|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
BRASIL PROFUNDO
Índios cinta-larga mataram pelo menos 4 pessoas em Rondônia; número de mortos pode ser maior, diz delegado
Polícia investiga chacina de garimpeiros
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Um grupo de índios cinta-larga
atacou a tiros anteontem cerca de
60 garimpeiros que extraíam
clandestinamente diamantes na
terra indígena Roosevelt, em Espigão d'Oeste (a 534 km de Porto
Velho), deixando pelo menos
quatro mortos, de acordo com
seis garimpeiros ouvidos ontem
pela polícia do município.
O delegado da Polícia Civil Raimundo Mendes de Souza Filho,
44, estimou, com base nos depoimentos, que o número de mortos
pode chegar a 12.
Dois delegados da Polícia Federal foram deslocados da capital de
Rondônia para investigar a chacina. A PF, que tem o poder de investigação em terras indígenas,
não havia chegado ao local do
conflito até o início da noite da
ontem.
Sobrevivente da chacina, o garimpeiro Gerssi Fidelis Mendes,
34, disse ontem à Folha, em entrevista pelo telefone da delegacia de
Espigão, que o ataque ocorreu por
volta das 11h de anteontem na
área de garimpo conhecida como
Batom, às margens do rio Roosevelt, numa área de difícil acesso
localizada a cerca de 140 km da cidade de Espigão. Mendes disse ter
certeza de que pelo menos quatro
colegas morreram.
O grupo atacado fazia garimpo
manual, o mais rudimentar, com
pás e picaretas e sem a ajuda de
dragas, numa área perto do rio
com 100 m de extensão. Segundo
Mendes, aproximadamente "30
guerreiros" índios já chegaram
dando tiros. Os garimpeiros correram em direção à mata e foram
perseguidos pelos índios, que estariam armados de espingardas,
pistolas e revólveres.
Mendes contou que corria ao lado dos amigos Francisco das Chagas Alves Saraiva, o "Baiano Doido", e de "Parasinho". Os índios
gritavam "pára, garimpeiro". Segundo Mendes, Saraiva e "Parasinho" resolveram obedecer, alegando que poderiam dialogar
com os índios e "ser libertados".
Mendes continuou correndo e se
escondeu na mata.
Passadas duas horas, Mendes
retornou ao garimpo e encontrou
duas covas rasas. Com a ajuda de
outros garimpeiros que voltaram
ao local, conseguiu desenterrar e
confirmar a identidade dos corpos de Saraiva e "Parasinho".
"Eu peguei a corda, levantei [o
corpo] pra cima, e [falei]: "Este é o
Baiano'", contou Mendes. Voltou
para o acampamento e descobriu
que os índios haviam ateado fogo.
Conseguiu achar uma calça e uma
camisa e rumou a pé, com outros
colegas, no meio da mata, por
aproximadamente 36 km até uma
parada de ônibus.
Mendes só chegou a Espigão no
final da manhã de ontem, mais de
24 horas depois do ataque.
O garimpeiro soube que seus
colegas acharam os corpos de outros dois garimpeiros. Algumas
das vítimas teriam sido amarradas e raptadas, mas a informação
também não havia sido confirmada pela polícia até o final da tarde
de ontem. Mendes contou ter ouvido que um garimpeiro chamado "Irmão" foi morto pelos índios
com um tiro nas costas.
Só angústia
Ao saber da chacina, a mulher
de Saraiva, Maria da Guia Veras
da Silva, 34, foi à delegacia e contou que o casal chegou a Espigão
há cerca de 15 dias, vindo de Cacoal (RO). Ela disse que Saraiva,
um pequeno comerciante na cidade, teria sido convidado por
um índio para trabalhar no garimpo de diamantes.
Outro sobrevivente da chacina,
o garimpeiro Divaldo Pinheiro
Moraes, 40, passou ao delegado
Raimundo de Souza Filho os nomes de outros garimpeiros que teriam morrido e que não estavam
relatados no depoimento do garimpeiro Gerssi Mendes.
O delegado deu a notícia da chacina à Secretaria de Segurança Pública, que, a partir de uma determinação do governador Ivo Cassol (PSDB), criou uma força-tarefa com policiais civis e militares
para dar apoio à Polícia Federal.
Um helicóptero poderá ser usado
na operação.
A prefeita de Espigão, Lúcia Tereza Rodrigues (PDT), disse que o
número de mortes na ação de anteontem pode chegar a 20. Ela pediu que o governo federal decida
"fechar ou organizar" o garimpo
em Roosevelt. "Estou aqui na delegacia com dez mulheres chorando, crianças sem pai. Para nós só
sobram angústia e problema social", disse a prefeita, por telefone.
A terra indígena Roosevelt, de
230.826 hectares entre os municípios de Espigão d'Oeste (RO) e
Aripuanã (MT), é ocupada por
306 índios da etnia cinta-larga. Vizinhas de Roosevelt há outras
áreas cinta-larga, que somam 2,7
milhões de hectares e 1.300 índios.
Texto Anterior: Paraná: Justiça solta último preso do caso Copel Próximo Texto: 33 corpos foram tirados da área em três anos Índice
|