São Paulo, sábado, 09 de fevereiro de 2008

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ENTREVISTA
JORGE HAGE


CGU quer restabelecer diárias de valor fixo para ministros

Hage pede investigação sobre o passado e diz que mídia nunca reclamou antes

Alan Marques/Folha Imagem
O ministro-chefe da Controladoria Geral da União, Jorge Hage, durante a entrevista concedida na sede do órgão, em Brasília


FELIPE SELIGMAN
LUCAS FERRAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro da CGU (Controladoria Geral da União), Jorge Hage, 69, defendeu que sejam restabelecidas as diárias para os ministros que ontem receberam a recomendação do governo para não usarem mais os cartões de crédito corporativo. À frente do órgão responsável pelo Portal da Transparência (www.portaltransparencia. gov.br) desde 2006, ele disse que eventualmente há confusão entre "público e privado" e disse que a CGU investigará todos os gastos irregulares.

 

FOLHA - O cartão é indicado para gasto eventual. É correto usá-lo para comprar tapioca, gastar em joalheria, mesa de sinuca, hotel para família, restaurante de luxo?
JORGE HAGE -
Qualquer gasto só tem cabimento se for de interesse público. É bom senso. Pode pagar tapioca ou sanduíche? Se estiver em viagem ou a serviço, pode. O problema é que não há norma legal expressa: o Congresso não se dignou a regulamentar artigo que prevê nova lei complementar de normas orçamentárias e financeiras.

FOLHA - Ministros que usaram o cartão cometeram irregularidades...
HAGE -
Sempre fui favorável ao restabelecimento das diárias de valor fixo para ministros, como todos os demais servidores. Isso foi suprimido por alguma atitude demagógica e hipócrita.

FOLHA - E quanto às irregularidades cometidas pelos ministros?
HAGE -
Não vou me pronunciar, ainda estamos em auditoria. Na próxima semana devemos ter o resultado, pelo menos dos dois primeiros [Matilde Ribeiro e Altemir Gregolin].

FOLHA - E sobre o reitor da Unifesp, Ulysses Fagundes Neto, que pagou altas somas em restaurantes de luxo. A escolha não é questionável?
HAGE -
Aí entramos em outras questões: princípio da economicidade e da razoabilidade. Precisa-se questionar o que é um nível de despesa razoável.

FOLHA - Pode pagar conserto de uma mesa de sinuca?
HAGE -
A mesa de sinuca pertence a quem? É patrimônio da pasta. Aqui na CGU há uma TV na garagem para os motoristas. É legítimo ter uma mesa de sinuca na área da garagem para recreação de motoristas na hora de intervalo? Se sim, não há nada condenável.

FOLHA - Como a CGU vai analisar a questão?
HAGE -
Racionalmente, não pelo aspecto pitoresco da notícia. Porque mesa de sinuca dá manchete, assim como tapioca, mas não é o que me interessa.

FOLHA - A CGU não falhou ao não detectar essas irregularidades?
HAGE -
Não tem como conferir gasto por gasto. É absolutamente impensável. É preciso ter outros métodos para ampliar o controle.

FOLHA - Por exemplo?
HAGE -
Transparência absoluta para os gastos, de modo a expormos à visibilidade da sociedade.

FOLHA - Inclusive os gastos da Presidência, que o governo questiona?
HAGE -
Calma, calma. Publicidade e transparência é o melhor instrumento para ampliar as possibilidades de controle. O rebuliço que está aí é porque o país nunca esteve acostumado a isso. Estamos dando um choque de transparência, por isso há tanta turbulência.

FOLHA - Mesmo assim é grande o número de saques.
HAGE -
Alteramos com o decreto do presidente: o saque será proibido. O uso do cartão para esse fim neutraliza os propósitos de transparência.

FOLHA - A Universidade Federal do Piauí gastou 99,8% do cartão em 2007 com saques em dinheiro.
HAGE -
Está fora do padrão e vai ter que mudar. É um caso típico que vai acabar. As universidades serão investigadas. Estamos numa linha ascendente em termos de crescimento de transparência, desafiamos comparação com qualquer país, qualquer governo estadual. Finalmente hoje [ontem] a Folha mostrou [os gastos com cartão] do Estado de São Paulo, e não é nenhuma crítica, é um elogio, já que ele foi pioneiro no cartão. O governo federal entrou atrasado nisso.

FOLHA - Qual é a caixa-preta dos cartões?
HAGE -
Caixa-preta total, que vocês nunca reclamaram, era no passado. Quantas sinucas e outras coisas aconteceram e nunca ninguém questionou nada. Estamos mudando, com a restrição ao saque e o fechamento da conta "tipo B". Estamos apanhando porque estamos avançando.

FOLHA - E as despesas da segurança da Presidência da República, a CGU também vai investigar?
HAGE -
Não tenho nada a dizer, porque são da alçada do órgão de controle interno da Presidência.

FOLHA - A CGU não se mete com a Presidência?
HAGE -
A CGU só atua nós órgãos da Presidência mediante solicitação da Casa Civil.

FOLHA - O sr. acha que há uma confusão entre o público e o privado?
HAGE -
Rotineiramente não, mas eventualmente sim. Toda a discussão está girando sobre 0,004% da verba do governo.

FOLHA - Uma CPI ajudará a investigar os gastos com o cartão?
HAGE -
Se fosse para investigar apenas cartões não seria tão importante quanto será se analisar todos os suprimentos de fundo, principalmente da época em que era tudo conta "tipo B" e não havia transparência.


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