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Bilhetes inéditos de Getulio revelam nepotismo, solidão e controle do "Última Hora"
CAIO BARRETTO BRISO
DA SUCURSAL DO RIO
Bilhetes recém-descobertos da última fase no poder de
Getulio Vargas (1883-1954)
revelam um presidente sufocado, atento a miudezas da
administração e ao comportamento da imprensa, em especial do jornal criado por Samuel Wainer para apoiá-lo
("Última Hora").
A primeira parte dos bilhetes, de 1951, foi divulgada pela
Folha em 24 de agosto deste
ano. Já os bilhetes de 1954,
aproximadamente 200, foram encontrados em setembro, sendo de teor inédito.
De compreensão razoável,
a letra de Getulio está em cada um dos quase 700 bilhetes
que o presidente escreveu para seu Chefe da Casa Civil,
Lourival Fontes, em 51 e 54.
Cada bilhete, em papel já
amarelado pelo tempo, traz a
marca do período turbulento
que Getulio viveu na sua volta
ao Palácio do Catete, sede do
governo federal quando o Rio
era a capital do país, culminando com seu suicídio.
Neles, Getulio demonstra
sua insatisfação com a imprensa ("Noto que os jornais
(...) não publicam os numerosos atos (...) diariamente praticados pelo Poder Executivo"), preocupação com seus
discursos ("Na fala de São
Paulo, é preciso cortar esse
trecho onde diz que o Brasil é
um país pobre"), atos de nepotismo ("A viúva do senador
Salgado Filho pede interferência (...) afim de que seu sobrinho (...) não seja exonerado") e sua influência no jornal
"Última Hora", de Samuel
Wainer, que apoiava seu governo ("Diga ao Wainer que a
edição de hoje tem muito esporte"; "Pergunte ao Wainer
se os temas do Mercado Municipal e do Tribunal de Contas já estão esgotados").
Ontem de manhã, Celina
Vargas -neta de Getulio- e
Francisco Baptista Neto doaram os documentos ao Arquivo Nacional, no Rio. Os bilhetes foram guardados e mantidos sob sigilo desde 1967 pelo
pai de Baptista Neto, o ex-governador sergipano Lourival
Baptista, amigo de Fontes,
que recebeu deste os documentos oficiais.
"Eles mostram um presidente atuante e atento a todos os assuntos do governo",
diz Baptista Neto. "E mostram também que a ideia de
que ele era um velho despreparado para governar, que a
oposição tentou vender, é absurda", acrescenta Celina.
Em um dos últimos bilhetes, provavelmente um mês
antes de seu suicídio, sob intensa pressão, ele desabafa:
"Querem me aprisionar. Não
sou prisioneiro de ninguém".
Exposição e livro
Baptista Neto, Celina Vargas e o Arquivo Nacional têm
o projeto de, em um ano,
montar uma exposição itinerante com todos os bilhetes e
também com fotos de Getulio
que integram o acervo iconográfico do Arquivo Nacional,
além de editar um livro que
contextualize os quase 700
bilhetes encontrados.
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