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INTEGRAÇÃO
Bloco forte poderá ajudar a solucionar crises
Novo governo terá de valorizar o Mercosul, afirmam especialistas
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
A controvérsia provocada por
declarações -pouco amistosas
ou "mal interpretadas"- dos
candidatos José Serra (PSDB) e
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o Mercosul e a Argentina, feitas durante a campanha eleitoral,
relançaram a discussão sobre a
importância (ou não) do bloco
para a política externa brasileira e
serviram para explicitar algumas
falhas da integração sul-americana, iniciada há quase oito anos.
Especialistas ouvidos pela Folha concordam que a construção
do Mercosul, que hoje aspira ser
uma zona de união aduaneira (ou
seja, bem mais que um bloco de livre comércio, pois implica a existência de tarifas alfandegárias comuns entre seus membros -Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), foi apressada demais.
"Um balanço objetivo do Mercosul tem de levar em conta que o
comércio entre seus países-membros cresceu muito logo após a
criação do bloco. Porém uma de
suas grandes falhas é que houve
uma passagem rápida demais da
zona de livre comércio para a
união aduaneira, que é algo mais
ambicioso", explicou Rubens Ricupero, secretário-geral da Unctad (Conferência da ONU sobre
Comércio e Desenvolvimento).
"Com isso, foi necessário o estabelecimento de exceções demais,
e muitos produtos ficaram dispensados da união aduaneira, o
que minou o processo e transformou a tarifa externa comum em
algo irrelevante", acrescentou o
ex-ministro da Fazenda do Brasil
(governo Itamar Franco).
Para ele, contudo, a médio prazo, o Mercosul poderá ser muito
importante para a política externa
brasileira -"sobretudo ante a
atual organização econômica global". Essa opinião é compartilhada por Alfredo Valladão, brasileiro que chefia a cátedra Mercosul
do reputado Instituto de Estudos
Políticos de Paris (Sciences Po).
"Se o próximo presidente da
República decidir privilegiar negociações bilaterais ou multilaterais com outros países em detrimento do Mercosul, o Brasil correrá o risco de ficar isolado na
América Latina", disse Valladão.
Segundo ele, desde que o presidente George W. Bush obteve a
TPA (Autoridade para Promoção
Comercial, que lhe dá o direito de
negociar acordos comerciais que
o Congresso depois aprova ou rejeita em bloco -sem emendas),
em agosto passado, a estratégia
dos EUA é negociar o avanço da
Alca (Área de Livre Comércio das
Américas) e acordos bilaterais
com as regiões da América Latina.
"Por conta dessa política, o Chile, a Comunidade Andina [Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e
Venezuela] e o Mercado Comum
Centro-Americano [Guatemala,
Honduras, Nicarágua, El Salvador e Costa Rica] já foram contatados por Washington. Isso tende
a isolar o Brasil caso o novo presidente não busque estreitar seus
laços com os parceiros do Mercosul", explicou Valladão.
"Uma América Latina com
acordos preferenciais com os
EUA que excluíssem o Brasil seria
um cenário terrível para nós, pois
cerca de 30% de nossas exportações vão para os EUA e outros
20% são destinados aos países latino-americanos. Perderíamos
preferências indispensáveis. Precisamos, portanto, de aliados. E,
apesar de tudo, não temos aliado
melhor do que o Mercosul. O próximo presidente do Brasil deverá
ter isso em mente."
Ricupero também ressaltou que
a grave crise que assola tanto o
Brasil quanto a Argentina é mais
uma razão para que os dois países
busquem uma maior aproximação -embora as razões internas
não sejam as mesmas. "Se a crise
continuar se agravando, é bem
provável que o Brasil e a Argentina tenham de procurar soluções
alternativas, reduzindo suas importações", apontou Ricupero.
"Nesse quadro, algo menos ambicioso que uma união aduaneira,
como uma verdadeira zona de livre comércio, poderá servir para
reforçar o comércio dentro do
Mercosul. Um esquema regional
permitiria que os dois países,
além do Uruguai e do Paraguai, ficassem menos expostos às oscilações da economia internacional",
completou o ex-ministro.
Assim, para os analistas, apesar
de declarações intempestivas ou
de acusações infundadas -seja
de Lula, seja de Serra-, o futuro
presidente do Brasil parece fadado a valorizar o Mercosul.
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