|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"
Fontes do governo entendem que choque gerado por denúncia de compra de parlamentares é grave e ameaça projeto eleitoral de Lula
Planalto admite "sinal amarelo" para reeleição
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
O Planalto admite: a crise é grave e acendeu o sinal amarelo para
o projeto de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A avaliação foi obtida pela Folha no núcleo íntimo de um governo que dá a nítida sensação de
estar atarantado pela crise.
Evitar que o sinal amarelo passe
para vermelho depende do que a
fonte chama de "administração
da crise" daqui para a frente.
Primeiro passo: acabar com toda e qualquer "operação abafa".
Na reunião de anteontem do chamado gabinete de crise, no Planalto, o próprio presidente deu a
orientação para que todos os casos sejam apurados, nos âmbitos
próprios e sempre depois de consultados os partidos aliados.
Ou seja, haverá CPI (Comissão
Parlamentar de Inquérito) onde
couber (com certeza, caberá no
caso do escândalo dos Correios) e
haverá apuração pela Corregedoria da Câmara onde for o caso.
Se, por exemplo, não houver
um certo consenso sobre a criação da CPI do "mensalão" denunciado pelo presidente do PTB, Roberto Jefferson, a Corregedoria faria a investigação.
Há duas lógicas por trás da decisão de abandonar os "abafas". A
primeira é técnica: o governo usava suas próprias investigações, via
Polícia Federal, como escudo para
barrar a CPI dos Correios.
"Sinceramente, confio mais na
apuração da Polícia Federal do
que na de uma CPI", ouviu ontem
a Folha do Planalto. Acontece que
a PF não tem competência para
investigar deputados, que são os
envolvidos no "mensalão".
A segunda lógica tem a ver com
política e com imagem: se está
aceso o sinal amarelo para a reeleição de Lula, seria um tremendo
risco deixar que o presidente continuasse aparecendo como interessado em barrar a investigação
de corrupção em seu governo.
Uma segunda fonte governamental, mais diretamente vinculada às investigações, diz que o estrago na imagem do governo foi
produzido antes mesmo das denúncias de Jefferson, em conseqüência da "operação abafa", até
porque ela é uma contradição
com as virulentas críticas que o
PT fazia ao governo anterior,
quando era este que travava investigações congressuais.
O grupo palaciano não consegue dar uma resposta sobre as razões pelas quais o deputado falou,
no momento em que falou. Uma
das fontes da Folha especula com
a hipótese de que Jefferson quis
desviar a atenção do escândalo
dos Correios, no qual estaria diretamente envolvido. Deu certo em
parte: é óbvio que as atenções se
voltaram para o "mensalão".
Uma segunda fonte reclama do
que chama "beatificação" do deputado por certos setores da opinião pública, por ter denunciado
o esquema do mensalão. Se houve
tal "beatificação", o que é no mínimo discutível, no Congresso o
deputado, ao contrário, passou a
ser satanizado. "Ele não vai conseguir entrar na Casa", imagina-se no Planalto.
As fontes palacianas juram que
não foram lenientes na investigação da primeira denúncia do
"mensalão", feita pelo "Jornal do
Brasil", em setembro do ano passado.
Dizem que, ao contrário, o governo se despreocupou porque a
apuração percorreu o ciclo completo, começando na Corregedoria da Câmara e chegando até à
Procuradoria Geral da República,
como é de praxe nos casos em que
estão envolvidos parlamentares.
Mas há um detalhe: o ofício à
Procuradoria inocentava os parlamentares e atacava o jornal, pedindo retratação pela suposta
ofensa.
Os governistas até estranharam
que a denúncia da época não tivesse alcançado repercussão, dada a gravidade óbvia de se pagar
supostamente mesada a parlamentares. Mas, como a época era
a mais adequada para o surgimento de denúncias (véspera das
eleições municipais) e elas não repercutiram, houve a acomodação, dinamitada na segunda-feira
quando a Folha publicou a entrevista do presidente do PTB.
Algum arrependimento no governo a respeito de ter feito um
acordo com o PTB, à luz dos fatos
novos? Não se trata de discutir arrependimento ou não, respondem os palacianos. Trata-se de
uma anomalia do sistema político
brasileiro em que partido algum
consegue maioria suficiente para
governar isoladamente.
Ou seja, ainda que o sinal amarelo passe a vermelho e Lula perca
a eleição de 2006, o novo presidente estará com um pé na mesma armadilha que criou a crise
que agora o Planalto já rotula como "grave".
Texto Anterior: Delúbio tinha aval de Lula, diz Heloísa Próximo Texto: Versão oficial: Defesa deixa Lula vulnerável Índice
|