São Paulo, segunda-feira, 08 de janeiro de 2001

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QUESTÃO INDÍGENA
Denúncias de abusos sexuais de índias e de alcoolismo após contato com militares motivam decisão
Juiz proíbe posto militar perto de reserva

ANDRÉA DE LIMA
DA AGÊNCIA FOLHA

KÁTIA BRASIL
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MANAUS

A Justiça Federal de Roraima proibiu, em decisão provisória, a construção de um pelotão do Exército em regiões de fronteira nas imediações de reservas indígenas. O motivo são as constantes denúncias de abuso sexual de índias e alcoolismo provocado pelo contato com os militares.
A liminar foi concedida a pedido das comunidades indígenas do Uiramutã, localizada na reserva Raposa Serra do Sol. Nas proximidades, os militares estão construindo bases do 6º PEF (Pelotão Especial de Fronteira).
Na reserva, de 1,6 milhão de hectares, vivem 12.600 índios das etnias macuxi, wapixana, taurepang, ingaricó e patamona, em 86 comunidades.
A área já foi demarcada, mas não ainda não foi homologada pelo governo federal.

Prostituição e alcoolismo
O juiz substituto da 2ª Vara Federal, Helder Girão Barreto, alegou ter tomado a decisão a partir de depoimentos dos índios, que relataram casos de prostituição e alcoolismo no contato com os militares, e da publicação, a partir de outubro passado, de reportagens sobre o tema na Folha.
A decisão afeta uma das áreas de fronteira ocupadas dentro dos planos do Projeto Calha Norte, de defesa da região amazônica brasileira.
O projeto recebeu um reforço no ano passado para fazer frente à ameaça de invasão do território do país por narcotraficantes e guerrilheiros devido à ação do Plano Colômbia, esforço antidrogas do governo colombiano que tem apoio dos Estados Unidos.
O juiz contesta a argumentação dos militares sobre a necessidade de pelotões na região por questões de segurança nacional.
"Achei melhor, por cautela, impedir a construção desse pelotão próximo à reserva. Os índios reclamam da proximidade das instalações militares de suas aldeias, mas não são contrários a elas nas zonas de fronteiras", declarou Barreto.
O Ministério da Defesa afirma não ter sido notificado sobre a decisão (leia texto nesta página).
De acordo com a Justiça Federal, o processo ainda vai ser instruído.
"A Advocacia Geral da União já foi notificada e deve contestar essa minha decisão. Devo requisitar uma perícia na área. Esse processo deve tramitar durante um ano. De imediato, esse despacho impede a continuidade das obras", disse o juiz.

"Luta árdua"
Para o coordenador do CIR (Conselho Indígena de Roraima), o índio macuxi Jerônimo Pereira, a decisão judicial é um exemplo de uma "luta árdua" contra o envolvimento de índias com os militares.
"Eles se engraçam pelas índias e depois vão embora, deixando elas sozinhas com os filhos."


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