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São Paulo, quinta-feira, 08 de maio de 2003

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CELSO PINTO

O que preocupa é o crescimento

Uma preocupação central do secretário do Tesouro americano, John Snow, e de seus principais assessores, na sua recente visita ao Brasil, foi discutir que condições concretas existem para o Brasil voltar a crescer de forma razoável. Por uma razão política. Se mesmo com uma política macroeconômica sensata o crescimento não vier, a insatisfação política e social vai aumentar, e, pressionado, o governo Lula pode voltar a buscar alianças à esquerda.
Esse tipo de preocupação tem sido frequente entre investidores e banqueiros americanos e também é algo que preocupa o mercado financeiro brasileiro. Está tudo indo muito bem, mas e o crescimento?
O presidente de um banco americano no Brasil, por exemplo, teme que o governo esteja preso numa armadilha de baixo crescimento. A meta inflacionária exige juro alto, o que eleva o déficit público, reduz a poupança interna (a externa já caiu muito, pelo ajuste no déficit em conta corrente) e, portanto, a capacidade de crescer. Contar com a apreciação do real frente ao dólar para ajudar a conter a inflação não é uma solução, e sim um enorme risco.
Osvaldo de Assis, do Pactual, entende que o medo da inflação leve ao juro alto, mas acha que "o Brasil não está em condições de ter um medo só". O segundo medo é o de inviabilizar um crescimento decente para 2004 e piorar o cenário político. Ele acha que a inflação mais baixa esperada para maio (o mercado prevê 0,5%) abre uma janela para o Banco Central começar a reduzir os juros. Se não usar essa janela, fatores sazonais vão elevar a inflação em junho e julho tornando mais difícil começar um ciclo de baixa nos juros.
Não há, obviamente, consenso. O ex-presidente do BC, Affonso Celso Pastore, vê razões para o BC subir mais os juros para não perder credibilidade. Bancos influentes, como o CSFB-Garantia, sugerem cautela: a melhora na inflação tem sido lenta e a ajuda do câmbio pode ser revertida, porque o fluxo de capitais melhorou, mas ainda não é bom.
De fato, no primeiro quadrimestre o país captou US$ 4,6 bilhões, nas contas do banco, 82% a curto prazo (até um ano), e 81% por bancos (aproveitando oportunidades de arbitragem pelos juros altos internos). Em abril, apesar da melhora no câmbio, o prazo médio das emissões continuou sendo de apenas 1,2 ano (comparado a 2,2 anos em março).
Há defensores de juros menores, contudo, em todos os campos. Aloísio Araújo, da Fundação Getúlio Vargas, tão ortodoxo quanto Pastore, é um dos economistas brasileiros mais respeitados no exterior e tem assessorado o BC, nos últimos anos, em questões como a Lei de Falências. Ele argumenta que o BC, na verdade, permitiu que houvesse uma elevação nos juros reais nos últimos meses e que está na hora de começar a revertê-la.
Ele lembra que a taxa de juros interna deve guardar uma relação de paridade com o juro externo básico (a taxa americana), mais um prêmio de risco-país. Como o risco Brasil caiu muito nos últimos meses (quase 70%) e os juros internos não caíram, o juro real subiu. É verdade que, quando o risco-Brasil disparou, no ano passado, o BC não elevou o juro na mesma velocidade. A seu ver, fez bem em não fazê-lo, porque numa situação de nervosismo extremo, é melhor aceitar algo mais de inflação do que elevar demais o risco de quebra. Mas a queda do risco-Brasil já foi tão grande, que justificaria um corte no juro interno para manter a arbitragem externa.
Olhando a previsão de inflação do mercado para 12 meses, hoje em 8,87%, ela indica um juro real de 16,2%, também muito acima da média desde 1999 (de 12%). Se o BC eleva demais o juro real, como fez, permitindo grandes ganhos financeiros com a entrada de dólares, provoca uma valorização do câmbio, distorcendo o câmbio flutuante. A flutuação é ótima, mas deve respeitar a paridade dos juros internos e externos, senão vira um falso câmbio flutuante.
Além disso, ele não acredita que a ameaça inflacionária seja tão grande. O importante, diz, é ter a política fiscal sob controle, e ela está. Ele não acha que a inércia inflacionária seja tão grande e vê os preços em tendência de queda. "É preciso ter paciência", recomenda. "Eu não acho que o governo tem capacidade de controlar a inflação com tanta precisão". Mirar na inflação de curto prazo pode causar distorções e custos muito altos. Ele sempre foi favorável a se ter como meta uma banda mais ampla. Nas circunstâncias atuais, defende que o BC mire 2004 e exerça sua política num horizonte de tempo maior.
Por todas estas razões, ele acha que o Copom, neste mês, deveria, no mínimo, introduzir um viés de baixa nos juros. Boa parte do mercado aposta na mesma direção.

E-mail: CelPinto@uol.com.br


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