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Yeda dá R$ 150 mi de incentivo à Souza Cruz
Estado do RS devolverá valor gasto em construção de gráfica que vai gerar 250 empregos; em 2008, empresa já recuperou R$ 59 mi
Para especialistas, incentivo à indústria do tabaco vai contra práticas mundiais de combate ao fumo e é ruim para as finanças públicas
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
O governo do Rio Grande do
Sul se comprometeu a devolver
em forma de incentivos fiscais
os R$ 150 milhões que a Souza
Cruz gastou para construir um
parque gráfico na Grande Porto
Alegre. O empreendimento foi
inaugurado no final de abril,
mas em 2008 a empresa conseguiu recuperar R$ 59 milhões.
Para reaver os R$ 150 milhões investidos, a Souza Cruz
precisa cumprir metas de pagamento de impostos e geração
de empregos. Desde 1997,
quando começou a participar
de um projeto de incentivos fiscais chamado Fundopem (Fundo Operação Empresa), a empresa cumpriu todas as metas
estabelecidas pelo governo
gaúcho. O acordo entre a empresa e o governo gaúcho para o
projeto do parque gráfico foi
assinado há quatro anos.
A governadora Yeda Crusius
(PSDB) cogitou cortar o incentivo à Souza Cruz, quando fez
um projeto de reestruturação
fiscal do Estado, que estava sem
recursos. O corte, porém, não
chegou a ser incluído no projeto enviado à Assembleia Legislativa no ano passado.
A Souza Cruz teve uma receita líquida de R$ 5,3 bilhões em
2008 e seu lucro líquido foi de
R$ 1,25 bilhão.
O Rio Grande do Sul é o Estado brasileiro que dá mais incentivos à indústria do cigarro.
Entre 1997 e 2008, o Estado
permitiu que a Souza Cruz usufruísse incentivos de R$ 1,4 bilhão -uma média anual de
R$ 116,7 milhões.
Minas Gerais, onde fica a
maior fábrica de cigarros da
Souza Cruz e da América Latina, não deu nenhum incentivo
à empresa nos últimos quatro
anos. A Souza Cruz paga mais
impostos em Minas, onde não
recebe incentivos, do que no
Rio Grande do Sul.
No ano passado, a fábrica de
cigarros pagou R$ 232,43 milhões em ICMS para Minas Gerais, enquanto o governo gaúcho recolheu R$ 182 milhões
-44% a menos do que o valor
recolhido pela Secretaria da
Fazenda mineira.
O economista Clóvis Panzarini, coordenador tributário da
Secretaria da Fazenda de São
Paulo por oito anos, nos governos de Mário Covas e Geraldo
Alckmin, afirma que o incentivo de R$ 150 milhões para um
negócio de 250 empregos não é
um bom negócio para as finanças públicas.
"Cada emprego custou R$
600 mil. Com esse dinheiro, você poderia pagar R$ 1.300 por
mês para um professor por 35
anos. E ele daria aula, não fabricaria cigarro", declara.
O também economista Roberto Iglesias, um dos poucos
no Brasil que estuda a indústria
do cigarro, com trabalhos publicados pelo Banco Mundial,
critica a atitude do governo
gaúcho. "É vergonhoso dar R$
150 milhões para uma empreendimento que gera 250
empregos. Qualquer que seja o
ponto de vista que se olhe, isso
não faz sentido", diz.
O incentivo à indústria do cigarro contraria recomendações
da Organização Mundial da
Saúde e da Convenção Quadro,
o primeiro tratado internacional na área da saúde, de acordo
com Tânia Cavalcanti, que
coordena a área de controle de
tabagismo do Instituto Nacional de Câncer.
No final do ano passado, o governo brasileiro assinou em
Durban, na África do Sul, um
tratado da OMS em que o país
se compromete a "não dar incentivos, privilégios ou benefícios fiscais para a indústria estabelecer ou tocar seus negócios". O acordo é um detalhamento da Convenção-Quadro,
acordo assinado por 192 países.
Um estudo do Banco Mundial mostra que a política de incentivos é ilusória. O governo
arrecada mais impostos a curto
prazo, mas no longo prazo as
mais de 50 doenças causadas
pelo tabaco custam mais do que
o valor arrecadado.
Segundo o estudo, para cada
dólar arrecadado, o governo
gasta US$ 1,5 com o tratamento
de doenças. O incentivo é ilusório do ponto de vista da arrecadação, segundo a pesquisa, porque demora de 25 a 30 anos para as doenças se manifestarem.
"A indústria lucra e deixa o
prejuízo do tratamento para a
sociedade como um todo. Não
tem o menor sentido essa política", diz Tânia Cavalcanti. Para ela, o governo gaúcho "está
na contramão das boas práticas" contra o fumo.
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