São Paulo, sábado, 08 de dezembro de 2007

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Indústria bélica sobrevive com exportações

Centros de pesquisa das Forças Armadas desenvolvem novos projetos, mas governo não tem dinheiro para comprá-los

João Verdi, presidente da Avibrás, diz estar otimista com a intenção do ministro da Defesa de impulsionar os produtores nacionais

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Dois modelos diferentes de como incentivar a indústria bélica brasileira foram mostrados em um seminário em São Paulo. De um lado uma veterana indústria de material de defesa sobrevive graças a exportações de equipamento de alta qualidade. Do outro, os centros de pesquisa das Forças Armadas procuram desenvolver material visando uma auto-suficiência, mas não conseguem chegar à linha de produção pois não há recursos do governo para comprar o que foi laboriosamente pesquisado durante anos.
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, declarou várias vezes que pretende impulsionar a indústria de material de defesa. O responsável pela principal empresa "sobrevivente" da área, o engenheiro João Verdi, presidente da fabricante de foguetes militares Avibrás, se declarou "muito otimista" com a intenção do ministro, mas disse isso logo depois de uma longa catilinária reclamando da falta de apoio governamental aos fabricantes de material bélico.
"As intenções são boas, ele conseguiu mais verbas. Se vai dar tudo certo, é complicado de dizer", disse Verdi em São Paulo durante o seminário "Tecnologia Estratégica: Pesquisa e Desenvolvimento", sobre indústria de material de defesa: "O ministro e os três comandantes militares nos visitaram na semana passada. Seu discurso é coerente e lógico", afirmou.
Verdi fez essas declarações ao final de uma palestra na qual reclamou veementemente que o mercado militar interno, das três forças, é "pequeno, variável, volúvel e frágil".
A Avibrás é uma empresa de 46 anos de idade que fez parte do auge de vendas da indústria bélica brasileira nos anos 80 e conseguiu sobreviver à derrocada da maioria delas na década seguinte. "Durante esse tempo todo fizemos pesquisa, produzimos e exportamos. A sobrevivência está ligada a produtos novos visando principalmente o mercado externo", declarou Verdi.
Entre os sucessos de vendas está o lançador de foguetes Astros, de 1981, que foi encomendado pelo ditador iraquiano Saddam Hussein, então em guerra com o Irã. Segundo o empresário, o custo do projeto, de quase US$ 2 bilhões, foi bancado pelo Iraque.
O Astros foi depois vendido para a Arábia Saudita, que ironicamente o usou contra o Iraque na Guerra do Golfo, de 1991. A última grande venda foi para a Malásia, em 2002.
É praxe no mercado internacional de armas que um comprador procure saber se o equipamento é utilizado pelo país de origem, uma espécie de "selo de aprovação". Verdi diz que a Avibrás é uma exceção à regra: faz 15 anos ele fornece foguetes ar-terra para a Colômbia, material que só recentemente a FAB comprou. E o Exército levou 12 anos para comprar o Astros depois de Saddam.
O empresário está particularmente indignado com o Exército, com quem ajudou a desenvolver um blindado de quatro rodas, o Guará, que não recebeu nenhuma encomenda. Também reclamou que o convênio que tinha para desenvolver um sucessor do blindado de transporte de tropas Urutu foi atropelado por uma concorrência vencida pela Fiat e Iveco, da qual ele se recusou a participar.

Penúria
O Exército decidiu racionalizar seus projetos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) pela penúria de verba. Mais de cem planos foram reduzidos para apenas 11 prioritários, como um radar de defesa aérea e uma família de blindados, segundo o general-de-brigada Alessio Ribeiro Souto, que dirige o Centro Tecnológico do Exército.
Alguns projetos foram criados com apoio da indústria, como o míssil antitanque ("anticarro" no jargão do exército) MSS 1.2, desenvolvido pela empresa Mectron. Apesar de já estar "concluído, avaliado e aprovado", o general também reclama da falta de verbas, que não existem nem para produzir um primeiro lote-piloto. Era um projeto originalmente previsto para estar operacional em 1990. O Exército também desenvolveu uma arma antitanque de menor alcance, a ALAC (Arma Leve Anticarro), um morteiro pesado calibre 120 mm e sua munição, um novo fuzil calibre 5,56 mm.
Faltam, porém, indústrias dispostas a produzir equipamentos como esses ou seus acessórios, pois o Exército não tem a verba para comprar um lote que justifique o início de uma produção em série.
O Exército e a indústria têm a tecnologia, ou mesmo o produto; mas falta dinheiro para a compra. Estima-se em R$ 1 bilhão a verba para produzir os blindados médios para substituir os mais de mil blindados Urutu e Cascavel que o Exército adquiriu no passado.


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