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ELIO GASPARI
De: Celsodaniel@pt.org
Para: Lula@mundo.gov
CC: José Dirceu, Delúbio Soares e Silvio Pereira
Companheiros,
Estou quieto. Não chateio
pedindo que investiguem o que
já sabem. Desde minha captura
e assassinato, em 2002, tenho
procurado ajudar, mas por aqui
onde estou a torcida emagreceu.
O Chico Mendes foi-se embora
quando ouviu o que Lula disse
sobre a floresta. D. Helder aborreceu-se com aquele negócio de
ter candidato a papa.
Quem quer se juntar a nós é o
Roberto Campos. O Bob Fields,
como o chamávamos, diz que o
Palocci se parece mais com ele
do que com o Celso Furtado. O
Celso concorda, mas pede para
ficar de fora dessa controvérsia.
Desde que apareceu a história
do "mensalão", o PC Farias anda me cumprimentando com
um sorriso esquisito. Não gosto
desse sujeito, mas, como ele
mesmo diz, tivemos caminhos
diferentes, mas acabamos de
maneira parecida.
Vocês sabem que haverá o
pós-"mensalão". Mandem comprar o livro "Maquiavelo no Conoció a los Argentinos" (Maquiavel não conheceu os argentinos). Custa 19 pesos em qualquer livraria de Buenos Aires.
Outro dia o Carlos Gardel lia
alguns trechos e cantava "a vergonha de ter sido e a dor de já
não ser". Acho que esse tango
tem muito a ver com as coisas
do mundo de vocês.
O autor do "Maquiavelo" chama-se Enrique N'Haux. Ele pertenceu à ekipekonômica do ministro Domingo Cavallo, o queridinho da banca, mago do governo do presidente Carlos Menem, pai da paridade cambial,
mãe da ruína nacional argentina. N'Haux era assessor da diretoria do Banco Nación.
Ele conta que na primeira semana de cada mês um cidadão
atravessava a plaza de Mayo
com uma mochila. Era o trem
pagador e carregava centenas
de milhares de pesos para distribuir no governo e na burocracia. Os envelopes (com dinheiro
vivo, como o do Delúbio ao
comprar uma fazendinha em
Goiás) eram chamados de "sobresueldo".
O expediente foi revelado em
fevereiro passado pela ex-ministra María Julia Alsogaray. Cada
ministério tinha a sua lista de
hierarcas beneficiados pela mesada. Esse "gibi" (para usar
uma expressão da malandragem) é um braço executivo, como o "mensalão" é uma carteira legislativa.
Havia ministros recebendo
US$ 100 mil mensais, e santos
menores com US$ 30 mil.
N'Haux fala com autoridade:
ele embolsou alguns envelopes.
A idéia da suplementação salarial é velha e universal: o sujeito vai para a capital ganhando
US$ 2.000 (R$ 5.000, para facilitar). Tem de sustentar duas moradias. Fica no prejuízo. Para
evitar que esse compañero desista, anaboliza-se sua renda com
um dinheirinho por fora. Noutro exemplo, custeia-se a qualidade de vida dos poderosos dirigentes partidários.
Eu acho que vocês precisam
ler esse livro, muito mais para
conhecer o desfecho do caso das
mochilas argentinas do que para saber como funcionam as
malfeitorias.
Um personagem do "Maquiavel" ensina que "não existem
governos de anjos". Se não me
engano, alguém disse coisa parecida por aí. Trata-se de uma
banalidade. Todo mundo sabe
disso. O problema de um governo não é a falta de anjos. É o excesso de diabos. O "Maquiavelo" mostra que os demônios do
"Gibi" estão soltos, sempre
prontos para escrever o próximo
capítulo.
Saudações petistas
Celso Daniel
P.S.: Passou por aqui o doutor
Octavio Gouvea de Bulhões,
aquele que foi ministro da Fazenda da ditadura, entre 1964 e
1967. Eu o detestava, mas afeiçoei-me à sua figura serena, despojada. Doutor Bulhões pediu-me para deixar expresso que jamais houve qualquer semelhança entre os hábitos patrimoniais
da ekipekonômkica de Cavallo
na Argentina e a de Pedro Malan no Brasil.
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