesmo endereço, quando na
verdade existe só uma. Por
exemplo, a associação recebe
uma multa por não declarar
imposto. Em vez de pagar, cria
uma nova associação e deixa a
outra registrada em cartório.
Essa passa a existir de direito,
mas não de fato.
FOLHA - O que fazer para fiscalizar?
RESENDE - É preciso definir critérios para quem vai receber o
dinheiro do governo. Não podem ser critérios políticos. E os
próprios ministérios devem ver
o que está sendo feito. Tem que
haver um monitoramento, mas
não do jeito que é feito. Uma
nota fiscal de cem pães significa
que cem pessoas comeram
pães? Não. Se você chegar na
esquina a uma padaria, você
consegue uma nota fiscal.
Precisamos monitorar resultados. Qualquer organização
que cuida de questões drásticas
e de interesse social, como, por
exemplo, pessoas em situação
de rua, tem que ter tempo de
validade. Como se fala de uma
associação que tem objetivo tirar criança da rua e ela existe há
20 anos? Ela é ineficiente, tem
que sair do mercado.
FOLHA - É preciso alterar a lei?
RESENDE - As leis que existem
sobre as relações entre os setores, sobre a relação com o governo, por exemplo, são péssimas. É preciso estabelecer um
marco novo. Não precisa dessa
parafernália de leis. Hoje, não
se pode remunerar dirigente.
Qual é o pecado em uma pessoa
receber pelo serviço? Quando
se fala em terceiro setor, não é
só gente que está querendo se
aproveitar de recurso público.
FOLHA - E os casos de ONGs que deveriam alfabetizar e não o fazem?
RESENDE - Falta transparência e
profissionalismo, e o governo
não tem cuidado de verificar a
quem libera recursos. Tem que
haver termos de parceria, verificação de resultados. Se tiver
problema, entra o MP, que dá
atestado de inidoneidade.
Se fizesse um censo, você poderia descobrir que existem
300 organizações que dão curso de alfabetização e poderia
selecionar melhor. Não seria
aquela que teve acesso ao Palácio a única a receber recursos.
Segundo, elas precisam se
profissionalizar. Muitas não
têm administração eficaz porque são novas e há uma ignorância coletiva. Pessoas estão
em organizações sem fins lucrativos e nem sabem do que se
trata. Outro dia, vi uma dona falando: "Meu sonho é fazer uma
ONG". Nada contra, mas acontece que fica beija-flor apagando fogo. Beija-flor não foi feito
para apagar fogo.
FOLHA - Como assim?
RESENDE - Como ninguém sabe
como e quantas são essas organizações, falta eficácia. Aqui em
Belo Horizonte uma senhora
tinha mais de 70 cestas básicas
na casa dela, porque tinha recebido em pouco tempo de diversas instituições. Além disso, você tem as campanhas episódicas, amadoras ou comerciais.
Há lugares vivendo um drama por causa da "ongnização".
São pessoas que vivem da desgraça. No Vale do Jequitinhonha [MG], há organizações trabalhando no combate à pobreza há 30 anos e a pobreza aumentou. Não se pode criar uma
"indústria" das ONGs.
Agora, propor "caça às bruxas" soa mais ou menos como
"tirar o sofá da sala" para evitar
a traição pelo cônjuge, pois há
organizações importantes e
acabar não é a solução. Quase
80% das internações hospitalares feitas pelos SUS em 2005
em Minas foram por organizações sem fins lucrativos: 1 milhão de internações.
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