São Paulo, terça-feira, 08 de outubro de 2002

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RAZÃO DE VOTO

As tendências e as surpresas

MAURO FRANCISCO PAULINO

A exemplo de eleições anteriores, porém numa menor proporção, alguns veículos de comunicação começaram a comparar, na noite de domingo, resultados parciais de apuração das urnas com os resultados de pesquisas de intenção de voto realizadas na antevéspera e véspera da eleição. Na medida que os votos eram totalizados, o procedimento, incorreto, foi felizmente abandonado. Independente da questão da apuração geograficamente desproporcional, vale aí uma observação técnica sobre pesquisas feitas no dia anterior à eleição.
De forma inadequada, alguns chamam as pesquisas feitas às vésperas das eleições de "prognóstico" que, segundo o Aurélio, significa "predição, agouro, presságio, profecia". É exatamente o que elas não representam. Pesquisas feitas antes da ida dos eleitores às urnas servem para apontar tendências e medem a intenção de voto naquele momento.
As únicas pesquisas que permitem essa comparação são as de boca-de-urna pois, nestas, o eleitor é abordado logo depois de votar e declara o que já fez e não o que pretende fazer. Elas possibilitam informar qual foi o resultado das eleições, dentro dos limites estatísticos de erro amostral, assim que a votação é encerrada. Como a expectativa de apuração, divulgada pelo TSE, era a de totalização dos votos no próprio domingo, o Datafolha não fez esse tipo de levantamento nesta eleição.
Todas as tendências apontadas pelo instituto em suas últimas pesquisas foram confirmadas. O Datafolha foi o primeiro a mostrar, em São Paulo, Genoino empatado com Maluf na disputa pelo segundo lugar, empate que se repetiu na véspera da eleição. Mostrou a possibilidade de Rosinha vencer já no primeiro turno, no Rio e, em Minas, o grande favoritismo de Aécio. Mostrou, também, a possibilidade de Lula vencer no primeiro turno e seu recuo após o debate na TV Globo.
Já a ascensão de Garotinho foi observada de forma clara em todas as regiões do país na sexta-feira e no sábado. Os 18% de votos válidos obtidos por ele na apuração final do TSE mostram que, apesar de ter o eleitorado com perfil menos escolarizado entre os quatro candidatos, pressupondo maior dificuldade na efetivação do voto, a tendência estava correta. Assim, mesmo sendo realizada antes da votação a pesquisa nacional do Datafolha mostrou resultados muito próximos dos revelados pelas urnas. No levantamento do instituto dos dias 4 e 5, Lula teve 48%, Serra 21%, Garotinho 19% e Ciro 12% das intenções de voto válidas.
A contribuição das pesquisas ao processo eleitoral é o de ajudar a entender os movimentos de opinião. Graças a elas pudemos perceber as alternâncias na disputa pelo segundo lugar, a maior participação das mulheres no processo de decisão e o desejo de mudança apontado pela maioria dos eleitores, entre muitas informações relevantes. No final, as pesquisas mostraram que houve um movimento de opiniões nos últimos dias, incluindo o próprio dia da eleição, que geraram mudanças, principalmente nas eleições para governadores, potencializadas pelas tendências das opções para presidente.
Não se pode exigir que números coletados antes da votação sejam precisos em relação aos apurados nas urnas. Manter exclusivamente esse parâmetro de avaliação para as pesquisas é deturpar seu verdadeiro papel dentro do processo democrático, que é o de garantir o direito de informação e de seu uso pelo eleitor. Pesquisa de intenção de voto não é bola de cristal.


MAURO FRANCISCO PAULINO, diretor-geral do Datafolha, escreve às terças-feiras nesta coluna


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