São Paulo, domingo, 9 de maio de 1999

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JANIO DE FREITAS

Nada pessoal

A tática do governo e dos seus senadores na CPI dos Bancos dispensa todas as convenções da dignidade, mas só alcançará o seu propósito com os ingênuos irrecuperáveis.
Todo o procedimento dos governistas, até aqui, consiste em insistir no caso da "ajuda" aos bancos Marka e FonteCindam, o que lhes facilita o argumento de que foram de responsabilidade pessoal, e não do governo, os favorecimentos feitos aos dois. As cabeças de Francisco Lopes e de um ou outro diretor do Banco Central estão sendo entregues, com toda a clareza, para permitir essa manobra do governo.
Nas palavras de Fernando Henrique Cardoso: "Se alguém errou, deve ser punido".
Alguém, não o governo.
Francisco Lopes, Cláudio Mauch, Demóstenes Madureira do Pinho não eram de uma equipe de futebol, mas da equipe de governo nomeada por Fernando Henrique há mais de quatro anos, para formular e executar a principal, ou única, política que caracteriza o seu governo. Para tanto, a essa equipe foi entregue o principal, ou único, órgão ativo do atual governo, que é o Banco Central.
Todas as decisões anteriores do Banco Central foram dadas por Fernando Henrique como decisões do governo. E eram, de fato. Decidido na diretoria do Banco Central, com uma falsa justificativa epistolar tramada no Banco Central e com quase R$ 2 bilhões sacados dos cofres do Banco Central, o favorecimento aos dois bancos foi ato do governo, não de alguém.
De um governo cujo presidente almoçava com o então presidente do Banco Central, Francisco Lopes, imediatamente antes dos quase R$ 2 bilhões serem propulsionados do cofre do Banco Central para o caixa do banqueiro Salvatore Cacciola. O que torna muito pertinente a pergunta do senador Eduardo Suplicy que leva o senador José Roberto Arruda ao paroxismo da cafajestice parlamentar: "Seria possível que o presidente, o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central almoçassem, na iminência da liberação de mais de R$ 1,5 bilhão, e não falassem nisso?".
Não acontecerá, por motivos óbvios, mas sobre aquela operação já saiu mais do que o suficiente para um perigoso processo contra o governo.
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Palavra urgente
Ainda faltando mais de 43 dos 48 meses do mandato presidencial, seria no mínimo uma precipitação descabida o aviso, lançado pela convenção do PFL na sexta-feira, de que terá candidato à Presidência em 2002. Aviso em geral tomado como lançamento da candidatura de Antonio Carlos Magalhães.
O PFL está vendo, como todo mundo, que o governo se desmilingúi no desgaste e, de uma parte, preparou-se para a eventualidade de desgrudar, caso não haja recuperação satisfatória. De outra, deu uma urgente satisfação às bases, que engrossam a rejeição ao governo e a Fernando Henrique e não estão digerindo o continuado comprometimento da cúpula partidária com ambos.
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O social
A seca no Nordeste continua tão agressiva que até cidades como Recife passaram a sofrer escassez grave de água.
As desgraças desse quadro só inspiraram ao Ministério da Fazenda de Pedro Malan uma providência: a retenção das verbas de março e abril para os flagelados que integram as frentes de trabalho, com o salário de R$ 80 para o chefe de família, ou R$ 2,66 por dia.
Ao presidente da República a continuidade da desgraça inspirou a autorização de outras medidas:
- Os 3 milhões de cestas básicas que eram distribuídos ficam cortados para 2 milhões.
- Os R$ 100 que foram pagos ao chefe de família nas frentes de trabalho e depois se reduziram a R$ 80 são cortados para R$ 60, ou R$ 2 por dia para a família.
- O Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra a Seca), extinto porque tido como ralo do dinheiro público para bolsos privados, sobretudo de políticos, fica recriado para atender ao desejado pelos políticos governistas.
Mas não falta uma notícia amena: o ambiente palaciano do presidente da República está passando algumas redecorações. O presidente é muito interessado no social.



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