São Paulo, quinta-feira, 09 de janeiro de 2003

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CELSO PINTO

Proposta para a crise das empresas

Desde o final do ano passado, acumulam-se pressões de empresas em crise por algum tipo de apoio oficial. Eugênio Staub, presidente da Gradiente e um aliado de primeira hora do então candidato Lula, acha que o governo deve ajudar, mas só se as empresas se comprometerem a abrir o capital e entrar no novo mercado. Como estímulo adicional, o governo poderia permitir o uso voluntário, pelos trabalhadores, de parte do FGTS para comprar ações dessas empresas.
"O capitalismo brasileiro é muito atrasado", diz Staub. "A hora de modernizá-lo é quando o empresário está à beira de quebrar." Ele argumenta que muitas empresas são patrimonialistas. O acionista controlador, ou a família, quer administrar e usufruir da empresa.
Várias empresas de qualidade acabam "contaminadas pelos controles da família controladora". Ele lembra dois exemplos: a Metal Leve, que acabou vendida a um grupo alemão, e a Klabin. Ele ressalva que há empresas bem administradas pelos controladores: o critério central deve ser a competência. A crise, cujo estopim foi a disparada do dólar, poderia ser uma oportunidade para "lançar um capitalismo de fato" no país.
O novo mercado implica uma série de obrigações. Todas as ações têm que ser ordinárias com direito a voto. Pelo menos 25% do capital deve estar no mercado. Os minoritários têm direito a assento no conselho de administração. A exigência de divulgação de informações é muito maior do que a imposta às empresas abertas. As demonstrações devem também seguir padrões internacionais. Em caso de venda do controle acionário, o minoritário tem o mesmo tratamento do controlador.
A Gradiente, segundo Staub, está tentando cumprir todas as regras do novo mercado. Tem em seu conselho um representante da Animec, em nome dos minoritários, que questiona tudo, até se o helicóptero usado por ele deveria ser de propriedade da Gradiente. "Acho que ele tem razão", concede.
Staub acha grave a questão do endividamento externo de muitos grupos, feito quando o dólar era farto e barato. Seu temor é que a pressão das empresas em crise acabe levando o governo a uma resposta tradicional, de ajuda ao controlador, sem contrapartidas. Em outros termos, que seja criada uma "Buracobrás" nos moldes tradicionais, na expressão irônica de um importante empresário.
O BNDES poderia até conceder algum empréstimo-ponte no período de preparação da entrada no novo mercado. A idéia do uso voluntário do FGTS seria um estímulo adicional. Alguns grandes grupos em dificuldades podem ser bons investimentos, e as regras do novo mercado dariam mais segurança. Para minimizar o risco dos trabalhadores, ele sugere que bancos de investimento e fundos de pensão façam avaliações e recomendações públicas sobre empresas do programa.
O programa acabaria, naturalmente, beneficiando grupos nacionais, porque subsidiárias de multinacionais, em princípio, não aceitariam submeter-se às exigências do novo mercado. Grandes grupos fechados e bem administrados, como o Votorantim, não teriam razão para entrar no programa. A fórmula não seria, contudo, uma panacéia aplicável a qualquer empresa em crise. Staub acha que o setor de aviação, por exemplo, exige uma solução mais ampla.
Já existe um projeto de uso de 1% do FGTS na compra de novas ações em Bolsa, que está sendo discutido entre a Bovespa e o PT desde a campanha. Ele acha que as idéias não são excludentes, podem se somar.
Staub expôs a idéia ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci, logo depois do segundo turno das eleições. Palocci gostou, mas a proposta ainda não avançou.
O PT está preocupado com a crise de vários setores empresariais, mas deu poucas pistas sobre o que fará. Deu, contudo, forte apoio ao projeto da nova Lei de Falências, mencionada por Palocci, no discurso de posse, como uma de suas prioridades.
O professor Aloisio Araújo, da Fundação Getúlio Vargas, ajudou Armínio Fraga, no Banco Central, na elaboração e discussão do projeto. Já teve vários contatos com o PT e vai continuar colaborando. A atual Lei de Falências, da década de 40, diz, é inteiramente inadequada para permitir programas de recuperação de empresas em dificuldade, que preserve empregos sem, necessariamente, ajudar o acionista controlador. Até mesmo esquemas como o proposto por Staub, observa, precisariam de um amparo legal para funcionar adequadamente.
O que está em discussão é um projeto de lei que tramita desde 1993 e que foi usado como base, depois de várias modificações. Ele amplia os poderes do comitê de credores para buscar soluções para recuperação das empresas, hoje nas mãos do juiz e dos devedores. Coloca limites na prioridade dos débitos trabalhistas na massa falida, para fechar brechas hoje existentes. Permite composições com devedores, se dois terços aceitarem (hoje é preciso unanimidade). Além de permitir preservar a marca e os empregos de empresas em crise -sem, necessariamente, ajudar o controlador-, a nova lei pode diminuir o risco dos empréstimos e ajudar a reduzir o "spread" bancário.
Vários empresários importantes com quem conversei nas últimas semanas acham que deve haver apoio para minorar a crise. Mas com soluções para as empresas e os empregos, sem privilegiar o controlador. Entre eles, Ivoncy Ioschpe, do Iedi; Paulo Cunha, do Grupo Ultra; Horácio Piva, da Fiesp; Eduardo Eugênio, da Firjan; e Roger Agnelli, da Vale.

Otimismo cauteloso
A valorização dos títulos da dívida brasileira, a alta da Bolsa e a queda do dólar têm refletido, por enquanto, mais a volta dos investidores brasileiros do que dos internacionais. Os fundos, em geral, ainda estão cautelosos. Alguns estão elevando posições de Brasil que estavam abaixo da média, mas poucos estão apostando forte. Potencial para elevar a aposta existe, mas de forma gradual.

E-mail: CelPinto@uol.com.br


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