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Elio Gaspari
Lula já lidou com tratantes, mas prevaleceu
"Os sacanas dos diretores da Scania tomaram uma prensa do Sindicato da Indústria Automobilística"
POR DIVERSOS motivos e até por razões de Estado, Nosso Guia aplicou nos sargentos amotinados da
FAB o mesmo golpe que tomou do patronato paulista há 29 anos. A recordação pode não servir para nada, mas permite que ele reencontre os adjetivos
que carimbou nos outros.
Na manhã de 12 de maio de 1978, o
Brasil se deu conta de que havia um novo sindicalismo no ABC paulista. Num
lance inesperado, os metalúrgicos da
Scania haviam parado a fábrica. Lula
presidia o sindicato de São Bernardo,
mas não participou da organização do
movimento.
Ninguém sabia de nada. Na noite anterior, falando num telefone grampeado, o professor Fernando Henrique
Cardoso, tramava o lançamento, pela
oposição, de uma candidatura presidencial. O indicado era o "sujeito" (general Euler Bentes Monteiro), apoiado
pelo "tribuno" (senador Paulo Brossard), precisando de uma conversa
com "nosso amigo" (Ulysses Guimarães).
Às sete da manhã, o operário Gilson
Meneses parou 3.200 trabalhadores da
Scania. Lula foi chamado para negociar. Três dias depois, a Scania ofereceu, por escrito, um aumento de 20%
acima do índice de reajuste imposto
pelo governo. A proposta foi aplaudida
pelos trabalhadores ,e a greve, encerrada.
O resto da história, nas palavras de
Lula:
"Nós fomos enganados porque fizemos um acordo com a Scania. Nós fomos para uma assembléia dentro da
Scania. Colocamos o acordo em votação, todos os trabalhadores aceitaram a
proposta e nós fomos homologar na
Delegacia Regional do Trabalho em
São Paulo. Quando nós chegamos na
delegacia, estavam a Ford, a Mercedes
e a Volkswagen mais o Mario Garnero,
que era o presidente do Sindicato da
Indústria Automobilística, mais o cara
da Fiesp, que disseram para o tal Lunerdal da Scania: "Não tem acordo. Você não pode manter esse acordo porque
nossas empresas não querem". Aí, o
desgraçado pegou e voltou atrás.
(...) Quando o pessoal da Scania ficou
sabendo que eles voltaram atrás, o pessoal achou que nós tínhamos traído
eles. (...) E aí, ficou o sindicato como
traidor."
Noutra versão: "Os sacanas dos diretores da Scania tomaram uma prensa
do Sindicato da Indústria Automobilística". A greve alastrou-se. Cerca de 150
mil trabalhadores pararam 50 fábricas,
os empresários cederam, e surgiu um
novo bissílabo na política brasileira.
O PARÁ DÁ UMA LIÇÃO AO RIO E A MINAS
Os governadores gostam de
acusar a União pela bagunça
tributária nacional. Tudo
bem, mas, na cobrança do
ICMS sobre a energia elétrica
dos consumidores de baixa
renda, são eles quem anarquizam a vida do andar de baixo.
Minas Gerais e Rio de Janeiro são Estados poderosos,
mas não há nexo na maneira
como aliviam as contas de luz
da população mais pobre.
Aécio Neves zera o ICMS
para quem consome até cem
quilowatts-hora por mês. Esse
é o consumo de uma casa com
quatro lâmpadas, uma geladeira e uma hora mensal de
ferro elétrico e/ou chuveiro.
Acima daí, a alíquota mineira
é de 30%.
Sérgio Cabral não cobra de
quem consome menos de 50
quilowatts. (Esse nível de consumo não existe.) Até 300 quilowatts, sua alíquota de ICMS
é de 19%.
Os dois poderiam fazer a lição de casa com a governadora
paraense Ana Julia Carepa.
Ela zerou o ICMS para quem
gasta menos de cem quilowatts e reduziu de 25% para
15% a alíquota do consumo de
até 150 quilowatts.
Carepa estima que com isso
deixa de arrecadar R$ 28 milhões por ano, mas beneficia 3
milhões de pessoas.
Olhando o número de outro
jeito, libera R$ 28 milhões para os orçamentos do andar de
baixo.
MAÇÃ AZUL
Lula mandou discretos
emissários à caciquia tucana,
sugerindo conversas reservadas para tratar da sucessão
presidencial de 2010. Nesses
acenos fica sugerida a hipótese
de que venha a ter dois candidatos. Um do PT, outro de fora.
Acompanhando a temporada das marchinhas, esses encontros podiam ter fundo musical:
A história da maçã
É pura fantasia
Maçã igual àquela
O papai também comia
LUPI 1º E ÚNICO
Com sua capacidade de discursar em sala cheia como se
estivesse em um comício em
Bangu, o novo ministro do
Trabalho, Carlos Lupi, é o toque pitoresco da equipe de Lula.
TEM MAIS
Na noite do dia 31, ao saber
da extensão do estrago provocado pelo motim dos sargentos, o ministro Waldir Pires
tentou regressar do Rio para
Brasília. Pediu um avião à FAB
e foi informado de que não havia como transportá-lo.
Não se pode atribuir esse
episódio do apagão hierárquico a sargentos amotinados.
VIVANDEIRAS
Os Estados Unidos vivem o
maior dos problemas militares, a guerra. Não passa pela
cabeça de ninguém que a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, vá ao escritório do Secretário da Força Aérea, Michael
Wayne, para discutir problemas políticos ou administrativos.
Na segunda-feira, o deputado federal Arlindo Chinaglia
foi ao gabinete do comandante
da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito. Lá encontrou o tucano Júlio Redecker, líder da minoria no Congresso. Vivandaram bonito.
RECONHECIMENTO
De um crítico impiedoso da
diretoria do Banco Central, momentaneamente arrependido:
"Depois do que os sargentos do
Planalto fizeram, junto com os
sargentos da FAB, eu durmo
melhor quando lembro que o
Henrique Meirelles está no
Banco Central".
CONTA VELHA
Discretamente, o tucanato
tenta descobrir uma maneira de
usufruir o espetáculo da CPI do
Apagão, sem molhar os pés na
lama da Infraero. O dispositivo
incestuoso da estatal com as
empreiteiras foi montado antes
que Nosso Guia chegasse ao
Planalto. Sua base política fica
em São Paulo.
Com a chegada dos companheiros, piorou. No ano passado, quando o deputado Carlos
Wilson deixou a presidência da
empresa, um cidadão foi sondado para substituí-lo, desde que
se comprometesse a não mexer
na área de engenharia. Não topou, não foi convidado.
CANA E ETANOL
A discussão sobre o uso da cana e do milho para produzir
combustível veio para ficar. O
Apocalipse prometido por Fidel
Castro pode ser apenas uma
confusão entre a proximidade
do fim de seus dias e a iminência
do fim do mundo. Apesar disso,
uma informação dada pelos
professores C. Ford Runge e
Benjamin Senauer num artigo
para a revista "Foreign Affairs"
dá o que pensar: Quando um
SUV abastecido com etanol de
milho esvazia seu tanque de
combustível, queimou a mesma
quantidade de calorias que um
bípede ao longo de um ano.
No século 19, os havaianos pararam de plantar comida, pois
ganhavam muito dinheiro exportando sândalo. Bateu a fome, e uma das ilhas do arquipélago perdeu 30% da população.
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