São Paulo, quinta-feira, 08 de fevereiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Itamaraty eliminará leitura obrigatória

Decisão de acabar com livros recomendados a diplomatas se deve, diz Amorim, a "mal entendidos" explicitados por ex-embaixador

Em entrevista a revista, Roberto Abdenur classificou leituras forçadas fora da estrutura dos cursos do Itamaraty como vexatórias


CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O ministro Celso Amorim (Relações Exteriores) disse ontem à Folha que vai modificar o sistema de leitura obrigatória de livros, imposto pelo vice-chanceler Samuel Pinheiro Guimarães e que foi duramente atacado pelo ex-embaixador do Brasil em Washington Roberto Abdenur, em entrevista publicada no fim de semana na revista "Veja".
Abdenur acha "uma coisa vexatória" o fato de que "diplomatas de categoria" sejam "forçados a certas leituras quando entram ou saem de Brasília".
A entrevista de Abdenur foi avalizada pelo antecessor de Amorim, Celso Lafer, que considerou as leituras uma "lavagem cerebral", em declarações ao "Estado de S. Paulo".
Amorim cita alguns dos livros recomendados por seu secretário-geral como prova de que não há um viés ideológico no método.
Um dos livros é do embaixador Álvaro Lins e trata do Barão do Rio Branco, o patrono da diplomacia brasileira. Nada tem, portanto, de esquerdista ou de texto de um simpatizante do atual governo (Álvaro Lins morreu em 1975).
Outro dos livros recomendados é "Chutando a Escada", do acadêmico chinês Ha-Joon Chang, hoje na Cambridge University, do Reino Unido, que não é exatamente um templo esquerdista. A "escada" do título são ações protecionistas adotadas pelos países hoje ricos, na escalada para a riqueza, mas que, agora, "chutam" para impedir que os países em desenvolvimento as utilizem.
Amorim acha que o ruído despertado pelas recomendações de Guimarães se deve a um livro de Luiz Alberto Moniz Bandeira, professor emérito da Universidade de Brasília, o único dos recomendados que teria um viés esquerdista.
O motivo pelo qual o chanceler quer acabar com o sistema de livros recomendados pelo secretário-geral é o de que se presta ao que ele considera "mal entendidos" explicitados na entrevista de Abdenur.
O Itamaraty adota indicações de leitura em todas as etapas do curso de preparação para a carreira diplomática, desde o Instituto Rio Branco até o curso de Altos Estudos, uma espécie de segundo vestibular, indispensável para ascender na hierarquia. Por isso, recomendações fora da estrutura dos cursos são contraproducentes.

Alinhamento ideológico
O chanceler comentou também outro ponto polêmico da entrevista de Abdenur, segundo quem as promoções no Itamaraty passaram a ser feitas por alinhamento ideológico.
"Eu vi funcionários de competência indiscutível ser passados para trás porque não são alinhados", declarou Abdenur.
Nesse ponto, Amorim reage com fúria: "É um absurdo e é até difamatório". Cita, em seguida, uma lista grande de diplomatas que haviam ocupado funções no governo Fernando Henrique Cardoso e que foram promovidos em sua gestão ou ganharam postos relevantes.
Chefe-de-gabinete de Lafer, Fernando de Mello Barreto, acaba de ser indicado para embaixador na Austrália.
O embaixador Otto Agripino Maia, irmão do líder do PFL no Senado, José Agripino Maia, acaba de ser chamado para o gabinete de Amorim.
Dois embaixadores que apareciam em 90% das imagens durante visitas de FHC ao exterior, por serem chefes do cerimonial -Walter Pecly e Frederico Cezar de Araujo- estão respectivamente em Assunção e La Paz, postos que a ênfase nas relações com a América Latina torna relevantes.


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Brasil se recusa a ajudar EUA a conter Chávez
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.