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CELSO PINTO
O perigo de se levar o IGP a sério
A inflação medida pelo
IGP-M chegou a 3,9% em
outubro, acumulando 14,8% no
ano e 16,3% em 12 meses. A média
do IGP-M dos últimos três meses,
anualizada, chegou a 40,3%. O
Índice de Preços por Atacado
(IPA), um dos componentes do
IGP, teve comportamento ainda
mais assustador. O IPA-M de outubro foi de 5,6%, acumulou
19,9% no ano, 21,3% em 12 meses
e o último trimestre, anualizado,
bateu em incríveis 61,5%.
Não é por acaso que está havendo uma corrida aos papéis indexados ao IGP, a começar dos federais. Não é por acaso, também,
que começam a reavivar velhas
discussões sobre o potencial explosivo da inflação do IGP. A
exemplo do que ocorreu depois da
máxi de 99, há quem veja na disparada dos preços por atacado o
prenúncio da disparada dos preços no varejo. A velha teoria de
que o IPCA estaria "grávido" do
IPA.
Faz sentido? Ricardo Braule
Pinto, economista especialista em
índices de preços, brigou muito,
em 99, contra o destaque dado ao
IGP e a exdrúxula teoria da gravidez, e volta à carga agora. Seus
argumentos são que o IGP e, em
especial, o IPA, são índices tecnicamente ruins, que misturam bananas com laranjas. As mesmas
razões que fizeram a teoria da
gravidez do IPCA virar pó em 99
continuam de pé hoje. Quem quiser falar de inflação é melhor
olhar o que está acontecendo com
o IPCA: é preocupante, mas não
fora de controle (7,9% em doze
meses até setembro).
O IGP é a média ponderada de
três índices: o IPA, com peso 6, o
custo de vida, com peso 3 e a construção civil, com peso 1. Isso não o
torna melhor, por ser mais abrangente, argumenta Braule. A inflação atinge agentes de forma diferente e o que faz sentido é olhar o
que ocorre com um conjunto de
agentes com características comuns, não misturar tudo.
Um índice deve escolher entre
medir os preços do lado dos que
vendem ou dos que compram, ou
seja, dos que causam ou sofrem a
inflação. Faz sentido um índice
ao consumidor que mede a inflação sofrida pelas famílias, ou um
índice de venda que mede, por
exemplo, a inflação dos preços
dos automóveis.
O IPA, lembra, mistura preços
de quem ao mesmo tempo sofre e
gera inflação (exemplo: montadoras e autopeças), tornando impossível saber de quem é a inflação, ou o que é "atacado". Além
disso, o IPA se baseia em listas de
preços. É óbvio que o preço final
resulta de negociações. Em momentos de incertezas, como o
atual, as listas tendem a ser infladas e o preço final efetivo a ser
muito menor.
Os produtos no IPA sofrem múltiplas contagens: um aumento no
aço aparece em toda a cadeia: autopeças, veículos, etc. De outro lado, aumentos da matéria-prima
continuarão a aparecer no IGP,
mesmo que ele não tenha sido repassado na cadeia produtiva. Outro argumento: o IPA capta o preço "cheio" e não ponderado pelos
dias em que ele incidiu no mês,
como outros índices inflacionários, ampliando a volatilidade.
No caso dos preços agrícolas,
quando há forte alta ou queda no
atacado, o comércio tende a suavizar no varejo, atenuando a alta
e compensando ao não repassar
inteiramente a baixa. O IPA agrícola, portanto, tende a elevar a
volatilidade.
Por tudo isso, argumenta, aumentos no atacado não se transferem com o mesmo peso para o
varejo. Nos Estados Unidos, existem três índices de inflação apurados conforme o estágio de processamento: bens finais, insumos
intermediários e insumos básicos.
Eles são mantidos independentes,
para evitar contagens múltiplas, e
não são agregados, como no IGP.
O índice de preços ao produtor, o
IPP, é o que mede os preços de
bens finais, sazonalmente ajustados.
Apesar de tanta fragilidade, o
IGP-M é patrocinado pelo mercado financeiro e ganha manchetes
quando dispara na frente do IPCA, puxado pelo câmbio. Mesmo
que a experiência, desde 99, mostre que só de 14% a 16% da alta
do câmbio tenda a se refletir no
IPCA, em 12 meses, muito longe
do que ocorre com o IGP.
O remédio é crescer
O tão discutido superávit primário é a diferença entre receitas
e despesas do setor público, excluídos os gastos com juros. No
ano passado, o superávit foi de
3,8% do PIB e, neste ano, deve ir a
3,9%. O diretor da Goldman
Sachs, Paulo Leme, lembrou, num
seminário na FGV, segunda-feira, que o esforço foi muito maior,
descontadas duas despesas rígidas. Sem gastos com previdência
(déficit de 3,7% do PIB em 2001 e
3,8% este ano) e funcionalismo
(2,9% e 2,5%), o esforço fiscal primário sobe a 10,4% do PIB em
2001 e 10,7% este ano.
Isso ilustra porque reduzir gastos com previdência e controlar
gastos com funcionalismo são importantes para abrir espaço fiscal,
principalmente se for preciso elevar o superávit primário. A melhor forma de atenuar o problema seria acelerar o crescimento,
argumentou o economista José
Alexandre Scheinkman, no mesmo seminário.
Para isso, seria preciso elevar de
18% para 25% do PIB a taxa de
investimento. Com um complicador: pesquisas mostram que o
custo do investimento no Brasil
cresceu 35% na última década em
relação à anterior, ou seja, é preciso investir mais para obter o
mesmo resultado.
Outro dado preocupante: a pesquisa mais otimista sobre produtividade da indústria brasileira
mostra que ela chega, em média,
a apenas 75% da americana,
mesmo depois de descontar as diferenças de custo de capital e de
formação de capital humano. O
que é um sinal amarelo em relação ao impacto que a Alca poderia ter sobre alguns setores, embora ele ache que o efeito líquido da
abertura comercial acabará sendo positivo para a produtividade
em geral.
Ele acha que o salto só se dará
depois de várias reformas microeconômicas. A do Estado, para elevar a poupança. Reduzir a informalidade, via corte no custo de
contratação de baixos salários,
pois as empresas informais são
muito menos produtivas. Melhorar a qualidade do ensino. Reduzir as incertezas do sistema legal.
Ampliar a inserção externa.
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