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ENTREVISTA DA 2ª/BROOKE SHIELDS
Atriz, que demorou para diagnosticar a doença, diz que se sentia envergonhada por não conseguir dar afeto à filha
"Achava que depressão pós-parto não afetava pessoas como eu"
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Mãe pela segunda vez há 18 dias,
a atriz Brooke Shields, 40, autora
de "Depois do Parto, a Dor" (editora Prestígio), livro em que relata
a depressão pós-parto sofrida há
três anos, afirma que foi reprovada e chegou a ser tratada com desdém por mulheres conhecidas
que não acreditavam como ela,
bonita, rica e famosa, pudesse ter
sentimentos tão negativos em relação à maternidade.
Estrela de "A Lagoa Azul"
(1980), Brooke conta que, no início, não aceitou o diagnóstico de
depressão pós-parto, embora tivesse consciência de que não estava no seu estado normal. Ela não
se sentia vinculada afetivamente à
filha e teve idéias suicidas.
A atriz iniciou o tratamento com
antidepressivos três semanas após
o parto, mas, logo depois, interrompeu a terapia sem avisar o médico. Depois de uma recaída, retomou o uso dos antidepressivos associado à terapia.
"Eu associava a depressão somente àquelas pessoas que machucavam os filhos. Não tinha a
mínima intenção de jamais machucar minha filha, apesar de
também não ter nenhuma intenção de me afeiçoar a ela."
Casada com o roteirista e produtor Christopher Henchy, 42,
Brooke lutou durante dois anos
contra a infertilidade e só engravidou de Rowan após várias inseminações e duas fertilizações in vitro. Em 2005, ela engravidou naturalmente de Grier, nascida no último dia 19. A seguir trechos da
entrevista concedida por e-mail à
Folha.
Folha - Por que você resolveu contar ao mundo sua depressão?
Brooke Shields - Há um verdadeiro estigma cercando a depressão pós-parto e, deixada sem diagnóstico, ela pode ser crônica e devastadora. A mãe pode ficar atormentada pela culpa e devastada
pela desesperança, e o resto da família também é afetado.
Quando percebi que tudo o que
sentia era real e quanto eu mesma
desconhecia sobre o assunto, pensei em escrever. Mesmo em meus
sonhos mais loucos, nunca achei
que poderia cair tanto. Cheguei a
conversar [sobre a depressão]
com pessoas que eu conhecia melhor. Algumas mulheres me olharam com uma expressão de desdém; outras tentaram não levar a
sério ou mudaram de assunto.
Muitas disseram: "Ah, é só uma
fase pela qual você passa. É apenas
a tristeza materna!".
Eu ficava envergonhada
por não sentir
uma ligação
com minha filha, mas achei
que, se pudesse ir além da
vergonha e ser
franca quanto
a isso, poderia
encontrar
consolo.
Folha - Não
teve receio de
ser julgada,
considerando
que, em geral,
as pessoas esperam da mãe
uma felicidade
plena?
Brooke - Não
percebi que
seria julgada tão abertamente.
Pensei que, se conversasse a respeito, não me sentiria tão sozinha.
Eu queria encontrar uma comunidade de pessoas que também tivessem passado por isso. Na verdade, o contrário ocorria. As pessoas, acostumadas com minha
fortaleza, mas sabendo da luta que
foi para engravidar, minimizavam
meus sentimentos. Isso era uma
forma de desaprovação e me fazia
sentir ainda pior e sem saída.
Folha - Antes da sua experiência,
você sabia o que era depressão pós-parto?
Brooke - Eu nunca soube o que
era depressão. E levei muito tempo para entender que minha tristeza, minha falta de vontade era
depressão. Sou uma pessoa forte,
que sempre teve de ter o controle
das coisas. Estou acostumada com
isso e as pessoas em minha volta
até esperam por isso, então fui pega de surpresa.
Não imaginava que o ajuste à
maternidade pudesse ser tão complicado. Tanto que nem contratei
uma babá. Não queria alguém estranho em minha casa. Nossa luta
por um filho fora tão longa que
queríamos curtir isso sozinhos.
Eu e meu marido pensamos em cuidar de tudo,
mesmo com o trabalho
dele, mas ambos ficamos
realmente surpresos com
os rumos que as coisas tomaram.
Folha - Quando foi que
percebeu que havia um
sentimento diferente entre você e sua filha?
Brooke - No primeiro
dia em nosso apartamento, ao voltar para casa depois de cinco dias no hospital, deixei Rowan no
moisés e tanto eu quanto
Chris acreditávamos que
ela iria dormir por um
tempo. Rowan começou
a chorar. A fralda dela
precisava ser trocada. Eu
ainda tinha uma grave
síndrome de túnel do carpo, e minhas mãos estavam entorpecidas. Chris teve que me socorrer, e me arrastei de volta para a
cama, frustrada e com dor. Enquanto Chris lutava contra a fralda, ela berrava. Fiquei na cama,
olhando a parede vazia à minha
frente. No começo, achei que o
que sentia era apenas exaustão,
mas, com ela, veio um sentimento
de pânico esmagador que eu jamais sentira. Comecei a me sentir
enjoada. Fui tomada por um sentimento de desolação. Mal conseguia me mexer. Não me sentia só
emotiva ou chorosa, como disseram que talvez me sentisse. Era algo bastante diferente.
Folha - Como foi o sentimento de
amamentar ao mesmo tempo em
que estava deprimida?
Brooke - A rotina de amamentar
e chorar era interminável, e parecia não haver alívio à vista. Cinco
dias após o nascimento, nós levamos Rowan ao médico e fui eu
quem ocupou mais tempo da consulta. Ele percebeu que eu poderia
estar num quadro de depressão
pós-parto.
Folha - Como você reagiu ao diagnóstico de depressão?
Brooke - Eu fiquei confusa. Pensava só que poderia não estar sendo uma boa mãe, e isso me trazia
uma dor muito maior. E não conseguia enxergar que uma doença
poderia estar provocando tudo
aquilo. E eu fiquei confusa. Para
mim, depressão pós-parto era
aflição de gente louca. Eu a associava somente àquelas pessoas
que machucavam os filhos. Eu,
com certeza, não fazia parte dessa
categoria. Não tinha a mínima intenção de jamais machucar minha
filha, apesar de também não ter
nenhuma intenção de me afeiçoar
a ela. Depressão pós-parto era claramente uma coisa que não afetava pessoas como eu. Atacava apenas aquelas pessoas sobre as quais
líamos nos jornais.
Folha - Por que você acha que foi
tão difícil admitir a depressão?
Brooke - A alta expectativa que
eu tenho sobre mim mesma me
impediu de enxergar a doença. Eu
trabalho com auto-estima o tempo inteiro. Tenho muitas facilidades em muitos campos pela profissão e carreira que construí, e
não achava que poderia ser frágil
para enfrentar uma maternidade.
Eu não conseguia pensar que poderia ser tão frágil.
Folha - Você acha que a depressão
perturbou seu relacionamento com
sua filha?
Brooke - Não. É reconfortante
saber que as pessoas que vivenciaram a depressão pós-parto, e tinham buscado ajuda, não apenas
superaram essa dor como também o fizeram com relacionamentos saudáveis e com laços
com os filhos. Um enorme peso
foi tirado de cima de mim com essa revelação.
Folha - O casamento foi abalado?
Brooke - Eu sempre estive certa
de que meu casamento não ia sofrer, mas sabia que ia ter de prestar bastante atenção a quaisquer
dores que causara a Chris e tentar
atenuá-las.
O Chris passou maus momentos, pois teve de segurar a barra de
duas pessoas, cuidar de Rowan e
de mim. Certa vez, ele foi até uma
loja comprar um trocador. Voltou
antes do esperado e sem o
trocador. Entrou no quarto
e sentou-se na
cama em silêncio. Olhou para
mim, com os
olhos cheios de
lágrimas, e desmoronou. Ele
começou a dizer: "Havia
mulheres na loja que estavam
contentes,
Brooke! Elas
sorriam e estavam felizes
com seus bebês! O que há
de errado com
você? Por que
você não está
contente? Você não olha para Rowan nem canta para ela, nem fala
com ela. Por quê? O que está acontecendo?". Eu mal conseguia respirar. Sentia como se tivessem me
dado um soco no estômago.
Quando descobrimos que se
tratava de uma doença, ele ficou
mais tranqüilo, pois era algo concreto que se precisava tratar. No
centro do furacão a gente pode
pensar tudo, até que não é uma
boa mãe ou esposa. Quando se
descobre que o motivo é externo,
fica mais fácil.
Folha - Na sua opinião, os médicos estão informados o suficiente
sobre depressão pós-parto?
Brooke - Creio que ainda há pouca informação sobre o assunto. Tive contato com muitas mulheres
com o mesmo problema e em
muitos casos o médico também
demorou para identificar a depressão. Uma parte da responsabilidade é a falta de informação,
pois a paciente não sabe que é tão
comum e, assim como eu, demora a procurar ajuda, rejeitando a
idéia de estar doente num momento em que deveria estar feliz.
Isso é agravado ainda mais pelo
fato de ser ela, geralmente, quem
tem de tomar a iniciativa
de buscar ajuda médica
num momento em que
tudo o que busca é ficar
reclusa.
Folha - O parto e pós-parto da segunda filha
foram mais tranqüilos?
Você teve medo de voltar
a viver a depressão?
Brooke - Sim, estão
sendo mais tranqüilos.
Não tive medo de viver a
depressão e nunca tive
medo dela. Meu medo
era por não saber que se
tratava de uma doença e
me culpava por me sentir uma mãe ruim. Hoje
sei que cuidados tomar.
Folha - Qual o conselho
que você daria às mães?
Brooke - Eu diria para
os maridos também.
Prestem bem atenção e não minimizem os problemas. Um caso
simples pode provocar uma tragédia. É normal uma mãe ficar
num estado de torpor emocional
nos primeiros dias, mas não é
normal ter sentimentos ruins,
sentir ciúmes da criança, chorar
demais. Em qualquer sinal que
você perceba uma grande mudança de atitude em relação a si,
como insegurança profunda, vá a
um médico. Ouvi gente que disse
ser possível tratar de depressão
com religião. Respeito as opiniões, mas isso é um problema clínico, não espiritual.
Folha - Por que a mulher tem dificuldade de reconhecer as emoções
ruins em relação à maternidade?
Brooke - Nós, mulheres, pensamos na maternidade como uma
coisa sacralizada, incapaz de produzir sentimentos ruins, doenças.
É uma barreira cultural difícil de
transpor.
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