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Sugestões à Constituição se mantêm atuais após 20 anos
Em 1988, foram 72 mil cartas com pedidos desde combate à corrupção a saúde de qualidade
Deputado que mais recebeu correspondência foi Ulysses, com 13.274 cartas; Lula foi
o destino de 133, sendo
33 sobre a reforma agrária
FERNANDA ODILLA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Uma análise dos formulários
preenchidos por cidadãos com
sugestões à Constituição de
1988 mostra que muitos anseios não se alteraram em 20
anos: há pedidos por reforma
agrária, combate à corrupção,
saúde e educação de qualidade,
redução do recesso e dos salários de políticos.
Entre os 71,7 mil formulários
que chegaram ao Congresso,
133 tinham como destinatário
o então deputado federal Luiz
Inácio Lula da Silva (PT-SP).
Lula não foi o campeão de correspondência. Ulysses Guimarães (PMDB-SP) foi o constituinte que mais recebeu sugestões: 13.274. Todas as cartas foram digitalizadas pelo Senado e
estão disponíveis na internet
(www.senado.gov.br/sf/publicacoes/anais/asp/CT-Abertura.asp). Os originais
estão no arquivo da Câmara.
As cartas encaminhadas a
Lula revelam o que a população
esperava no final dos anos 80
do sindicalista hoje presidente
do Brasil. Em 33 delas, pedia-se
reforma agrária. Foi uma das
questões em que a Constituição menos avançou, nas palavras do próprio Lula, em discurso no plenário da Câmara
em 1988. Atualmente, o governo federal não tem atualizado
os índices de produtividade, o
que dificulta o processo de desapropriação de terras.
A população também pediu
ao petista campanha para doação de órgãos, controle das remessas de lucros ao exterior e
diploma para políticos exercerem cargos públicos. Ele foi
acionado ainda para resolver
questões relacionadas à segurança e à corrupção. "Eu tenho
várias sugestões, e uma das
principais é a educação e a segurança nas escolas e em todos
os lugares. (...) E também queria que o Brasil fosse como a
Rússia, que se tornou uma das
maiores potências do mundo
depois que decapitou todos os
políticos corruptos", escreveu a
então estudante de 12 anos
Adriana Bassanin.
Duas décadas depois, a hoje
dona-de-casa Adriana diz não
ser tão radical. Apesar de acreditar que o Brasil está melhorando "a passos muito lentos",
afirma que as necessidades das
pessoas são as mesmas de 1988
e lamenta pelo fato de a corrupção não parar de crescer.
Questões ambientais
Se tivessem sido incluídas no
texto da Constituição, o professor aposentado Jorge Vancho
Panovich acredita que suas sugestões seriam capazes de dificultar a destruição ambiental.
Em abril de 1986, Panovich escreveu a Lula pedindo que o
Pantanal fosse transformado
em patrimônio nacional. Sugeriu que se estabelecesse percentual para desmatamento.
Panovich não foi o único a
defender o ambiente. O líder
seringueiro Chico Mendes, assassinado em dezembro de
1988 por lutar pela preservação
da Amazônia, enviou propostas
defendendo a criação de reservas extrativistas e indígenas.
"Os índios deverão ter a garantia da demarcação e respeito a suas terras, com autodeterminação e preservação da cultura. Ficam proibidas lavras de
garimpos em terras indígenas."
Não há um balanço de quantas sugestões foram aceitas,
mas de forma geral os ex-constituintes dizem que não foram
muitas. Algumas idéias acabaram vingando de forma indireta. A corretora de imóveis Iara
Wilkens, 66, por exemplo, sugeriu uma Copa no Brasil para
atrair divisas. Em 2014, o país
será sede do mundial de futebol, mas hoje ela se preocupa
com o gasto da organização.
Para ver suas sugestões
transformadas em lei, Roberto
Rodrigues, ex-ministro da
Agricultura do governo Lula,
não se contentou em preencher
o formulário. Presidente de entidade que reunia cooperativas,
contratou especialistas, fez assembléias e acompanhou o trabalho dos constituintes para
conseguir incluir na Carta quatro dos cinco artigos que defendia. "A sociedade nem sempre
está pronta para determinados
temas. Como são muitas as demandas, prioridades surgem de
embates do dia-a-dia", disse.
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